
"Teresinha chorava o ouvido colado
À parede do quarto que era tão fina,
Sofria horrores com os ais e os gemidos,
Lamentava-se ao ritmo do amor rangido
Que faziam o cunhado, e a irmã, a Tina.
O amor entre os cunhados começou e explodiu
Na manhãzinha duma quinta-feira,
Teresinha julgando-se sozinha
Esperava na cozinha só de cuequinhas,
O café ficar pronto na cafeteira.
Toni que por ela se tinha embeiçado,
E lhe mirava os jeitos e os seios de lado
Quando julgava que ninguém o via,
Agarrou-a e beijou-a, apaixonado:
- Teresinha, de hoje não passa. Vais ser minha!
Teresinha que há muito o amava
E todos rejeitara por causa daquela paixão,
Tirou a minúscula peça que tinha vestida
Perdeu a virgindade, deu a queca sonhada,
Consumou o amor, cometeu a traição.
Teresinha e Toni fugiam sempre que podiam,
Encontravam-se no bote que este possuía
E escondidos na noite onde ninguém os via
Deitados nas redes com cheiro a peixe
Trocavam promessas, faziam amor.
Mas Tina da traição começou a desconfiar
Quando em Teresinha começou a detectar
O mesmo odor piscícola que tinha Toni,
E Toni há muito na cama não a procurava
Era com a irmã que o sacana se enrolava!
Foi numa noite de temporal que o drama se desenrolou,
Tina confrontou Toni e Toni, nada negou,
Tina chorou, pediu e rogou: Toni e os nossos filhos?
E empurrando Teresinha, tia, irmã e traidora
Aos gritos expulsou-a de casa, na mesma hora.
Pela porta voaram panelas, pratos e tachos
Teresinha fugiu escadas abaixo,
Toni, não resistiu, correu atrás dela,
Deixando as crianças pequenas chorando à janela
E a mulher rogando pragas e jurando morte e vingança.
Tina perseguiu-os de caçadeira na mão
E querendo ver mortes, desfecho e confusão
Toda a vizinhança correu atrás dela,
E eram tantos os mirones que parecia manifestação
Liderada por Tina, em fúria, de caçadeira na mão.
Esta jurava aos vizinhos indignados
Que nenhum dos amantes à morte escaparia,
A Teresinha torcer-lhe-ia lentamente o pescoço
E a Toni, além de o matar, os tomates caparia.
Entalados entre o mar e a multidão
Toni remou para o centro do temporal,
Tentando escapar a um destino pior,
Tentando salvar-se e ao seu amor,
De serem linchados na doca do Clube Naval.
Mas o mar estava bravo e as ondas gigantes
A cada remada submergiam os amantes
Que sentados, abraçados, esperavam a onda mortal,
Morreram jurando amor num beijo final,
Toni marido de Tina, e Teresinha irmã e rival.
No dia seguinte um pescador que puxava as redes
Olhou pasmado, intrigado, a estranha pescaria,
Sete tainhas cheirando a gasóleo e umas cinco percas,
O Toni de traje de gala feito de algas,
E a Teresinha, com um vestido de noiva, feito de alforrecas.
Ainda hoje se diz que em noite de lua cheia
Se vêem os dois amantes abraçados a passear
Vestidos de noivos os trajes feitos de mar,
Seguidos de um cortejo de golfinhos especial
Que os segue entoando a marcha nupcial."
Encandescente
Blog Erotismo na Cidade
Três livros de poesia publicados («Encandescente», «Erotismo na Cidade» e «Palavras Mutantes») pelas edições Polvo (para já...).
O primeiro «fado corrido e falado» foi «a morte de João do Viso», que tive o prazer de ler para a maltinha no Sãorau do 6º Encontra-a-Funda. O segundo foi «Ivone campeã dos defuntos. A Serial killer das Fontainhas».















