31 outubro 2010

Carta de Sophia a Kant

O que não existe dentro de mim não existe, para mim, fora de mim. É por isso que não preciso de um tempo e um espaço ou sequer de um nome que me defina quando me toca o amor. Preciso de ser; mais nada. Porque, quando ele existe dentro de mim, existe fora de mim, em todos os momentos e em todos os lugares, por si mesmo, como o tempo e o espaço para os humanos. Ainda bem que o tempo e o espaço não existem aqui dentro, eles estragam o amor.

«Lídia e Beatriz» por Rui Felício

A Lídia vive sozinha.
Era quase meia-noite quando chegou a casa, no meio de uma tempestade de chuva e vento. Veio de boleia no carro da sua colega Beatriz a quem convidou a entrar para tomarem uma bebida quente. Há muito que a Lídia esperava a ocasião propícia, que parecesse casual, para a levar até sua casa. Agora que a Beatriz andava zangada com o seu namorado, esta era a altura ideal que não podia desperdiçar.
Não conseguia desviar o olhar guloso do corpo sensual da Beatriz, ali na intimidade do seu lar.
Precisava de lhe tocar, de explorar todos os recantos do seu corpo debaixo das roupas que ainda o cobriam. Precisava de encontrar nos seus olhos algo mais que não fosse pudor. Aproximou-se, desapertou-lhe dois botões da blusa, roçou-lhe os lábios em volta dos olhos, passou-os pelo seu rosto e contornou com eles a boca bem desenhada da Beatriz. Sentia que o intenso desejo que a consumia era a pouco e pouco partilhado também por ela. Despiram-se... Não sentiam já vergonha, apenas a ânsia de encostarem os corpos nus, de se acariciarem.
A espera tornava-se agonizante. A Lídia não resistiu mais tempo, tomou a iniciativa, encheu as mãos com os seios da Beatriz, beijou-a sofregamente e arrastou-a para a cama. A Beatriz quase não se mexia, mas os seus suspiros, a sua respiração ofegante revelavam o prazer que lhe retesava o corpo. Abandonou-se às carícias da Lidia. Meteu-lhe os dedos entre os cabelos e agarrou-lhe a cabeça que conduziu pelo seu peito, pelo ventre, pelas coxas. Electrizada, sentiu a língua experiente da Lídia a explorá-la, a penetrá-la.
Quase no auge do prazer a Beatriz queria ir até ao fim. Pedia-lhe mais e mais...
Pedia-lhe aquilo que a Lídia, afinal, não lhe podia dar...

Rui Felício
Blog «Encontro de Gerações do Bairro Norton de Matos»

Momento musical

O OrCa chama-lhe "gaita de falos"

Nunca digas nunca

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30 outubro 2010

Menina II

Amadurecer e morrer são quase sinónimos naquela estrada. Pugna mas não alcances e continua a tentar. Menina sim, mas já não tão dura nem amarga, sentimentos agora ausentes porque lhe foi mostrado o caminho por quem com ela priva, porque já não há lugar à probidade pelo desconhecido, ou porque encontrou um ser de armadura mas permeável.
Na realidade não interessa muito conhecer a pedra de toque, mas sim a doçura que de súbito se apoderou daquele ser lindo e de discurso inebriante.
Continua menina, continua ligeiramente adormecida, mas encontrou o trilho que a levará a sentir. Menina.

Quem tem boas ideias, quem é, quem é?

Fui dar uma voltinha há umas semanas pelo Leroy Merlin de Albufeira.
Despertaram-me a atenção, na secção de almofadas, estas em imitação de pêlo de ovelha. Havia em branco e em negro. Comprei a de pêlo de ovelha negra...


E para quê, perguntais vós? Para pedir à Celestita, mágica destas artes, que me cortasse e cosesse a almofada em forma de triângulo. Et voilà, uma ratola gigante e, como diz a malta por aqui, com muito farfalho:

Surpresa

O tempo não se detém:
passa rápido e só nos apercebemos
quando o momento já passou.

Vou descobrir uma fórmula milagrosa
de deter o tempo
- o momento de -
e a magia da luz
manter-se-á intacta
ao longo dos tempos.

Vou escrever um poema
que não fale de tempo;
que se decline lentamente
- em mim -
entre duas fantasias,
alguns verbos
e a surpresa prenhe.

Poesia de Paula Raposo

Ah, o mar!...



Histórias salgadas


1 página

oglaf.com

29 outubro 2010

Notícias de trás da Serra!

O nosso repórter Carlos Car(v)alho traz-nos a notícia que a PJ de Coimbra deteve um suspeito de ser o alegado autor da morte de «Jaime Ovelha», indivíduo de Proença-a-Velha (concelho de Idanha-a-Nova) que era conhecido na região por, presumivelmente, violar galinhas, ovelhas e outros animais.
O suspeito do crime, ocorrido no dia 19 de setembro, segundo a mesma fonte, será o dono de um burro, que no início do mês tinha sido sodomizado com um pau por «Jaime Ovelha».
O Car(v)alho pede para se "avisar o Bartolomeu que já pode ir a Idanha! Só quando li a reportagem no interior é que descansei: o morto não era o Bartolomeu mas sim esse tal «Jaime das Ovelhas», também ex-praticante de afagos sexuais em galinhas e não só. Desta feita exagerou e foi assassinado pelo dono de um burro que também tinha sido «afagado» (o burro, presumo), para não dizer «fodido», pelo tal «Jaime Ovelheiro». O que é certo é que haverá agora, por aquelas bandas, muita ovelhita carente... (aqui fica o aviso, caso interesse, ao Bartolonosso)."

(fotos também do repórter Carlos Car(v)alho, em Inzell)

Casimiro de Brito apresenta-nos Francisco de Quevedo

"Aqui têm um poema de um dos maiores poetas de língua espanhola de sempre (talvez o maior).
E que me parece adaptar-se perfeitamente ao vosso projecto.
Abraço do
Casimiro"

Desengaño de las mujeres
Puto es el hombre que de putas fía,
y puto el que sus gustos apetece,
puto es el estipendio que se ofrece
en pago de su puta compañía.

Puto es el gusto y puta la alegría
que el rato puteril nos encarece;
y yo diré que es puto a quien parece
que no sois puta vos, señora mía.

Francisco de Quevedo

1580 - 1645
Biografia e alguns poemas aqui

Quase nada

As palavras amarradas graves aos poemas agudos. Esquecer. Deixar entrar. Ouvir o que dizes e mais do que dizes e, para que tudo fales, não ouvir. Mas ouvir. Olhar pessoas que fazem coisas. Despir tudo. Vestir a pele. Ficar pequena, tão pequena, tão pequena que me deito na ponta dos teus dedos. Deixar-te ser grande. Ver-te grande. A noite com lua e a noite sem lua. Os carros passam e as horas também, parecem carros, aviões, navios, comboios, não as apanhamos mas embarcamos. Fugir antes que a manhã escorra o Sol pelos raios. Ser eu como não me sabem nem pensam. Pedir tu. Mais nada. O beco dos gatos. Falar demais, não ser demais. Espaço na nuvem. As coisas estranhas.As coisas pequenas, pequenos eus. A mão. Coca-cola. Cócegas. Ternura. Explicar o medo de todas as coisas. Querer saber. Perguntar-te tu. Café. Tudo isto te dei, de tudo isto te falei. Coisa pouca. Quase nada.


