18 dezembro 2015

«coisas que fascinam (181)» - bagaço amarelo

Aguarela

Às vezes dou por mim cinzento, que é mais ou menos o mesmo que dizer triste. Tenho andado assim e, não acreditando em coincidências, estes dias de Verão parecem concordar comigo no tom com que se vestem.
Tenho um truque muito simples para este dias. Lembro-me constantemente de como a tristeza tem a mania de se alternar com a felicidade, o que me permite pintá-los parcialmente com uma outra cor qualquer. Apesar do cinzentismo, o meu fim de tarde foi uma espécie de aguarela em que um ténue brilho verde desafiou os tons mais escuros.
Reparo então naquilo que o enorme tamanho do Amor costuma fazer parecer mais pequeno. Um abraço, por exemplo, e dou-me conta de que sei porque é que o mundo ainda não acabou. As pessoas abraçam-se mesmo em dias cinzentos.
Um abraço é sempre mágico. Nem que seja apenas por um momento, consegue transformar o maior do crentes monoteístas num existencialista convicto. Naquele momento, é a existência que interessa e se celebra, a enorme e improvável sorte de, na imensidão espacial e temporal do Cosmos, podermos ter um momento em que somos genuinamente abraçados.
Apercebemo-nos de que a vida nos faz falta, de que os amigos e amigas nos fazem falta, de que um copo de vinho branco nos faz falta, de que, enfim, a vida toda nos faz falta, incluindo aquela que é cinzenta, porque nos faz falta o toque dos outros.
Eu, ateu e agnóstico convicto, sou crente na aguarela de um abraço, do toque duma mão, do Amor físico e do beijo. E porque hoje um abraço me salvou, queria dedicar estas linhas a uma amiga que me salva sempre que eu sei que ela existe.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»