17 abril 2010
16 abril 2010
Adelaide(s): conto dos actos
Existo aqui. Sem gritos. Sem mim. Vejo televisão. A rapariga de longos caracóis percorre a sequência de cenas que a leva a um acto irreversível. Não! Impeçam-na, impeçam-na, impeçam-na... Impeçam-me...
Aqui
Sei de ti aqui
porque te sinto
e me beijas;
abraças e me deixas
o teu cheiro
nos lençóis.
Deixas-me a nuvem
do teu orgasmo
no silêncio sem silêncio,
no grito e no espasmo;
deixas-me
a luz do momento
numa palavra
enlouquecida
entre o vento e a calmaria.
O estupor
e a felicidade,
que o sonho não me deixe
nem se desfaça
e a nuvem permaneça
em mim.
Foto e poesia de Paula Raposo
Faz-me um bico
O pedido expresso no título desta posta tanto podia provir de um pássaro como de um lápis. Mas como os pássaros não falam e os lápis nem piam, alguém tratou de verbalizar essa necessidade que, se nas aves implica uma complicada cirurgia plástica veterinária nos lápis apenas requer o uso de um pequeno objecto cuja utilização, só por si, já implica um sentido figurado que por associação de ideias pode muito bem ter dado origem à conotação brejeira de uma frase aparentemente tão desprovida de malícia.
Há quem chame ao objecto em causa um afia e quem prefira, antes pelo contrário, designá-lo por afiadeira. Esta opção pelo feminino, não sendo a que utilizo no meu dia-a-dia, parece aplicar-se que nem uma luva ao tal sentido figurado que a introdução do lápis no orifício que o irá afiar possa suscitar nas mentes mais brincalhonas. Como a minha, de resto, onde um mais um são dois e de preferência a fazerem coisas porreiras em equipa.
Contudo, e por muito que a técnica da rosca seja um must na manipulação, por exemplo, do dito lápis, continua complicada a explicação para a carga terrível que uma expressão como a do título da posta carrega sempre que alguém a profere.
Não, não é fácil uma pessoa virar-se para a colega do escritório e servir de porta-voz para um lápis em aflição...
Tudo isto porque o português enquanto língua muito traiçoeira presta-se a apropriações indevidas, a deturpações do sentido de frases tão simples como a que serve de mote para este exercício boçal (sim, o cê está devidamente cedilhado...) que vos proponho nesta ocasião.
Não sendo uma grande questão da humanidade em geral ou mesmo da porção que fala português (no Brasil, por exemplo, fazer um bico jamais quererá dizer outra coisa que não aguçar uma ponta e se pedirmos tal coisa a uma alemã a tradução literal fará de imediato com que ela deite a mão ao estojo), faz parte dos pequenos dramas do quotidiano oral deste nosso espaço lusitano onde apreciamos tanto o chuto para canto implícito nestas fintas a que recorremos para não chamar os bois pelos nomes.
Mas, e só para concluir esta posta com uma moral da história qualquer, por mais retorcidas que sejam as mentes que deturpam as expressões para lhes alterar o propósito, as palavras têm um significado e um bico será sempre uma coisa que pica e um broche, por exemplo, será sempre e acima de tudo um alfinete de peito.
Há quem chame ao objecto em causa um afia e quem prefira, antes pelo contrário, designá-lo por afiadeira. Esta opção pelo feminino, não sendo a que utilizo no meu dia-a-dia, parece aplicar-se que nem uma luva ao tal sentido figurado que a introdução do lápis no orifício que o irá afiar possa suscitar nas mentes mais brincalhonas. Como a minha, de resto, onde um mais um são dois e de preferência a fazerem coisas porreiras em equipa.
Contudo, e por muito que a técnica da rosca seja um must na manipulação, por exemplo, do dito lápis, continua complicada a explicação para a carga terrível que uma expressão como a do título da posta carrega sempre que alguém a profere.
Não, não é fácil uma pessoa virar-se para a colega do escritório e servir de porta-voz para um lápis em aflição...
Tudo isto porque o português enquanto língua muito traiçoeira presta-se a apropriações indevidas, a deturpações do sentido de frases tão simples como a que serve de mote para este exercício boçal (sim, o cê está devidamente cedilhado...) que vos proponho nesta ocasião.