Casalinho japonês entretido em aulas práticas de anatomia

Não dá para apreciar em fotografias todos os excelentes detalhes destas três peças em marfinite.
Pode ser que um dia as possam ver ao vivo... quando houver um espaço aberto ao público com a minha colecção de arte erótica...


O tamanho importa


Timothy Scott Clarke., habitante de Toowoomba (terra com nome de queca ), lá no pub da terra e depois de uns canecos, baixou as calças e cuecas. A animação é pouco por aquelas bandas e os presentes tiraram fotografias. Levado a tribunal argumentou em sua defesa não ter feito nenhuma indecência por ter um bilau tão pequenino que não ofendia ninguém.
Saiu apenas com uma multa e a solidariedade do colectivo.

Previsão do tempo para o fim de semana
















Uma tempestade do caralho!

28 outubro 2010

Arraçada de gajo

Há inúmeros factos que ilustrariam este título.
Em termos de personalidade, creio ser bastante mais masculina do que feminina, pelo menos na acepção que socialmente se dá aos conceitos, independentemente do género. E, normalmente, tudo bem, estou habituada ao contraste entre o aspecto (que, embora sem curvas alucinantes, não engana) e o feitiozinho. O que me lixa, o que me põe pior do que peste, é esta minha "masculinidade" ser tão evidente aquando da manifestação de qualquer doença. Se, por um lado, e fazendo jus à mulher que sou, não evidencio qualquer sinal de hipocondria, por outro, basta que tenha meio grau de febre, como agora, para ficar prostrada, agoniada, dorida, fabricante de ranho, com uma cara que mete medo e um humor que ninguém inveja.
Para ser gajo, mesmo gajo, só me falta ligar para meio mundo e esperar que alguém me venha trazer canja e ter muita pena de mim. Felizmente, é nesse momento (que antecede a pura humilhação) que a mulher que há em mim se sobrepõe.

Que pedazo de tetas


Rotulador sobre papel y photoshop
Inédito
Clic sobre las imágenes para ampliar

Un saludo a los amigos y amigas de a fundasao

Os boneCus do Nelo

Entregue

27 outubro 2010

«Teddy Bear Dicknic»

As coisas que o Fin descobre...

Da evaporação gozosa

Fernando Savater, filósofo espanhol, escrevendo acerca da coragem de escolher, diz-nos a certo momento «que o prazer não é um meio instrumental para conseguir nada, nem sequer um fim em si mesmo, mas a evaporação gozosa da distinção entre fins e meios, sem antes nem depois» (Savater, 2003, p.104). É um interessante ponto de partida, e uma das frases que mais me segura a atenção à medida que passo as linhas. Também me parece assaz interessante uma outra ideia, a de que «o momento do gozo é antitemporal, porque imuniza peremptoriamente contra as recompensas ou castigos do porvir enquanto nos identifica com o que sempre foi, com algo pretérito que se actualiza impecavelmente» (op.cit., p105).

***
Sentou-se no banco ao lado do condutor para mudar de roupa. Não tinha vindo já preparada para a praia, e precisava despir o seu corpo das roupas citadinas, da melhor nata da moda, para vestir um bikini algo reduzido. Ele esperava lá fora, evitando olhar para dentro da viatura, num exercício de pudor e respeito por ela. Imaginava, nos seus segredos, o momento em que o banco daquele carro era tocado pelo mais íntimo pedaço de pele dela. E isso excitava-o. Mas não só a ele. Mesmo para ela, aquele gesto era algo mais do que um aspecto prático, era uma pequena transgressão, o receio de ser apanhada desnudada, a distenção daqueles pequenos segundos em que efectivamente estaria despida num tempo que, para os seus sentidos e percepção do tempo, seriam longos minutos. Os longos minutos dela que contrastavam com os curtos dele, para quem aquele momento era demasiado curto. Sem oferecer um vislumbre, sem poder tocar, sem a poder sentir na ponta dos seus dedos.

***
Por muito interessante que considere a afirmação de Savater, e asseguro-vos que a acho deveras interessante, apenas me parece possível concordar parcialmente: com a evaporação gozosa da distinção entre fins e meios. E discordar do nem antes nem depois. Há um antes do prazer e um depois do prazer, ainda que o momento do prazer nos retire a noção disso.

***
Quando o puxou para perto de si, a erecção dele tocava despudorada a genitália dela, com ténues fronteiras de tecido a marcar uma linha que não se ultrapassaria. Mordia ela os lábios, semi-cerrava os olhos, parecia querer senti-lo dentro dela, e as pernas fechavam-se atrás das costas, os pés trancavam o corpo dele contra o dela. O mundo encolhia e formava-se uma bolha que os isolava de tudo o mais. E depois, depois quando partiram, sentados lado a lado, perguntou-se o que faria aquela mão. Disse que se fosse noutro momento, noutra altura, teria pegado na mão dele. E pegou. Pegou e colocou-a entre as pernas dela. Era um calor húmido, aquele que ali se sentia. O mundo acabava ali. Não havia antes nem depois. Havia aquele magnífico par de coxas que abraçava a mão dele contra uma vulva convidativa. E a mão dela, que fechava o universo, que forçava o contacto. Que dizia que eu quero prazer e tu vais dar-mo. E por mais que se apertassem as moléculas não se fundiam. Agarravam-se o mais que podiam, querendo fundir corpos sem realmente os fundir. Sempre com as ténues fronteiras de tecido a marcar linhas ondulantes ao vento. Mordia ela os lábios e ele mordia o que podia. Ombros, orelhas, dedos.

***
O antes do prazer é um antes de crescendo. Do desejo porventura desmedido, inconsciente, motivador de todas as coisas. Desejo último que arranca forças ao mais esbatido. O depois do prazer é um delta de um grande rio. Dá para qualquer lado num conjunto de fios de água. Navega-se pelo delta de acordo com o talento. Navega-se à vista. Pode ser um depois sereno, que respeita o durante e tudo deixa em paz, ou revolto, nos salpicos de uma luta.

Referência bibliográfica: Savater, F. (2003) – A coragem de escolher, Ed. D. Quixote, Lisboa

no Parlamento, exemplarmente...

Consta que um casal de aventurosos cidadãos escolheu, há dias, as bancadas do Parlamento para, pelas sete horas da manhã, colocar a matéria em dia… Abençoados!
A devida vénia ao Daniel Oliveira, claro, cuja prosa a propósito, de tão sugestiva, não pôde deixar de me inspirar!


num diz-que-disse brejeiro
chega notícia de evento:
um casalinho faceiro
foi dar queca ao parlamento

ah benditos tais confrades
neste gozo em contraciclo
juntando duas vontades
coisa rara no hemiciclo

e bem cedo iniciaram
seus trabalhos estes dois
às sete horas começaram
a chamar o nome aos bois

da esquerda até à direita
travaram-se de razões
que sempre tudo se ajeita
concertando posições

e por certo descobrindo
mais virtudes na função
acima – abaixo – investindo
no futuro da Nação

ritmado o desempenho
em paridade e à vez
- vens-te tu que eu já me venho… –
e coligados talvez

mas foram interrompidos
decerto por vil inveja
que naquela sala unidos
não é coisa que se veja…

doce nos foi a vingança
p’la doce fornicação
por só tanto em tal parança
se fornicar o povão

e cai-nos bem ser diverso
naquela casa algum acto
que foi talvez controverso
mas de espectro bem mais lato.

