03 junho 2012
Lapidado
Era amigo de amigos meus e assustou-me logo aquela sua indumentária de fatinho, mesmo que talhado em bom corte, mais o guardanapo de seda pendurado no pescocito. Até quando usava vestuário desportivo aquele marmelo aparentava a formalidade de quem se tinha vestido de acordo com as indicações fornecidas no convite. Nem sei mesmo como conseguia ter sempre as faces impecavelmente barbeadas como se não lhe nascessem pêlos todos os dias ou isso fosse uma intimidade indigna de ser vista. Ainda por cima, aquele gajo era de Direito, o curso que imediatamente associo a lobotomia, logo abaixo do floreado económico de Gestão. Como se isto tudo não bastasse, para compor o ramalhete, aquela alminha apenas bebia cerveja para nos acompanhar, deixando-a morrer morna que era um dó de alma e apenas fumava das nossas baforadas.
Vá se lá saber porquê, insistia em comunicar comigo. Teimava em me interromper a qualquer hora do dia para me transmitir uma sensação que tinha tido, por exemplo, ao ver um Ferrari na rua, como se fosse mais importante a comunicação das emoções do que os objectos em si. Eu pagava-lhe da mesma moeda, telefonando-lhe às tantas da noite para falar de coisas comezinhas e ele alimentava a conversa como se não precisasse de dormir ou não tivesse quinhentos dvd's para ver. Até começou a arriscar a asneira de me dar anéis ou pulseiras que não uso, com o intuito irónico de me ver sorrir no rasgar da prenda, entalada entre o agradecimento e o protesto.
Somando dois e dois, bem lapidadozinhos, percebi que gargalhava mais com ele do que com qualquer outra pessoa e que ao contrário do material corrente que por aí circula em barda, aquele gajo era capaz de amar como se isso não fosse uma velharia absurda digna de museu. Corri a ligar-lhe e no final da tarde, na esquina do ponto de encontro, pulei para beijá-lo, esborrachando-lhe os lábios, esfregando-lhe o cabelo, esmifrando-lhe as orelhas, tacteando-lhe o pescoço, puxando-lhe as nádegas contra o centro das minhas ancas e recuperando o fôlego disse-lhe: Gasta-me!Vá se lá saber porquê, insistia em comunicar comigo. Teimava em me interromper a qualquer hora do dia para me transmitir uma sensação que tinha tido, por exemplo, ao ver um Ferrari na rua, como se fosse mais importante a comunicação das emoções do que os objectos em si. Eu pagava-lhe da mesma moeda, telefonando-lhe às tantas da noite para falar de coisas comezinhas e ele alimentava a conversa como se não precisasse de dormir ou não tivesse quinhentos dvd's para ver. Até começou a arriscar a asneira de me dar anéis ou pulseiras que não uso, com o intuito irónico de me ver sorrir no rasgar da prenda, entalada entre o agradecimento e o protesto.
[Foto © Emanuel Oliveira, 2008, Lolita]
02 junho 2012
«conversa 1892» - bagaço amarelo
Ela - Achas bem que se gaste dinheiro público para pôr mamas maiores numa mulher?
Eu - Acho muito bem. Sou pelo Serviço Nacional de Saúde...
Ela - Eu também defendo a saúde pública, mas só em caso de doença. Agora para uma gaja pôr umas mamas maiores é que não.
Eu - Eu cá acho bem. Até porque quando uma mulher põe umas mamas novas está a contribuir, não só para ela própria se sentir melhor, mas também para que muitas outras pessoas sejam mais felizes.
Ela - Muitas outras pessoas?! Mas tu achas que as mulheres vão todas para a cama com muitas pessoas?
Eu - Não estou a falar de ir para a cama, estou falar só da parte visual da coisa.
Ela - Não acredito no que estás a dizer.
Eu - Porquê?
Ela - Mas tu passas a vida a olhar para as mamas das gajas?
Eu - Não foi isso que eu disse.
Ela - Acho que talvez pudéssemos gastar dinheiro público a aumentar o cérebro de alguns homens...
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
Eu - Acho muito bem. Sou pelo Serviço Nacional de Saúde...
Ela - Eu também defendo a saúde pública, mas só em caso de doença. Agora para uma gaja pôr umas mamas maiores é que não.
Eu - Eu cá acho bem. Até porque quando uma mulher põe umas mamas novas está a contribuir, não só para ela própria se sentir melhor, mas também para que muitas outras pessoas sejam mais felizes.
Ela - Muitas outras pessoas?! Mas tu achas que as mulheres vão todas para a cama com muitas pessoas?
Eu - Não estou a falar de ir para a cama, estou falar só da parte visual da coisa.
Ela - Não acredito no que estás a dizer.
Eu - Porquê?
Ela - Mas tu passas a vida a olhar para as mamas das gajas?
Eu - Não foi isso que eu disse.
Ela - Acho que talvez pudéssemos gastar dinheiro público a aumentar o cérebro de alguns homens...
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
«Mulher viola», acrílico sobre tela, Janine Dupont, Canadá, 2001
Um dos 66 quadros da minha colecção que não estão expostos, até 5 de Junho, no Recordatório Rainha Santa Isabel, em Santa Clara (Coimbra).
01 junho 2012
Pandora
Ela olhou-o, impávida, e concluiu:
– Tenho pena.
Surpreendido pela reacção ou pela falta dela, ele permaneceu calado.
Ela encolheu os ombros ostensivamente, semicerrou os olhos e iniciou outra conversa ainda que parecesse a continuação da anterior, em que ele lhe tinha confessado que a traíra antes de acabar a relação.
– Tenho pena por ti, que não sabes o que queres. – Ele abanou a cabeça para expressar discordância. Ela sinalizou a indiferença com uma careta e continuou: – Que me trais e que te trais da mesma forma. Que mentes e que te mentes. Que dizes que não queres saber de mim quando, mais do querer saber de mim, o que podia ser compreensível, o que queres é magoar-me.
– Eu não te quero magoar – barafustou ele – e não quero saber de ti. Quero que faças a tua vida e me esqueças, porque eu já me esqueci de ti.
– Esqueceste-te.
– De quê?
– De te esqueceres de mim.
– Isso é de uma música.
– Que seja. O que é eu ganhei por me confirmares que me traíste?
– Tu?!
– Ah! Afinal tens razão: não queres saber de mim para nada. Magoares-me ou não é-te completamente indiferente.
– Nada disso. Não eras tu que dizias que querias saber a verdade, por mais dolorosa que fosse?
– Era mas já não te digo a ti. Estás fechado. És uma caixa fechada, o que lá está é porque eu acho que merece ser guardado, seja bom ou mau, mas não pretendo pôr mais nada lá dentro e, se puder, nem quero ter razões para tirar coisas da caixa ou mudá-las de sítio. Estás fechado. Não me digas nada de novo. Se te queres justificar ou se te der uma crise de remorsos, não me procures. Não me contes. Nunca te esqueças que me esqueceste. É um favor que nos fazes.
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