Não sendo uma grande questão da humanidade em geral ou mesmo da porção que fala português (no Brasil, por exemplo, fazer um bico jamais quererá dizer outra coisa que não aguçar uma ponta e se pedirmos tal coisa a uma alemã a tradução literal fará de imediato com que ela deite a mão ao estojo), faz parte dos pequenos dramas do quotidiano oral deste nosso espaço lusitano onde apreciamos tanto o chuto para canto implícito nestas fintas a que recorremos para não chamar os bois pelos nomes.
Mas, e só para concluir esta posta com uma moral da história qualquer, por mais retorcidas que sejam as mentes que deturpam as expressões para lhes alterar o propósito, as palavras têm um significado e um bico será sempre uma coisa que pica e um broche, por exemplo, será sempre e acima de tudo um alfinete de peito.
15 abril 2010
Postalinho de Madrid enviado pelo Bruno
"Olá São,
Publicidade para ti, acabadinha de chegar de Madrid.
bjs
Bruno"
Publicidade para ti, acabadinha de chegar de Madrid.
bjs
Bruno"
Não faz mal...
Não faz mal porque a lua que pertence ao céu
também dorme nas águas de um lago
que lhe adormece o reflexo de um só trago
onde toda uma noite adormeceu.
Não faz mal porque a lua que pertence ao céu
também sabe dormir em qualquer estrada
tão negra e só; quando se sente espelhada
oferece-se com o reflexo que ali adormeceu.
Por isso, não faz mal se esse sonho que aconteceu
implora peito e nos fez sair das nossas casas
exige corpo e nos sacudiu das nossas camas
porque até a lua - vê! - quer dormir fora do céu.
Por isso, não faz mal se essa paixão nos rendeu
se nos fez perdermo-nos das nossas vidas
se nos fez perder paredes seguras e conhecidas;
até a lua, na estrada, no lago, se perdeu do céu.
também dorme nas águas de um lago
que lhe adormece o reflexo de um só trago
onde toda uma noite adormeceu.
Não faz mal porque a lua que pertence ao céu
também sabe dormir em qualquer estrada
tão negra e só; quando se sente espelhada
oferece-se com o reflexo que ali adormeceu.
Por isso, não faz mal se esse sonho que aconteceu
implora peito e nos fez sair das nossas casas
exige corpo e nos sacudiu das nossas camas
porque até a lua - vê! - quer dormir fora do céu.
Por isso, não faz mal se essa paixão nos rendeu
se nos fez perdermo-nos das nossas vidas
se nos fez perder paredes seguras e conhecidas;
até a lua, na estrada, no lago, se perdeu do céu.
Faz-me um bico a martelo
O Katano, sempre atento, perguntou-me: "Esta é das tuas...?"
É das minhas... mas copiada sem autorização minha e feita a martelo.
É um sentimento contraditório, ver algo feito por nós ser copiado. O d!o, holandês criador dos John & John, dizia-me isto: "copiarem algo meu é sinal que gostaram".
Enfim... se alguém quiser uma t-shirt «Faz-me um bico» original, com um lápis verdadeiro preso à t-shirt com um fio e um alfinete de ama, ainda tenho algumas que podem ser encomendadas aqui.
É das minhas... mas copiada sem autorização minha e feita a martelo.
É um sentimento contraditório, ver algo feito por nós ser copiado. O d!o, holandês criador dos John & John, dizia-me isto: "copiarem algo meu é sinal que gostaram".
Enfim... se alguém quiser uma t-shirt «Faz-me um bico» original, com um lápis verdadeiro preso à t-shirt com um fio e um alfinete de ama, ainda tenho algumas que podem ser encomendadas aqui.
14 abril 2010
Tenho estado a pensar
Se a igreja católica vê a pedofilia como um assunto a ser tratado em família, então ainda é mais grave: é incesto!
Alta fodificação
A generalidade das emissões de televisão que nos entram olhos dentro são ainda de definição comum, o que em Portugal equivale a dizer que as imagens têm 576 linhas horizontais interlaçadas, ao ritmo de 25 imagens por segundo, o que serve para enganar o nosso cérebro fazendo-o pensar estar a ver algo com movimento. Naturalmente, 576 linhas horizontais interlaçadas, com o desenvolvimento da tecnologia são coisa pouca, deixam muita coisa de fora, que não se consegue ver. E aquilo que há para ver, como já antes escrevi, precisa de mais espaço.