OrCa

____________________________________________
O Bartolomeu complementa:

"Se ainda houver moral
Neste país trapaceiro
A que chamam Portugal
Onde se fode o parceiro
E tudo vem no jornal
Com o título de «porreiro»

Não se pode condenar
O acto d'aquele casal
Que decidiu fornicar
Onde uma chusma de cabrões
Fodem todo o maralhal
E nos seguram pelos colhões

Deviam ser medalhados
Pela coerência do acto
Se houvesse alguma justiça
Os deputados enrabados
Não com a piça
Mas com um cacto"

Poemas mudos, nós cegos

Desci.
No silêncio de todos os poemas
entristeci.
Chega a madrugada e todas as camas
desfeitas; eu teci
novos lençóis mas não tinha linhas nem rimas
chegaste e eu emudeci.
Deixa-me explicar, não vás, tu dizes que me amas
mas não sabes que ensurdeci;
escuta-me, tu dizes que gritas, que ainda me chamas
mas faz tempo que, sozinha, anoiteci
porque, meu amor, no silêncio de todos os poemas
nua, entristeci
e, sim, eu procurei-te por todas essas camas
não te vi; depois teci
novos lençóis e nem linhas, nem rimas
chegaram sem ti, emudeci.
Lábios frios dizem que ainda amas
ensurdeci.

Senhora

Se de um filme se tratasse, seria um épico... Se fosse uma música, intemporal... Se fosse uma coisa seria perfeita... ou quase, eventualmente perpetuando, possa brilhar...

Senhora. Não será uma menina, mas quem um dia já o foi e cercou a doçura e a segurança... o equilíbrio inebriante. E a dose certa de loucura. A sombra une-se e o fantasma dita as regras sobre dois corpos enamorados à Lua, com as suas almas sobrevoando o espaço. Não é amor. Mas é paixão. É a paixão que em uníssono uivou naquela noite que iniciou a jornada com timidez para terminar em apogeu.

Senhora. De si, do tempo e do espaço. Impérvia criatura de fundo, de coração inabordável e sentidos escolhidos, por si, para si, e para apenas os poucos lobos que saibam à Lua uivar. Que saibam a cor do vento, a cor do brilho da sombra unida.

Senhora cujos compromissos outrora fixados, assumem a forma de cinzento porque a cor confinou no exíguo espaço entre os dois corpos enroscados.

Senhora. De experiência assinalada nas linhas das mãos, delineada no rosto ora singelo, ora absoluto.

Senhora de chave em punho, que desaperta armaduras no colo da noite sentido os pêlos deixando espaço à viagem do fundo.

Senhora que vê sem olhos, sente sem mãos, ouve sem ouvidos e ritma a dança ao som da paixão.

Placa motivacional de hoje


Transformers também têm esse direito.

Capinaremos.com


O Bartolomeu diz algo bem entesante (sim, sim, eu disse interessante):

"Todos nós somos, ou fomos, em algum ponto da nossa existência, robôts!
Na parte que me diz respeito, posso confessar que mantenho uma relação muito estreita com o meu próprio brinquedo. Posso acrescentar até, que a minha direita, já lhe proporcionou alguns melhores momentos, que certas conas, com uma mulher à volta.
Colocando de parte aquilo que à minha esfera íntima diz respeito, declaro profícua a relação, mão-pénis, ou vice-versa. A mão pode perfeitamente substituir ou completar uma cona, um cu, uma boca, umas mamas, uns pés, uns ouvidos ou, até, outras mãos.


E se lhe chamam punheta
Num chamar atravessado
Podem-lhe chamar corneta
Ou um fado assobiado

Se lhe chamam masturbação
Num chamar bem erudito
Chamem-lhe satisfação
Ou um momento bendito"


Mas o Fin alerta e bem: "Falais da mão como se ela fizesse tudo, ora quem realmente o faz é a cabeça. A mão, o pé, um sovaco, um molho de urtigas de pôr a piça em chamas, tudo isso é irrelevante se a cabeça não estiver, também, a foder."

26 outubro 2010

Mijar nos sapatos


A Laura desafiou aqui o Bartolomeu: "Se ainda dá p'ra mijar, fico então mais descansada. Terás é que ter cuidado p'ra não mijares nos sapatos!"
O Bartolomeu tirou-a p'ra fora:

"Pr'ós sapatos não mijo, não
Que são de fina pelica
Até nem mijo pró chão
Se mijar cheio de pica

Mijo longe e à distância
Mijo alto e em quantidade
Mijo sempre com elegância
Apesar da minha idade

Mijo até com fragor
quando mijo da varanda
Mijo antes de fazer amor
Mijo sempre qu'ela me manda

Só não mijo mais porque, enfim
Pode-se-me gastar a gaita
Mas se me cheira a snaita...
Mijo... mijo... sem ter fim"


Ainda isto não foi publicado e já o OrCa revelou a sua incontinência:

"mijar como ele mijou, perdidamente
mijar por toda a parte, aqui e além,
mijar como obra de arte em toda a gente
mijar em pai, amigo e até na mãe

e enfim ficar-se de mijado descontente
por se não mijar então como convém
de cócoras, de pé, deitado, incontinente
e mijo assim por fim molhar ninguém

ó rudeza crua, ó má vileza
ó impotência dura e vão sofrer
de se não mijar à séria na incerteza
de se não mijar mais quando se quer

mas mijemos, então, à portuguesa
mijando a dois e a três... quem mais vier!"

São Rosas: "Em 7 anos, ainda ninguém se tinha lembrado de fazer aqui uma «análise à urina». Só espero conão se lembrem de fazer merda..."

Bartolomeu:
"Ah... a merda
Essa massa informe
Que do cu nos sai, após ser quimo
E da qual não me redimo
Porque não redimo a fome
Numa sequência insane, que se herda!

Ah... a merda
Essa pérfida agonia
Que do cu se espreme, em extremo esforço
A qual, para expelir, todo me torço
Madrasta que o corpo corrompia
Se não fosse sujeitada a grande perda

Ah... a merda
A que faço e de que me esqueço
A que outros fazem e me atormenta
A que de alguns é ferramenta
A que de outros é o berço
A merda... a sempre eterna merda!"

São Rosas: "Pronto... tinha que sair merda..."

O OrCa caga nisso:
"tudo o que de nós sai é escorreito
e é mister que saia - bem sabemos
fluido, fabuloso, rarefeito
mas que nos dê o prazer que apetecemos

mictórico, sudorípero, ejaculante
ranhoso, purulento, cagativo
que afronte o mundo triunfante
mas que dê de nós um ar basto assertivo

e, assim, mijando, venceremos
quando não gritando num orgasmo
ou cagando - que é por isso que comemos
que a ninguém tal felicidade cause pasmo!"

As perguntas cansam-me, baralham-me. Porquê? Porque é que o fizeste? Porque é que não me disseste que eu já não te bastava? Como? Como foi que conseguiste mentir-me? Como foi que me beijaste e fodeste, como foi que me sorriste enquanto me traías? Quando? Quando foi a primeira vez? Quando foi que achaste que não fazia mal, ou que eu merecia a traição, ou que nós não merecíamos a integridade? Quando foi que decidiste sozinho quebrar o acordo que em conjunto tínhamos firmado?
Estas perguntas, tantas, sempre as mesmas, atravessam-se à minha frente quando menos as espero. Quando o teu telefone te chama, quando os teus olhos me evitam ou se perdem longe, quando te procuro e não estás. Assaltam-me até quando me pões a mão dentro das tuas calças e duvido da musa da tua tesão.
É por isso. É por isso que o meu corpo já não é só teu. É por isso que seduzo e me deixo seduzir sem remorsos, com prazer até, este prazer de laranja amarga que me impele a limpar de mim a tua presença, a cada dia, porque a cada dia a tua presença me deixa vergastadas nas costas.

