Toda a vida fui pastor
Toda a vida guardei gado
Tenho uma cova no peito
Ai... ai...
De encostar-me ao cajado(Popular Alentejano)...Vai provar o melhor borrego à pastora de toda a sua vida...
Hei cabraganem.
Tá tudo porreiro por aí?
Pois aqui o tempo anda de trombas voltadas, ora faz um frio dum cabrão logo seguido de sol, ora quando não vai, lá vem uma leva de chuva.
Não que ela nã faça falta. Nã senhor! Só que o cabrão do frio é que podia ficar fora à parte. Assim a meio de Abril, e de Páscoa a correr, só apetece é comer o borrego ao ar livre, e, como o tempo anda não dá jeito, néi?
Vossamecezes repararam na moda Alentejana com que abri esta parte que lhes vou contar. Por acaso tava a fazer este posti, e mal acabi a quadra deu-me uma pele de rir que quase me engasgava, eehehehehehee... Aghhhh... Zeca... filho dum cabrão, que tens boas...! Heheheheeee...
Alembrei-me logo do Nelo, mó disso das covas. Ele que nã quer nada com covas, se tivesse uma no peito, tal nã havera de ser a desgraça... ehehehehe. O gajo a nã querer nada com covas e ter de gramar uma mesmo ali à mão a toda a hora e a um palmo dos queixos eheheeeeheheee. Ora que porra... heheheheheeee... tá boa, nã tá?!
Bom, já me ia desmanchando a rir outra vez mas nã foi para falar de paneleiros que vim hoje aqui dar de vaia.
Venho falar dum prato que a gente faz que é o borrego à pastora. Atão nã querem lá ver que arrecebi em casa na caixa do correio um convite para uma semana de provas sobre a comida feita com borrego?
Bom, se há uma porra que eu nã gramo é essa paneleirice de andarem a fazer concursos e não perceberem nada de como se fazem as coisas na forma original. Nã-nã...
Devem vossamecezes calcular que um gajo como eu, que passa semanas no campo a guardar gado, deve ser quem melhor conhece os segredos dos bocados de bicho ao lume em panela de barro.
De modos que eu, José Carlos Trambolica, conhecido por Zecatramelica e para os amigos pelo Vintesete, enfiei-me no fato, peguei na minha fragoneta e ala que lá fui a caminho até à cidade, à Exposição onde era essa baiana.
Mal chegui ao restaurante de convite na mão, quem é que havera de estar à porta?
Uma coisa dum homem ficar de água na boca. É que a gaja era linda, porra! Mas mesmo linda! Tava a receber as pessoas e a encaminhá-las para as provas.
Vá de conversa, práqui e práli, e toca de provar o borrego à pastora.
Bom! Foi logo à primeira! Trazia batatas e mais umas porras que eu cá nunca pus junto ao borrego.
Aghhhhh! Mas um gajo como eu, que sou fino como o azeite, pegui logo no assunto com outras manitas. Eu nã me perco... agora cá! Era o que faltava! E como fiqui logo fisgado na magana e como ela dava paleio, fui-me logo a ela. Nã fosse eu o tal do vintesete na vinagreira!
Logo, logo ela nã ficou muito sastefeita por eu dizer que nã tinha gostado e que nã era assim que se fazia o borrego. Conversa puxa conversa e tal e acabou por dizer-me que nã era dali, que tava em trabalho temporário a fazer apresentações e essas coisas. De modos que mal a vi assim murchita arrebitei-a numa tirada: - Escute, o melhor para saber dos segredos deste preparo, é vir daí mais eu, que dou-lhe a provar o melhor borrego que já alguma vez experimentou.-
A bicha riu-se, fez um jeito de nã querer e que ficava para depois, mas comigo nã há magana que me escape quando lhe fisgo de apetites, de modos que com mais umas letras e umas larachas a preceito, a coisa bem trabalhada, assim que se viu livre, acabou por ir ter comigo ao Monte do Cardo.
E aí é que foi, moços. Tava já o borrego na panela a encher tudo de cheirinho e o pão cortado fininho para migar no caldinho na hora certa, quando lhe pus umas lascas na fervura que a fizeram abrir muito os olhos.
- O que é isso, Zeca?-
- Este é um dos meus segredos... Silarcas!- disse-lhe numa piscadela de olhos depois de esperar um pouco para ver-le bem os olhos de espanto.
- Silarcas?! O que é isso de silarcas? – perguntou ela por entre as dentadas que ia dando numa borda de pão com queijinhito de cabra acompanhado do branquinho a preceito.
***Foi só já no quarto interior que ela descobriu que os gostos que irrompem das profundezas da terra têm esse sabor único e incomparável por mais que ao enlatá-los, depois de criados em aviários, os promovam a figuras de cidade e de nomes estranhos como champignons...
José Carlos Trambolica
(Zecatramelica o Vintesete)