O mercado está, agora, inundado por televisores LCD (ou Plasma) que permitem ver televisão com a qualidade a que os nossos olhos já estavam habituados nos monitores de computador. Convém lembrar que mesmo resoluções de computador modestas, como a clássica 1024x768, têm mais qualidade do que aquilo que a televisão nos exibe em formato standard. Na alta definição passámos, então, a encontrar coisas como 720p, 1080i e 1080p. Estes números referem-se ao número de linhas horizontais, o que nas tecnologias mais actuais é, para todos os efeitos, equivalente a dizer o número de linhas de pixeis horizontais, sendo o 720p correspondente a uma resolução de 1280x720 (0,9Mpixel, em aspecto 16:9), e o 1080i/p equivalente a resoluções 1920x1080 (2,1Mpixel, em aspecto 16:10). Embora não seja esse o propósito deste texto (aliás, o propósito só mais abaixo), uma palavra sobre o "i" e o "p": a letra "i" designa um modo de video interlaçado, e é uma herança das televisões antigas, CRT, e tinha como objectivo transmitir melhor qualidade sem consumo adicional de largura de banda. Para esse propósito, uma imagem de 25 frames por segundo era, na verdade, composta por 50 quadros desfasados, de tal modo que o primeiro conjunto de quadros desenhava linhas impares e o segundo, as linhas pares, completando a imagem. Já o "p" denota um modo de video progressivo, em que a imagem é desenhada progressivamente numa única passagem.
Quando passeamos em superfícies comerciais, onde se vendem televisões, é agora rotineiro ver imagens de jardins floridos ou objectos em movimento, e, claro, mulheres bonitas. O objectivo desses videos promocionais é mostrar ao potencial comprador aquilo que se consegue fazer com televisões de alta definição. Um aviso ao mais distraído: não basta a televisão ser de alta definição. É, obviamente, necessário que o conteúdo também tenha qualidade. Arrisco dizer que, em determinadas circunstâncias, uma mesma imagem em definição standard (as tais de 576 linhas, também usadas nos DVD) pode até ter pior aspecto numa televisão de alta definição do que numa mais antiga, porque as televisões 720/1080 tenderão a mostrar mais os defeitos, precisamente por terem maior detalhe. Filtros da própria televisão podem amenizar esses efeitos.
Uma pessoa pode ficar satisfeita por ver futebol com alta definição, pode ficar feliz por conseguir ver melhor todos os grãos de pólen das flores nos jardins, mas aquilo que se deseja, mesmo, é gajas. A tecnologia serve para ver gajas. E ontem tive a oportunidade de ver, pela primeira vez, uma cena de pornografia em esplendoroso 1920x1080p. Não, tem, comparação, com, nada. Digo-vos. Todos os sinais apelativos estão lá, mas também lá estão as estrias, a celulite, as imperfeições. Mas, then again, também lá estão os lábios luzidios (os de cima), e húmidos com detalhe (os outros). E pronto, o propósito deste texto é esse, o de vos dizer que ver pornografia em alta definição (tão alta quanto é possível no momento) é muito, muito à frente. Escolhi uma imagem ilustrativa. Terão de a clicar para ver em todo o tamanho e peço desculpa pela pixelização que fiz em pontos estratégicos, mas é por causa das crianças. ;-) Digamos que a menina deixou cair parte do gelado que estava a comer e... tal. E esta imagem não é uma fotografia, que essas já estamos habituados a ver com muitos megapixeis. Isto é uma frame do filme. E todo ele tem esta nitidez. Isto paga-se, claro. São quase 8GB de ficheiro. Ah pois.
O mercado está, agora, inundado por televisores LCD (ou Plasma) que permitem ver televisão com a qualidade a que os nossos olhos já estavam habituados nos monitores de computador. Convém lembrar que mesmo resoluções de computador modestas, como a clássica 1024x768, têm mais qualidade do que aquilo que a televisão nos exibe em formato standard. Na alta definição passámos, então, a encontrar coisas como 720p, 1080i e 1080p. Estes números referem-se ao número de linhas horizontais, o que nas tecnologias mais actuais é, para todos os efeitos, equivalente a dizer o número de linhas de pixeis horizontais, sendo o 720p correspondente a uma resolução de 1280x720 (0,9Mpixel, em aspecto 16:9), e o 1080i/p equivalente a resoluções 1920x1080 (2,1Mpixel, em aspecto 16:10). Embora não seja esse o propósito deste texto (aliás, o propósito só mais abaixo), uma palavra sobre o "i" e o "p": a letra "i" designa um modo de video interlaçado, e é uma herança das televisões antigas, CRT, e tinha como objectivo transmitir melhor qualidade sem consumo adicional de largura de banda. Para esse propósito, uma imagem de 25 frames por segundo era, na verdade, composta por 50 quadros desfasados, de tal modo que o primeiro conjunto de quadros desenhava linhas impares e o segundo, as linhas pares, completando a imagem. Já o "p" denota um modo de video progressivo, em que a imagem é desenhada progressivamente numa única passagem.