Medeia - [Infidelidades]

Canela

Falamos de amor:
um quadrado cheio de canela;
um círculo feito de
gomos de limão
e a música – sempre –
a olhar para nós.
Viste?
Despimo-nos enquanto
o tempo se lembrou
de frases sem sentido.

Poesia de Paula Raposo

Taça de escanção («taste-vin»)

A compra mais recente da minha colecção é esta taça para provar vinho, que o escanção usa tradicionalmente num colar ao pescoço.
É uma taça metálica banhada a prata. E, claro, tem uma imagem em relevo que é um miminho.
O Bartolomeu dá-lhe o devido valor: "É balioza... Tem contraste e tudo! Seu tibesse uma taça assim... já tinha onde labar os cuolhões... depuois probaba a aguínha, estalaba a língua, bexexaba, cuspuía e declaraba solenemiente: colheita de mil nobecientos e cinquenta e cinco, acentuados aromas a cuona cum intermitências de cúe e generuosos taninos bucais, carnúodos e silbestres intrebalados de nuances espanholadas cum banhos florais e outras cenas que tale..."



25 outubro 2010

De pernas para o ar

É estonteante a quantidade de gente que para aí anda a tentar fazer ultrapassagens a cento e oitenta sem carta de condução sexual! Para complicar, só mesmo os cavalos, carros de bois e triciclos a pedais que volta e meia se aventuram por essas auto-estradas afora! Isto com uma operação stop, era meio mundo de “cana”! É que era certinho!


Júlia - O Bloquear dos Sentidos

O quarto estava escuro. Apenas os sentidos mais apurados podiam tomar conta de uma situação que por si toldava a realidade. A pequena janela iluminava dois corpos puros de sentimento, levemente afastados das almas que em uníssono gritavam de prazer. As paredes contavam histórias, e escreviam-nas com tal poesia que os próprios teriam dificuldade em reproduzir. Júlia tem sensualidade a correr nas veias e desperta emoções que apenas existiam no domínio da imaginação. Os cinco sentidos estão bloqueados. O envolvimento só deixa margem a que se ligue o interruptor do apocalipse do racional. Os dedos percorrem a pele suave com delicadeza, os lábios tocam-se em ritmos alternados, a sombra dos corpos imprime pinturas no quadro de ilusões. A Lua e as estrelas cantam a paixão à plateia de dois seres que esqueceram o imediato, o importante, o real. Júlia observa o resultado da sua experiência. E gosta. Sente-se realizada e envolvida. Sente o hoje, o ontem e o amanhã, fundidos nas horas de magia que acabou de sentir e proporcionar. Panos que caem do tecto que já não servem para esconder as ilusões, mas para não permitir que olhares indiscretos irrompam pelo teatro de sentidos e emoções que decorre naquele quarto. É magia. É Luar. É Paixão.

O mordomo saca-rolhas

Ainda podemos ter algumas mordomias.
Este saca-rolhas veio de Inglaterra (mas, como é hábito, «made in China») para a minha colecção.


Galinhas não são para casar


Alexandre Affonso - nadaver.com

24 outubro 2010

Pulsação

Os olhos escondidos na gaveta dos pensamentos, eles passeiam imagens das ruas e de guardar a mão na tua, apertar-te com força um dedo, tu já não estás aqui, contavas-me de ficar e dos beijos e das estrelas e dos milagres no entardecer, os passos quase ofendidos com saudades do chão, o silêncio que os dedos podiam tocar, novos pianistas, a tua barba por fazer, o cheiro de seres tu, tu já não estás aqui, os retratos do teu mundo largados no meu colo, querias ouvir-me o que mais ninguém te soube dizer, instantâneos desfocados, pouca cor à tua volta via eu lá fora, agarrava-te ali e tudo, tudo, tudo era, foi, tu já não estás aqui, rias-te e eu podia viver, o teu olhar acordava as lágrimas bonitas, sentias-me quase tudo e eu a tua roupa, e o teu cansaço na minha cama, caías para eu o combater, arrasta-o até mim que eu mato-o com os lençóis, abraço-te e posso morrer assim, assim, aqui, tu já não estás aqui, dou-te as faces rosadas, o banho tomado, os pés tão pequenos, dou-te o vibrato, o vento e a vida do meu sonho, quando falo mordo nas palavras entre espaços, se calhar magoei-as, cuidavas de mim e afinal eu não cuidei de ti, abraça-me, abraça-me, abraça-me só mais uma vez, tu já não estás aqui. Eu também não.

«O ponto G (assim designado em homenagem ao ginecologista alemão Dr. Grafenberg, que o localizou)» - por Rui Felício

Deitada de lado, de costas para o marido, preparando-se para adormecer, a Sandra fingia não sentir o leve deslizar da ponta do dedo dele nas suas costas nuas, quase sem lhe tocar, descendo devagar desde o pescoço até à cintura e voltando a subir até perto dos ombros.
Gradualmente a pressão do dedo ia aumentando. A pouco e pouco, já não era só um dedo mas toda a mão. Sempre em silêncio...
Ouvia a respiração do marido aumentar de cadência. Ela própria abafava os gemidos que lhe começavam a querer sair da garganta. Já não conseguia controlar as contracções do seu corpo que procurava disfarçar para prolongar o prazer daqueles momentos de fingimento.
Arrepiou-se quando sentiu o sexo do marido latejar, já encostado às suas nádegas. Passou disfarçadamente a mão pelos mamilos endurecidos, prolongando a imobilidade, o fingimento.
Mas não resistiu muito mais, empurrou o corpo contra o do marido, encaixou-se nele, passou o braço esquerdo para trás e encheu a mão com o pénis duro que a enlouquecia. Ele abraçou-a por trás, acariciou-lhe as mamas, beijou-lhe a nuca, a orelha, sussurrou-lhe o nome...
Soltou um gemido quando sentiu os dedos dele penetrarem nela e explorarem a vagina inchada e molhada. Voltou-se, flectiu e abriu as pernas, puxando a cabeça do marido para o seu tesouro.
Gritou de prazer quando lhe sentiu a língua, primeiro a lamber, depois a invadir-lhe as entranhas, ao mesmo tempo que ela enchia a boca com aquele pénis levantado, tumefacto, que chupava em movimentos cada vez mais rápidos, num crescente frenesim.
Ele sabia onde devia tocar-lhe para a levar à loucura, ao descontrole total... O orgasmo que a fazia alcançar o céu surgia quando ele lhe tocava com os dedos no Ponto G.
O que ele não sabia era que a Sandra, sua mulher, obtinha um orgasmo ainda mais intenso quando explorava e tocava naquilo a que ela própria, de forma imodesta, baptizou de Ponto S, em homenagem ao seu próprio nome.
O Ponto S era o cartão de crédito do marido, cujo PIN ela um dia descobrira sem ele desconfiar...

Rui Felício
Blog «Encontro de Gerações do Bairro Norton de Matos»

Talibanismo, falta de respeito, vacas sagradas, protecção dos animais ?

