28 janeiro 2010

Fruto proibido

Como um gaiato obeso, guloso, diante da montra de uma pastelaria, ele olhava mas tudo fazia para reprimir qualquer manifestação do desassossego que lhe provocava a mulher mais bonita que algum dia conhecera.
Sorvia cada minuto em que podia privar por algum pretexto com aquela criatura perfeita que o perturbava ao ponto de lhe alterar a pulsação, de descompassar o coração com o impacto do seu encanto de menina num corpo de mulher.
No entanto, sabia ser proibido qualquer sinal ou insinuação. Reduzia à contemplação a sua iniciativa, ainda assim num esforço tremendo para esconder no olhar tudo aquilo que ela fazia disparar nos bastidores do seu emocionário.
Pensava-a em muitos momentos, os mesmos em que se aplicava nos esquecimentos de que necessitava para controlar o efeito daquela imagem no seu peito acelerado e no cérebro agitado que cogitava por instinto as abordagens possíveis para tentar algo mais. Coisa pouca, talvez um pouco de tempo para com ela partilhar um momento longe dos papéis que lhes competiam, das peles que vestiam no contacto institucional...
Depois a vida continuava e ele sentia sempre que tardava a seguinte ocasião em que não permitia que se fizesse ladrão por temer as consequências de um desaire quase certo, sempre que estava tão perto daquela diva ao ponto de quase lhe sentir da pele o mesmo calor que os olhos dela irradiavam sob a forma de luz.
Temia-se absurdo por se atrever capaz de ignorar tudo aquilo que traz de inconveniente a uma pessoa um avanço despropositado, de arriscar um resultado mais desastroso ainda do que o embaraço de uma recusa liminar de qualquer passo que pudesse dar noutro sentido que não o admissível naquelas circunstâncias.
Mas adivinhava as consequências da sua decisão, daquele esforço de contenção de um impulso irreprimível de forçar um milagre possível, um desfecho positivo em potência.
Aquela mulher, por coincidência, era um anjo em versão humana e quase o fazia acreditar que talvez devesse avançar um pouco mais para não se concretizar depois o pesadelo que antevia de cada vez que percebia que o tempo que os aproximava não seria duradouro, iria acabar.
E ele, tão perto do tesouro, já sabia que estava marcado o dia em que se esgotariam as hipóteses de o tocar.

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