30 março 2008

Ponto de fantasia


Ele era tão, mas tão gay que me apaixonei por ele. Notava-se na forma como fumava com os dedos estendidos expelindo as baforadas com os lábios afilados e o cuidado de não atingir ninguém. No modo como colocava a voz um tom abaixo para a adocicar. Nas horas intermináveis de amizade cúmplice em que debulhávamos o último filme visto, a dificuldade de escolher entre um Cabeça de Burro ou um Ponte da Barca, as venturas e desventuras de gente nossa conhecida para velejar na monotonia dos dias ou a influência de determinado creme na conservação de uma pele lisinha e sem manchas.

Dei por mim a apreciar os merecimentos do seu traseiro enxuto em cada oportunidade e a imaginar a forma, o volume e até a cor daquilo que o distinguia de mim para efeitos de registo civil, para além da óbvia curiosidade sobre a cobertura ou não do topo. Embrenhava-me num torpor melífluo que acabava por me gotejar a lingerie. E mil vezes pensava no disparate de com olhos arregalados pela primeira vez lhe repetir que sabia fazer broches como ele.

Estou quilhada. Porque isto de me apaixonar por sensibilidades semelhantes mas com os tomates suficientes para se entranharem por mim adentro é uma fantasia digna de um filme indiano.

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