"Um cartoon que mostra a família real dinamarquesa a participar numa orgia levou ao cancelamento da exposição dos seus autores, o duo composto por Jan Egesborg e Pia Bertelsen, do colectivo de artistas dinamarqueses Surrend."

O gajo mais contente é o da ovelha. Acho que foi isso que irritou toda a gente pois não é lá muito abonatório para as dinamarquesas.

A transformação de uma geisha vista por Matthew Allard

Grandes males...

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23 outubro 2010

O Quarto do Vazio - Memória da Paixão de Júlia

JÚLIA: Olha... Lembras-te de mim? A Júlia que passeia letras...
Ele: Como poderia não lembrar? Sublinhaste o desenho...
JÚLIA: Eu só pinto. No inesgotável quadro que cresce de ilusões...
Ele: ...beijando, olhando extasiada... arrebatada...
JÚLIA: És um amante...
Ele: ... és sensual, doce...
JÚLIA: ... um amante terno...
Ele: Deixaste aqui uma sombra viva...
JÚLIA: Eu gosto da sombra... e do movimento do corpo... e do ritmo...
Ele: ... a silhueta que criaste naquele espaço. O anoitecer... a lua a aparecer... o uivo dos nossos corpos enroscados...
JÚLIA: ... e as palavras a sobrevoar...
Ele: ... metade ouvidas, metade sentidas...
JÚLIA: ... e outras que nem damos por serem nossas...
Ele: ... e os nossos corpos a libertarem as almas que nos observavam...
JÚLIA: O corpo sem entender, chamou-lhes fantasmas...
Ele: ... ao som daquela música... ouvias a música?
JÚLIA: Na verdade estava completamente surda...
Ele: Eu só ouvia a música... eram os meus olhos que só olhavam para interiores...
JÚLIA: ... sombras das cores...
Ele: ... cores do vento ao brilho da Lua...
JÚLIA: ... lua lanterna que brilha e ilumina corpos celestes...
Ele: ... corpos que pairavam...
JÚLIA: ... pairavam nas estrelas. Lembras-te das estrelas?
Ele: Lembro-me da estrela interior que os meus olhos cegos conseguiam ver.
JÚLIA: Os teus olhos não estavam cegos... Olhavam para os meus...
Ele: Mas não viam... apenas sentiam...
JÚLIA: Como eu não te ouvia... só te sentia em mim.

A procisSão das velas

Descoberta viva

Podemos encher páginas
e páginas em branco
e alimentar uma ideia
- pequena -
como se fosse
uma descoberta viva.

As pequenas ideias
e as páginas em branco
flutuam em sintonia,
no silêncio - desmascarado -
de uma viva descoberta:
este é o lado errado de nós.

Poesia de Paula Raposo

O amor é uma coisa linda!



Cena à varanda


1 página

oglaf.com

22 outubro 2010

O Botão

– Sabe do que eu gostava, Alice?
– Sabe?!
– Sabes do que eu gostava?
– Sim, assim está melhor. Do quê?
– Se calhar, vai… vais levar a mal.
– Diga, homem. Se não disser…
– É que eu gostava muito.
– O que virá daí…
– Se calhar ficas aborrecida.
– É provável…
– Que fiques aborrecida?
– Sim, é muito provável, sr. Cruz, é que o senhor ainda não me disse nada e eu já estou a ficar aborrecida.
– Ah!… Queres dizer que, seja como for, já não me escapo?
– Mas o senhor quer escapar?
– Não, não quero.
– Então o quer, sr. Cruz?… Olhe que o seu tempo está a acabar.
– Ao tempo que o meu tempo está a acabar.
– Eu não estava a falar desse tempo, sr. Cruz.
– Eu calculei… Está quase na hora, não é?
– É. E estou quase a acabar e o senhor ainda não me disse o que quer.
– Não levas a mal?
– Hum… mas o que é que irá sair daí? Devo ficar preocupada?
– Não, preocupada não, não há razões para isso.
– Menos mal… Pode-se virar para dobrarmos as pernas.
– Para dobrarmos não, para eu dobrar.
– Só se for hoje, seu preguiçoso!
– Mas as pernas são minhas.
– São, quanto a isso não há dúvidas, mas como sou eu que as dobro.
– Isso é verdade… Podes-me pôr a almofada debaixo da cabeça?
O homem virou-se de barriga para cima, a mulher pôs-lhe a almofada debaixo da cabeça e, sorrindo, dirigiu-se aos pés da cama, onde lhe agarrou os pés.
– Vamos lá! Vou-lhe só levantar e segurar os pés e o sr. Cruz vai tentar dobrar as pernas.
– Ah…
– Força!
– Mais?
– Baixe a cabeça… Encoste a cabeça à almofada.
– Eu…
– Boa! Está a ver…
– Agora não.
– Outra vez. Estique. Vamos lá. Agora não? Agora não o quê?
– Não estou a ver.
– Boa! Dobre. Dobre. Está quase, está quase… Não estou a perceber nada, sr. Cruz. Não está a ver o quê?
– Nada. Não estou a ver nada.
A mulher segurou-lhe os tornozelos e empurrou-lhe suavemente as pernas, dobrando-as. Levantou a cabeça e olhou para a cabeça do homem pousada na almofada. O homem tinha os olhos fixos no tecto e uma estranha expressão de resignada tristeza. Em silêncio, ela flectiu-lhe as pernas mais algumas vezes.
– Já está – disse, terminando o exercício e esticando-lhe as pernas, enquanto se endireitava. Olhou para os pés do homem e, quando levantava a cabeça, espantou-se com a clara visão dos seus volumosos seios apertados no soutien rendado branco entre o tecido da bata que tinha um botão aberto a mais e, repentinamente, compreendeu o sentido da conversa do homem e a expressão amargurada com que ele contemplava o tecto.
Nesse momento, o homem levantou a cabeça e os olhos de ambos cruzaram-se, antes dos deles descaírem, por um instante apenas, para o acidentalmente generoso decote da fisioterapeuta.
– E, afinal… – a mulher decidiu dar a entender que não tinha percebido o olhar guloso do velho artrítico e, enquanto ajeitava a bata e fechava o botão, tornou ao desejo inconfessado do homem: – O sr. Cruz não me disse o que queria.
Injuriando em silêncio os dedos ágeis da mulher que fechavam o relapso botão da bata e lhe trancavam a felicidade por trás de um pedaço de tecido, o velho sr. Cruz murmurou:
– Fica para a semana, Alice. Fica para a semana.

Silêncio

Trago o corpo de silêncio vestido
agora a espera pode esperar
que a pele vestida de silenciar
é incêndio desfeito em tecido.
Porque trago o eu do corpo perdido,
trago o corpo do meu corpo despido
agora o sono pode adormecer
que a pele vestida de tanto ser
é desejo no teu corpo cosido
e trago o corpo de silêncio vestido.


E tu, já consultaste o diciOrdinário ilusTarado hoje?

A cultura é uma coisa muito linda!
E ser ordinário não significa ser inculto!
Que o diga a nossa membrana Jacky, que mostra ao mundo o que anda a ler:

A co(n)elhinha


I LOVE YOU ISSUE NO. 4 BUNNY from e-design+ communication gmbh on Vimeo.

