21 janeiro 2011

Eleições: os quadrados e as cruzes...


Webcedário no Facebook

A posta que chovem carapuças (carapiças?)


Uma das cenas mais giras de acompanhar em blogues são as trocas de piropos entre casais desavindos. Neste domínio encontramos alguns exercícios brilhantes de escárnio e maldizer, acrescidos em dificuldade pela absoluta necessidade de dizer tudo o que é preciso para quem conheça consiga identificar o/a outro/a (sobretudo o/a próprio/a) sem contudo a coisa ficar escarrapachada em demasia para não tombar pela base a pala de absoluta e recíproca indiferença que tanto se esforçam por construir.
São intensas, mais até do que muitas ainda a decorrer, estas ex-relações amorosas trasladadas na sua qualidade de mortas-vivas para a plataforma blogueira. Transpiram emoção, ainda que alegadamente negativa, e constituem obsessões tão óbvias que cedo ou tarde acabam por se verem traídas naquilo que de mais importante existe para os/as autores/as: a camuflagem do seu verdadeiro sentir. E por vezes essa mascarada de carnaval pobrezinho até inclui sólidas referências à sinceridade e ao cariz genuíno de quem tantas vezes repete a ideia do ódio de estimação que quase acredita nesse estatuto por parte do alvo a abater.
A malta desunha-se a escrever quando não aguenta mais o faz de conta e por impulso (mais ou menos controlado) avança para o teclado com a loucura estampada no olhar.
Depois publicam-se as postas, ainda a ferver, e nem se aguardam uns minutos até ser possível matutar a sério acerca das palavras disparadas para a página branca no monitor. O desprezo desejado a tentar esconder por detrás o amor que custa sempre muito a morrer, as palavras com vontade de fazer doer porque a saudade abre a ferida e as memórias provocam imensa comichão e depois surge em cena a vontade da vingança que resulta sempre porque se sabe que o/a outro/a nunca perde pitada.
E a cena fica ainda mais marada quando se equiparam no calibre os oponentes, tanto na intensidade dos sentimentos como na capacidade de os reflectir num texto tão curto e contundente quanto seja possível obter.
Numa altura em que já ninguém pode esconder a sangria da blogosfera para a rede social da moda, onde toda a gente acha que tem que se estar, é sempre uma alegria encontrar estes prodígios da escrita rebuscada que se vê utilizada como artilharia, num bombardeio constante que para quem veja de fora é claro enquanto inconsequente e nunca existe um vencedor.
E ainda se torna mais fascinante quando identificamos os protagonistas dessas conturbadas mas intermináveis histórias de amor.

Presente no passado

Continuo, só por nada, por nadas, a espreitar
talvez passe um dia, até dois, ou mesmo três
mas ainda não, ainda não, não será de vez
este dia de hoje em que perdeste o meu olhar.
Talvez já nem me sintas, como antes, observar;
como antes, ainda sentes o que não me vês?
Já aqui não mora o sim, ou sequer o talvez;
espreito a tua janela, apenas, já não quero entrar.
É olhar apenas, como se estivesse a recordar
no presente, a memória esconde-se na timidez
de um olhar fora de tempo, esta triste nitidez
desenha os porquês que a memória quer apagar;
ou talvez um dia alguém te consiga explicar
que te quer ver bem pelo bem que não te fez.

Take away


E ainda se tem de pagar.


Tudo tem a sua época própria


Solstício


2 páginas (clicar em "next page")