Quando passeamos em superfícies comerciais, onde se vendem televisões, é agora rotineiro ver imagens de jardins floridos ou objectos em movimento, e, claro, mulheres bonitas. O objectivo desses videos promocionais é mostrar ao potencial comprador aquilo que se consegue fazer com televisões de alta definição. Um aviso ao mais distraído: não basta a televisão ser de alta definição. É, obviamente, necessário que o conteúdo também tenha qualidade. Arrisco dizer que, em determinadas circunstâncias, uma mesma imagem em definição standard (as tais de 576 linhas, também usadas nos DVD) pode até ter pior aspecto numa televisão de alta definição do que numa mais antiga, porque as televisões 720/1080 tenderão a mostrar mais os defeitos, precisamente por terem maior detalhe. Filtros da própria televisão podem amenizar esses efeitos.
Uma pessoa pode ficar satisfeita por ver futebol com alta definição, pode ficar feliz por conseguir ver melhor todos os grãos de pólen das flores nos jardins, mas aquilo que se deseja, mesmo, é gajas. A tecnologia serve para ver gajas. E ontem tive a oportunidade de ver, pela primeira vez, uma cena de pornografia em esplendoroso 1920x1080p. Não, tem, comparação, com, nada. Digo-vos. Todos os sinais apelativos estão lá, mas também lá estão as estrias, a celulite, as imperfeições. Mas, then again, também lá estão os lábios luzidios (os de cima), e húmidos com detalhe (os outros). E pronto, o propósito deste texto é esse, o de vos dizer que ver pornografia em alta definição (tão alta quanto é possível no momento) é muito, muito à frente. Escolhi uma imagem ilustrativa. Terão de a clicar para ver em todo o tamanho e peço desculpa pela pixelização que fiz em pontos estratégicos, mas é por causa das crianças. ;-) Digamos que a menina deixou cair parte do gelado que estava a comer e... tal. E esta imagem não é uma fotografia, que essas já estamos habituados a ver com muitos megapixeis. Isto é uma frame do filme. E todo ele tem esta nitidez. Isto paga-se, claro. São quase 8GB de ficheiro. Ah pois.
Depois
Guardo um bocadinho para depois
parto-o do teu sono de corpo macio
divido-te os sonhos em dois
dou-te metade do meu silêncio.
Guardo um bocadinho para depois
para não sentir a tua ausência
sente-a a gaveta da minha fantasia
na página rasgada de um livro de heróis.
Guardo um bocadinho para depois
bocadinhos mansos de estrelas ao sol
dormem e esperam no meu céu de lençol
de peito a sonhar-se despido por girassóis.
E agora, que já não sabemos ser dois
o que guardo eu para depois?
Mostro-te o peito já queimado do sol
dos teus dedos nus nas minhas fantasias
magoado pelo frio do lençol
em lugar do teu corpo, nas tuas ausências.
Guardei um bocadinho de ti para depois
já gasto no ventre cheio de tanto silêncio
as pernas envolvem um convés já vazio
já nem naufrago resta para guardar depois,
na onda das ancas um toque de olhar macio
um colo que se alaga e te guarda para depois.
parto-o do teu sono de corpo macio
divido-te os sonhos em dois
dou-te metade do meu silêncio.
Guardo um bocadinho para depois
para não sentir a tua ausência
sente-a a gaveta da minha fantasia
na página rasgada de um livro de heróis.
Guardo um bocadinho para depois
bocadinhos mansos de estrelas ao sol
dormem e esperam no meu céu de lençol
de peito a sonhar-se despido por girassóis.
E agora, que já não sabemos ser dois
o que guardo eu para depois?
Mostro-te o peito já queimado do sol
dos teus dedos nus nas minhas fantasias
magoado pelo frio do lençol
em lugar do teu corpo, nas tuas ausências.
Guardei um bocadinho de ti para depois
já gasto no ventre cheio de tanto silêncio
as pernas envolvem um convés já vazio
já nem naufrago resta para guardar depois,
na onda das ancas um toque de olhar macio
um colo que se alaga e te guarda para depois.
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