21 outubro 2010

Por encomenda

Geralmente, não escrevo por encomenda.
Escrever é, para mim, um momento catártico, que ocorre porque tenho necessidade dele, nunca o contrário, quero dizer, raramente é a escrita que precisa de mim.
Abro excepções quando as circunstâncias me levam a aceitar escrever com um objectivo, seja porque o tema me interessa sobremaneira, seja porque quem mo pede merece todo o meu respeito. Desta vez, a razão preponderante foi a última: uma ex-aluna, responsável por uma publicação lá da UCP (a Critério), consciente de que entre nós dificilmente haverá comunhão de pontos de vista (e que, ainda assim, preza tanto a minha perspectiva como eu a dela), pediu-me para redigir um texto sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo, temática em que, para não variar, não concordamos em nada.
E fi-lo, no prazo auto-estipulado, ainda que soubesse que dificilmente conseguiria ser original ou sequer interessante. O resultado foi este:

É ainda com alguma surpresa que sou chamada, com regularidade, a posicionar-me ou a moderar debates sobre a contenda que constitui o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Esqueço-me, frequentemente e em consciência, de que é ainda uma questão controversa, para alguns, o que para mim é tão discutível como a cor do mar ou o cheiro das castanhas. Mas, porque vivo em sociedade, rapidamente reponho a minha falha e, sob a égide do Pensamento Crítico, debato o que, quanto a mim, não passa de preconceito e pronuncio-me sobre a vida íntima dos outros. Assim seja.
 
Filha que sou de um casal absolutamente tradicional (no sentido em que casou e me gerou sem recorrer a quaisquer métodos para além dos que a [sua] natureza lhe colocou ao dispor), descendentes que são meus pais de outros casais igualmente condizentes com os (assim chamados) padrões “normais” da nossa sociedade, desconheço onde está o gene que me leva a, sem qualquer lirismo, afirmar-me pelo amor, seja ele entre homem e mulher, entre dois homens ou duas mulheres. Ou saberei: não havendo, até ver, nenhum familiar homossexual por quem tenhamos de empunhar bandeiras, ou fazer desviar convicções, nasceu nos meus avós, hoje octagenários, este respeito pelo outro (seja ele quem for) que, não escolhendo cores nem géneros, também não tem por que indagar orientações sexuais. E, paradoxalmente, de uma família onde a atracção por pessoas do mesmo sexo é vista sem qualquer pudor ou adjectivação anómala, nasceram seres humanos heterossexuais. Ao menos, até ver, já se sabe.
Fui ensinada a acreditar (e nada, na minha vida adulta, me fez crer que deveria ser de outro modo) que qualquer ser humano é digno de direitos, liberdades e garantias iguais, independentemente das características que o particularizam enquanto indivíduo, e desde que cumpra os deveres que fazem dele um cidadão. Deste modo, afigura-se-me como absolutamente desnecessário empreender um amontoado de razões que sustentem a minha convicção de que, se todo o ser humano tem o direito a contrair casamento e constituir família, então qualquer ser humano tem o direito de o fazer (é redundante, mas os contornos silogísticos enterneceriam Aristóteles), sem excepções. Da mesma forma que nenhum homem e nenhuma mulher heterossexuais são obrigados a submeter-se a um teste de fertilidade por forma a comprovar que podem procriar, porque não é essa a pedra de toque do casamento (segundo a lei civil de qualquer país democrático), parece-me desprovido de sentido negar a quem, biologicamente, não pode reproduzir-se com o parceiro, o direito de constituir família. Se assim fora, também a uma mulher na menopausa ou a um homem infértil estaria interdito o laço.

Cumpre-me também assinalar o tão invocado argumento natural: anda o ser humano, há séculos sem fim, a negar ser pura natura e, de repente, num acesso saudosista, parece pretender regressar-lhe. Mas apenas em parte, o que me provoca perplexidade: “a homossexualidade não é natural”, invocam certos bloggers, através da ferramenta internet, enquanto os seus leitores, bebendo uma Coca-Cola light e envergando uma parka de nylon, porque o ar condicionado avariou, acenam uma cabeça de onde pendem fios de cabelos aclarados e esticados a poder de escova e secador e onde se observam meia dúzia de piercings, olhos esbugalhados, pela concordância e pelo rímel. Tudo perfeitamente natural, portanto. Como será absolutamente normal a reivindicação taxinómica: chame-se-lhe outra coisa, que não casamento, porque esta é a nomenclatura religiosa. Sê-lo-á, mas é de casamento civil que falamos. E se o casamento civil se chama assim e não de outro modo qualquer, não fará sentido algum arranjar uma qualquer designação substituta: trata-se de um mesmo contrato, que obriga as partes da mesma forma e, como qualquer contrato, não deverá atender a pormenores de somenos, na medida em que, como já afirmado, não será a incapacidade de se reproduzirem pelas vias naturais que virá diferenciar os contratantes.

Uma última palavra para a questão que se segue: a adopção ― que choca uns, baralha outros e é aceite por uma imensa minoria. Aquela que, como eu, acredita que o amor não tem género; que uma mulher não é necessariamente uma figura maternal e que um homem nem sempre representa a dimensão paternal; que não se trata de sexo mas de amor e que, se a criança tiver adultos, agentes cuidadores que a amem, pouco (lhe) importará de onde vem esse amor: de um homem viúvo, de uma mãe solteira, de dois pais, duas mães, ou um pai e uma mãe, amor é amor e é por ele que se constroem seres humanos melhores. Seres humanos como os meus avós, que me ensinaram, por intermédio dos meus pais, que havia muita gente diferente de mim, que merecia o mesmo respeito que me ensinaram a reclamar. Que criaram seres humanos que, um dia, se decidirem procriar (porque a sua escolha não depende de uma lei), ensinarão os seus filhos que, na escola, encontrarão muitos meninos que não são filhos de gente com determinada orientação sexual mas, tão só, filhos de gente que escolheu amá-los. Exactamente iguais a eles, portanto.

não são rosas, senhor! não são rosas!


são... koises! koises a montes para que a tampa possa saltar...

oh tu aí, faz-me saltar a tampa...

(fotografia de Lia Whiting, tirada algures na Ericeira)
________________________
Com direito a ode do OrCa:


"ai, Portugal, Portugal,
tu não me leves a mal,
mas seres único no mundo
de pénis colocado à venda
quer dizer, muito no fundo
e para que bem se entenda
que ao estrangeiro se avisa
desta subtil maneira
que aqui se combate a crise
dependurando a alheira...

pior, usar um caralho
para retirar caricas
é coisa feita a retalho
lembra coisa de maricas

e pendurar-se o zé-nabo
assim por tristes razões
faz lembrar ao fim e ao cabo
de que serve ele sem colhões..."

São moda

Exercício de conforto

20 outubro 2010

«Desafios em Fusão» de Anna Ruta e Rui Reis

Eu já comprei este livro há algum tempo. E recomendo. Resulta de textos trocados entre os dois autores que estavam separados, em países diferentes.
Mas escutar alguns dos poemas desse livro, ditos pela voz de ouro do nosso Luís Gaspar, é um luxo.
É aqui, no


nº 50 da Poesia Erótica do Estúdio Raposa

NASA lança projecto ambicioso para entrar em contacto com espécime do sexo feminino

Numa incursão pelo Youtube descobri esta pérola. Trata-se do vídeo de uma conferência de imprensa onde 3 especialistas da NASA anunciam o lançamento de um programa que, em 2018, os levará a entrar em contacto próximo com um espécime humano do sexo feminino, no ambiente de uma instalação de processamento e limpeza de fibras têxteis, que é como quem diz, para abordar a brasa da lavandaria.