oglaf.com

20 janeiro 2011

O testemunho

– E a senhora ouviu alguma vez o senhor A. dirigir alguma palavra incorrecta ou ter alguma atitude deselegante com a mulher, a senhora B.?
– Nunca!... Ele era um marido que aceitava tudo, era um paz de alma. O senhor A. era um burrinho à chuva.
– Um burrinho à chuva?!
– Sim, um burrinho à chuva. Até lhe vou contar um episódio, só para a senhora doutora ver como ele era com a mulher: eu uma vez fui lá a casa e ele estava a arear os bicos do fogão… Veja bem, a arear os bicos do fogão. Ela na sala a ver a novela e ele cheio de brios e cuidados de volta dos bicos. E eu disse-lhe, doutora, eu disse: Ó Cilinha (eu tratava-a por Cilinha… Por Cilinha, doutora, veja bem como eu gostava dela, nem lhe chamava Raimunda nem nada)…
– Não estou a perceber, a senhora não se chama Raimunda?
– Eu?! Eu não, Deus me livre!
– Eu sei que a senhora não se chama Raimunda…
– Graças a Deus e aos meus paizinhos.
– Seja. Voltemos aos factos.
– O facto é que ela não gostava, doutora, não gostava nada. Chamar-lhe Raimunda era pior que cuspir-lhe.
– Pronto, já percebemos. Essa parte do nome está esclarecida, D. Engrácia Genoveva. A senhora estava a dizer que lhe tinha dito…
– Sim, eu disse-lhe: “Ó Cilinha, quem me dera a mim ter um homem que me tratasse dos bicos como o teu… Que regalo. Olha para aquelas mãos tão cuidadosas de volta dos bicos, mulher, a rodeá-los com tanto cuidado, a esfregá-los com tanto carinho. Quem me dera que alguém me esfregasse os bicos assim…”
– E ela?
– Ela?! Ela virou-se para mim e disse-me: “E nunca o viste tu de joelhos a passar-me o corredor a pano”.
– Diga?
– Digo, doutora, digo… mas nisso ele não era tão bom.
– Desculpe?
– É verdade, eu até acho que ele tinha uma fixação por bicos, está a ver?… Para o resto não lhe puxava tanto.
– Ainda está a falar do fogão?
– Do fogão?! Ah, sim, sim, do fogão. Pois, dos bicos do fogão, ele estava a areá-los.

Pesquisa de imagens Google está ainda mais interactiva

Edito Estrelas

O Crescente Fértil não é o pénis de um pai de uma família numerosa.

«Corporate Occult» - Huoratron


"CORPORATE OCCULT" Huoratron Music Video from Cédric BLAISBOIS on Vimeo.

Valha-nos a batina



HenriCartoon

19 janeiro 2011

Do amor, segundo os meus alunos e não só

Um dos temas que os meus alunos de Pensamento Crítico em avaliação contínua mais escolhem, no âmbito dos textos argumentativos que têm de escrever, é o amor dito romântico. Sobretudo os de primeira matrícula e, dentro destes, aqueles que, porque são alunos de Direito na Universidade Católica do Porto, têm todas as certezas e repudiam quaisquer dúvidas (o que lhes vai passando, com a idade e a experiência), dissertam assertivamente sobre o que era o amor "antigamente" (mas há um "antigamente", para miúdos de dezoito anos, no que toca ao amor, ou somente um saber-por-ouvir-dizer, acrítico e heterónomo?) e o "desastre" em que se tornou hoje.
E porque as pessoas abandonam casamentos sem pensar, e que no tempo dos avós é que era em grande, porque os matrimónios eram para a vida toda (as/os amantes também, mas isso não ouviram eles dizer) e as pessoas eram felizes como tudo e não havia primos homossexuais (pois não, os que o eram tinham mulher/marido e filhos e amantes como os hetero-) e (já agora) o Natal era uma maravilha porque havia espírito familiar e consumismo zero e patati-patatá e trecolareco.
Quando leio estas atrocidades, apetecia-me fechá-los comigo numa sala e perguntar-lhes quem lhes mentiu tanto. E dizer-lhes que, se calhar, os avós e pais e tios que lhes contam estas patacoadas sonharam toda a vida em viver num país onde o divórcio fosse permitido ou numa cidade grande, onde não fosse uma vergonha trocar o marido ou a mulher por um/uma namorado/a. E que não tem mal algum pensar em amores em vez de no Amor, porque este tem várias caras e vários tempos e não dura para sempre. E (já agora), lembrar-lhe que hoje cada um vive o Natal como quer e que o espírito familiar não é inversamente proporcional ao consumismo, e que se na casa deles só sentem este último e nem réstea daquele, se calhar é melhor aproveitarem a consoada e terem uma conversa comprida, daquelas que as famílias à séria devem ter sempre que há uma chatice, com ou sem consumismo.
E, já que estava com a mão na massa, juntaria aos meus alunos um certo amigo, que acha que ficar com alguém de quem deixou de se gostar é altruismo: não se sente bem com a situação, mas tudo é melhor do que dar ao outro o desgosto de ficar sem a sua insuperável presença (porque isso seria, lá está, egoísmo, o que provavelmente constitui pecado mortal).
Fecharia a porta e deixá-los-ia a falar sem uma professora ou uma amiga a avaliá-los. Podia ser que, entre adolescentes e trintões, chegassem a uma qualquer conclusão, sem me porem com taquicardias nem vontade de lhes dar um valente puxão de orelhas.