Abriu a porta do frigorífico e procurou uma cerveja.
Não estava na porta, como de costume, pois aí estavam duas garrafas de vinho verde.
Talvez ela as tivesse posto noutro sítio para poder guardar o vinho.
Deu algumas voltas por entre as iguarias, e foi então que encontrou o envelope por detrás das verduras, dentro de um saco de plástico.
Achou estranho e uma curiosidade intrincante fê-lo retirar o achado e abrir o conteúdo.
Com cuidado limpou o plástico da humidade e retirou a carta de dentro.
O que ele leu fê-lo agarrar-se á porta do frigorífico e empalidecer:
"Meu amor, não vejo a hora de me juntar a ti para sempre.
Esta noite põe o nosso plano em acção.
Não te esqueças de que o vinho verde da garrafa com a marca no rótulo foi a
que eu preparei com o veneno. Abre as duas garrafas, põe a boa dentro do frigorífico, assim como os camarões. Ele deverá beber antes de ti. Tu deverás fazer uma cara esquisita e dizer que o vinho tem bocadinhos de cortiça da rolha. Enquanto ele bebe, tu irás deitar o vinho fora. Depois irás buscar os camarões. Sem que ele note, enche o teu copo da outra garrafa que estará dentro do frigorífico e bebe um golo.
Deverão sentar-se à mesa e fazer o jantar romântico. O efeito é rápido e em 3 minutos ele sucumbirá de paragem respiratória. Assim que estiver tudo completo, telefona-me. Não tenhas medo. Tudo irá correr como planeamos.
Amo-te.
António"
Arrumou tudo como estava e esperou que ela chegasse.
Beijaram-se. Ela disse que tinha preparado um jantar romântico e ele sorriu para ela com cara de satisfação. Sentou-se à mesa e ela serviu-lhe o copo. Depois encheu o dela e fizeram um brinde ao amor. Ele bebeu-o quase de enfiada, deixando apenas um dedo no fundo.
- Está bom, bem fresquinho - disse.
Ela, entretanto pôs o copo à boca mas depois recuou :
- Amor, tem bocadinhos de cortiça.
Foi ao lava-loiças e deitou-o fora. Depois, calmamente, passou o copo por água e, sem que ele notasse, abriu o frigorífico e encheu o copo da outra garrafa que estava aberta lá dentro, como tinha planeado. Tirou os camarões que estavam a refrescar e serviu-os na travessa que pôs no centro da mesa.
Sentando-se bebeu meio copo e fez uma cara de satisfação olhando para ele.
Ele estava divertido. Comeu dois ou três camarões, serviu-se de mais um pouco do vinho e ofereceu-se para encher o copo à esposa. Arrepiou-se quando ele fez o líquido borbulhar no seu cálice.
Ela sentia como o tempo parecia ter congelado. Eram só três minutos...
E que suores que sentia, e que aflição...
Custava a respirar.
- Amor,- disse ele - quem é o António?
Ela não deu resposta. Olhava para ele com um olhar vidrado e os lábios azulados.
- Quando estiveres com ele, diz-lhe que pelo que vi leva mais de três minutos a fazer o efeito prometido.
E dizendo isto preparou o carregador da pistola. Tirou o telemóvel à esposa em agonia, procurou na agenda e marcou um SMS para o endereço "ANT.":
- Não posso falar, missão cumprida, manda sms. Vem ter a casa, estou à espera. Amo-te - e carregou na tecla enviar.
Esperou pela resposta. Com satisfação viu a confirmação na volta em resposta.
Aproximou-se dela, que lhe esticava as mãos em pedido de auxilio e disse-lhe com um sorriso sarcástico enquanto descascava mais um camarão:
- Sim, troquei os rótulos das garrafas, mas em breve irás conseguir o que tinham planeado. Irão estar juntos para sempre...
Charlie