Trata-se obviamente de um vídeo satírico que consegue retratar muito bem a complexidade e a minúcia com que a NASA elabora os seus projectos, assim como a parafernália infográfica com que estes são apresentados.


Cortes

Saberás que ainda te espero
na torre escondida do meu castelo
escrevo-te tempo para o tempo passar
Saberás que ainda te quero
nas ameias deste meu reino de gelo
invento histórias de desencantar.

Sabes, eu cortei o longo cabelo
era apenas escada para te lançar
quando ali te esperava só por esperar
De rainha a princesa deste triste castelo
perdi, sou princesa e continuo a reinar
cortei o cabelo, não te consigo cortar.

Menina

No esparguete de certezas emaranhadas na meninice do seu corpo e da sua alma, ela tenta encontrar alguma doçura que lhe falta. O avelã dos seus olhos expressivos e transparentes, o vermelho pálido do seu cabelo solto e simples, a cara bonita e dura que não disfarça com tinta social, o corpo formado com formas de experiência apressada, era assim ela. Porém linda, não doce nem querida, mas linda. Eloquente, todavia ligeiramente adormecida. Menina.

Placa motivacional de hoje


Com proteção, use sem moderação.

Capinaremos.com

19 outubro 2010

Conhecer Joana Well

Creio que ela não o terá notado, mas a verdade é que me apresentei particularmente ansioso. Não é todos os dias que se conhece uma prostituta. E, no entanto, depois de a ter conhecido, fiquei com a legítima dúvida: será que, realmente, nunca conheci, ou conheço uma prostituta? Porque, como o comprovei, uma prostituta não é uma mulher diferente das outras. Esta, seguramente, não o é. Não exteriormente. É uma mulher como tantas com quem nos cruzamos nas prateleiras dos supermercados, seja nos iogurtes ou nos enlatados, ou na secção dos frescos. Não creio, de facto, que ela o tenha notado, mas eu ia ansioso. Porque ia conhecer uma prostituta. Porque na minha cabeça isso tem um certo quê de transgressão, mesmo sabendo que eu não ia recorrer aos seus préstimos. Com efeito, o meu interesse em Joana Well é a escrita e não o sexo.

Admito, e espero que deste modo ela não se sinta diminuída de forma nenhuma, que poderia ser pior se ela se apresentasse como uma bomba feminina. Mas não. A sua figura extremamente discreta, neutra, motivou uma súbita queda nessa ansiedade antecipatória. Cumprimentá-la e ter, finalmente, perante mim a pessoa que escreve o que escreve, desfez qualquer stress.

Como é conhecer Joana Well?

Conhecer Joana Well (não em sentido bíblico, note-se) é fazer uma incursão num mundo estranho. No mundo de uma pessoa que apresenta dificuldade em valorizar as suas qualidades como escritora, e que se compara - talvez constantemente - aos grandes autores que lhe servem de bitola. A exigência pessoal é elevada, e isso leva-a a um universo de espanto e dúvida. Espanto pela atenção que recebe, dúvida acerca das qualidades. Tentei explicar-lhe, e suspeito que em vão, que as pessoas, as pessoas que interessam, provavelmente seguem com atenção a sua escrita porque ela transmite emoções. Emoções não raras vezes fortes, e que sedentos como estamos de escrita emotiva, é fácil encontrar interesse nas palavras que ela articula ainda que estas, na sua análise, não sejam esforçadas como lhe parece que a um génio criativo se exigiria. Não posso estar de acordo, e assim lho disse.
Para mim, a genialidade é pura. Fluída. É algo que nos sai sem esforço. Julgo que ela o tem.

Joana Well é uma figura rica, e nesse tanto acredito que seja uma puta desafiante. Quem a conheça (agora sim, no sentido bíblico) poderá passar, em acto contínuo, de um sexo suado para um aceso debate sobre as singularidades da alma ou, até, da geopolítica e da alta finança. "Ahhh, assim é que é, mexe-me esse rabo", dirá ele, e ela poderá responder algo como "nesta posição em que estou, temo que o FMI entre forte e feio". E não seria de estranhar.

Encontrava-me, assim, movido pela curiosidade de conhecer essa figura afável da internet. Que responde às pessoas com toda a correcção e simpatia, que escreve coisas que eu sinto, por vezes, muito duras, muito emotivas. Sinto, verdadeiramente, ter saído deste fugaz encontro mais rico do que cheguei. A Joana Well, que eu jamais reconheceria na rua, é uma mulher interessante. Despistada, numa frequência diferente da de quase toda a gente, mas aposto que muito consciente das coisas que definem a existência: as emoções, os paradoxos, os grandes cinzentos dos quais tantas vezes procuramos fugir, ávidos de uma definição precisa de branco ou preto.


Agora choras. Agora escondes a cara na minha almofada e choras. E soluças e pedes que te ame. Agora choras. Agora choras e esperas que eu não seja a mulher a quem mentiste mas sim a amiga que te ampare. Que te seque as lágrimas. Que te abrace. Agora choras e esperas que te dispa e que me dispa, que te envolva e que com o sexo te resgate. Com o sexo. Agora. Comigo.

E enquanto choras eu fico mais zangada. Não porque choras. Mas porque esperas que te console. Porque não posso estar zangada para te poder valer. Porque não posso ser a mulher traída enquanto te embalo e te sussurro que vai ficar tudo bem.

Agora que esgotaste as minhas lágrimas.

Medeia - [Infidelidades]


Receio

À tua volta
receio a saudade,
não a querer minha;
resolver voltar
e o barco que me espera,
tanto é o receio
de à tua volta
a saudade nossa.

O teu olhar pasmado
eu sem saída,
eu pensando (ainda)
na volta do receio,
quando o receio
nos volta.

Poesia de Paula Raposo

Muito melhor que um postalinho...

... é receber de oferta do editor um livro sobre «o erotismo através do bilhete postal ilustrado», coordenado por Manuel Sousa Figueiredo e com prefácio de Baptista-Bastos.
Já tinha a primeira edição (de 1999) na minha colecção mas esta, revista e aumentada, ainda está melhor.
Obrigada, Luís Gomes!
Recomendo uma visita ao site da Althum, onde se encontram muitas obras (livros e não só) interessantes.

18 outubro 2010

“Assédio, abuso, e violação sexual virtual” ou “Olareca!”

