29 maio 2005

Dick Hard Enfermeiro de Noite

"Nunca ninguém me tratou tão bem como você", disse ela.
Bem, a história pode ser curta ou comprida. É como o tamanho de um sardão. E se no caso do sardão a gente não pode fazer nada, no que toca às histórias temos a obrigação de seleccionar a versão mais adequada ao eleitorado, que dizer, aos leitores.
Tudo começou na tarde em que começou. Estava um calor infernal, mas nas histórias policiais com estilo é mesmo assim que o clima se deve comportar. Ou está um calor do caraças (talvez seja de Los Angeles) ou chove a cântaros (talvez seja da arqueologia).
Bem, estava um calor do caraças e eu estava sentado na minha cadeiras de molas "Range Range", com as pernas esticadas em cima da mesa. Sei que não sou americano, mas detective que se preze tem de saber assumir uma postura descuidada. Aquilo que os americanos designam por "sloppy". Ou coisa que o valha.
Bem, "to make a long story short" (ou shot, no caso de tiro ou cálice de tequilla), posso dizer que estava a ouvir a barba a crescer com o ritmo do Chevy Corvette branco da Marie-Claude Beaumont no Autódromo do Estoril em 1972 (capotou, mas saiu ilesa). Olhava pela janela. Na rua não se passava nada, tirando os habituais homicídios, violações e os grupos de adeptos do Benfica a festejar o título, após um período de considerável hibernação desportivo-categórica.
Ainda pensei em ter uma porta a sério no escritório, mas depois que desculpa tinha para ser um detective fracassado a nível profissional, sexual, afectivo, familiar e outros que são bem mais importantes?
Por isso mesmo, tinha mandado vir pela Internet uma daquelas portas à detective, com vidro fosco enrugado, que deixam apenas vislumbrar um corpo a cair pesadamente em soalhos tão sujos de sangue que até dão nome a um particular tom de vermelho: vermelho-soalho-de-detective.
E pintado a preto: "Dick Hard, investigações com dignidade. Fazemos descontos a grupos".
A Velma estava de folga, provavelmente a mamar nos margalhos, que era a actividade favorita da Velma, segundo ela me contava. Eu já tinha tentado que ela me bafejasse com os seus talentos labiais, mas a Velma insistia em explicar-me que broche e patrão são duas palavras que não se dão bem. Por isso, nos dias em que a Velma estava bem disposta, limitava-me a ir-lhe ao pacote com subtileza, até que era a própria Velma que me espicaçava o amor-próprio: "Mais hard, Dick, que até cura mais que o dick do senhor cura".
E eu dava-lhe com alma e hardor. Depois, deixava-me cair para cima da cadeira, puxava as calças, desapertava o nó da gravata (um calor de "Body Heat", com o William Hurt a perguntar 'Ei, lady, do you wanna fuck?') e dizia para a Velma:
- Baby, chega aqui a garrafa da ginjinha, OK?
E a Velma trazia a garrafa da ginjinha, com elas. (Devia ser 'bourbon', mas é preciso não perder de vista um certo patriotismo alcoólico).
Bem, foda-se, vamos lá avançar com o caralho da história, para falar bem e depressa.

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