Andava eu ontem a “passear” por aí, ainda dando os meus primeiros passitos no facebook, qual criança encantada com o seu brinquedo novo, quando, de súbito, fui vítima de um ataque de agressividade e violência inusitadas. “Assédio virtual”, seguido de “abuso sexual virtual” e, por último, “violação sexual virtual” (ainda por cima sem direito a preliminares!). É certo que, em certa medida, tudo isto foi de alguma forma “consentido”, uma vez que neste ambiente virtual nos é sempre permitida a opção do: “bye, bye, delete”. Mas, muito embora o dedo me pendesse para o “clic fatal”, acabou por prevalecer o meu grande amor à ciência! E assim foi. O agressor era um homem que se fazia passar por mulher, ou vice-versa, não entendi bem, ou seja, algum espécime de urso pardo de dente muito afiado, notoriamente especializado em “sexo virtual”, e que fazia gala em envergar um strap-on, ainda que estivesse convencido de que eu era um homem. (Confusos?) De maneira que não foi fácil sair dali sem uma grande dor de cabeça, ou algum dente partido no instrumento que a criatura insistia, por força, em enfiar no primeiro buraco que lhe aparecesse a jeito. A tão experimentadas e violentas investidas valeu-me tão só este maldito sentido de humor, ainda que não haja “bela sem senão”, ou “rosa sem espinhos”, e tenha o mesmo sido responsável para que a altas horas da madrugada, já com um olho menos aberto que o outro, andasse eu empenhada em conservar em álcool etílico o extraordinário evento para mais tarde o recordar (quero dizer, a guardar o histórico do chat). Apesar dos métodos nada auspiciosos à excitação, e das minhas sistemáticas recusas, por vezes violentas, em nenhum momento a criatura se demoveu dos seus intentos, e ainda menos quando, ao cabo de cerca de uma hora, acabou por me vencer pelo cansaço. Disse-lhe “tchau, bye, bye, darling” e, (trabalhos meus!), fui tratar da tal tarefa de guardar a longa “conversa” que até aí já tinha decorrido, abandonando a caixa de diálogo aberta. Por fim, dado o adiantado da hora, e já mais morta que viva (que isto do sexo virtual, ainda mais quando forçado, também cansa), cheguei às últimas linhas da caixinha, verificando com alguma surpresa que havia sido presenteada com mais esta maravilha:

03:54 Libélula
Bem… já ri o suficiente por hoje.
Tchau
03:54 Criatura
PUTA!
CABRONA
RELES
ORDINARIA
CADELA!
GOSTAS NÃO GOSTAS DE LEVAR COM ELE NA CONA?
DIZ Q GOSTAS
VAMOS
ESTAS A ESFREGAR O GRELO SUA GATA COM CIO?
ESFREGA-O COM FORÇA
SIMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
SIMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
MAIS FORÇA
ANDA
APERTA O GRELO
ESFREGA-O!
MAIS
MAIS
SIM
FORRRRRRRRRRRRRÇA
FORRRRRRRRRRRRRÇA
MAISSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS
SIMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
SSSSSSSSSSSSSSSSSSIMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM
PUTA!
ESFREGA-O COM MAIS FORÇA
ABRE AS PERNAS
QUERO-AS MAIS ABERTAS CABRA!
VEMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM-TE
TE
VEMMMMMMMMMMMM-TE
VEMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM-TE

E esta, hein?

Hoje, com mais calma, fui dar uma espreitadela aos blogues deste senhor. Digo “senhor”, pois duvido (perdoem-me cavalheiros!), que alguma mulher (mesmo sendo das tais de barba e bigode) fosse capaz de tamanha cretinice ou brutalidade! Como se não bastasse violar-me virtualmente e insultar-me à conta de alguma tara sexual belicista e irracional, ainda me queria fazer vir à força! Passa das marcas, não?? E não é que para meu espanto, apesar de aparentemente foragida de alguma jaula e dos graves danos cerebrais, a criatura sabe ler, escrever, e contar?

O Quarto do Vazio - O Castelo

Júlia, endereço artístico de cinco letras que escolheu para que remetam a prosa que lhe dirigem, pintadas que estão as paredes do quarto que a cercavam e entreaberta a janela transparente porta do mundo, augura novos propósitos na condução da sua forma de subsistência. Já é Júlia que escolhe as marcas dos sapatos que impregnam a sua alcatifa. Já é Júlia que dita as horas, as regras, o tempo e o espaço para si própria. Antes, Júlia via as coisas pela frente e perguntava-se “Porquê?”, hoje ela lobriga situações pelas quais questiona “Porque não?”. Júlia encontrou o seu castelo, repleto de brilho e cor, juntamente com outras princesas que souberam brilhar para além do seu quarto do vazio, onde cada uma delas e juntas orquestram a quantidade e qualidade dos sapatos que pisam aquele soalho. Sim, já não se trata de uma velha e gasta alcatifa, mas de um soalho nobre, com estilo e presença que só se permite ser pisado por sapatos de qualidade. Que só se permite ser atravessado por quem procura qualidade. Sim, já é uma casa inteira e não um singelo quarto com uma cama e panos que caem do tecto. As ilusões ainda existem e são privadas, mas não tão primitivas como outrora, até porque para a maioria dos Homens, as ilusões são tão necessárias quanto a própria vida, e Júlia existe para satisfazer esse hiato da existência.

O Abre-latas feliz

À escala real, este felizardo (isto é, feliz sardo) teria um bengaleiro com um metro!
O que procurei por isto em Portugal... mas abençoada internet, que bastaram meia dúzia de clics para isto vir direitinho para a minha colecção.




Tirando satisfação


Alexandre Affonso - nadaver.com

17 outubro 2010

Hipnagógico

Quando estou naquele não estar, só respiro;
aquele, sim, em que tantas vezes me vês
aquele que nunca te sei explicar, eu nego
o que sei uma e outra e ainda outra vez
e rodo, boneca tonta a esbracejar assustada
e faço perguntas ao azul do meu pássaro,
só ao azul porque o pássaro já está cego
tantas penas o cegaram. Morreu. Suspiro,
eu bem sei que também estou ferida
e os dias continuam a passar; os três
cada vez mais despidos da manhã, o logo
cada vez mais nascido das trevas; retiro
a pergunta com medo, eu sei, mas através
dos joelhos no chão logo me vejo puxada
pelos fios das novas matemáticas. Juro
que nada sei e não me largam. O fogo
aponta-lhes todas as paredes e eu, cercada,
acordo bem viva e fugirei para o grande lago,
espera-me lá o meu pássaro azul tão escuro.


«Sonho Cumprido» - por Rui Felício

A Sandra despiu-se lentamente. Primeiro os sapatos, a seguir a saia, a blusa, o soutien, toda a roupa, peça por peça, até ficar nua. Flectiu uma perna, depois a outra, deitou-se de costas, o corpo lânguido, a boca entreaberta, os olhos semicerrados a fitarem um ponto vago e indefinido.
Primeiro os dedos, depois as palmas das mãos começaram a percorrer o seu corpo. A cada toque, o pensamento divagava, os olhos quase se fechavam. Conseguia ouvir a cadência do coração a bater dentro do peito, o prazer inundava-a...
Não resistiu, estendeu o braço e envolveu com a sua mão aquele objecto duro de textura suave, ligeiramente húmido, que sempre estivera ali a seu lado.
Conduziu-o para junto do rosto, sentiu o seu perfume, passou-o pelo pescoço, pelos seios. Fazia-o deslizar em movimentos ondulatórios, ora com maior ora com menor pressão sobre a pele.
Levou-o a descer pela barriga, acompanhando os movimentos das ancas. Escorregou-lhe da mão, já molhado, revestido por um liquido espesso e cremoso. Tacteou avidamente aquele instrumento de prazer e voltou a pegar-lhe, desta vez com mais força.
Agora, fazia-o deslizar pelas coxas. Entreabriu-as lascivamente e levou-o aos poucos até perto das virilhas. Passou-o repetidamente em volta, pela frente, por trás, até que o pressionou demoradamente sobre o sexo e sentiu então o mesmo prazer indescritível que as estrelas de cinema experimentavam.
A Sandra, ainda meio submersa na banheira da sua casa de banho, tinha cumprido o seu sonho.
Não era em vão que nove em cada dez estrelas de cinema usavam o sabonete Lux.

Rui Felício
Blog «Encontro de Gerações do Bairro Norton de Matos»