24 junho 2012

Limpinhas e lavadinhas


Clean (2011) from Richard Kern on Vimeo.

Gustavo


A inundação começou com o seu sorriso de olhos cúmplices, avolumou-se com os gostos comuns por letras e imagens e as suas histórias cheias de descobertas nas rotinas citadinas a impregnar a minha alma de mata-borrão e foi às apalpadelas na cheia que me pareceu natural como a minha sede que após diversas tentativas de localização ele me sentasse na rocha do aparador da entrada e então ao mesmo nível, fizesse canoagem nos meus rápidos vaginais que nunca fui moça de ficar quieta.

Mas adiante que além das diárias mãos dadas também recordo os primeiros raios de sol a enfeitarem o quarto como serpentinas em cada manhã que me arrebitavam para a festa de lhe beijar cada milímetro desde as ramelas ao Everest privativo. E os finais da tarde na banheira onde largávamos as canseiras do dia para emergirmos na comunicação dos corpos, no morse de tocar os pontos de cada vértebra do pescoço e coluna em escala descendente fazendo a electricidade estática que torna urgente entrar no sistema. E a moleza do final da digestão do jantar que nos aninhava no sofá numa sôfrega sobremesa de sucção mútua que me encavalitava nas suas ancas, mãos esborrachadas nas suas nádegas, num trote seguro até ao galope final emitido em onomatopeias.

Nem me incomodava a tampa da sanita sempre levantada, um pormenor de somenos perante a sua perfeição a bailar a casa de aspirador na mão e gostava que tivesse durado o resto dos dias da minha vida.

«O Lacerda» - por Rui Felício


Era o funcionário mais estranho que conheci. Quantos anos teria? Trinta? Quarenta? Mais?
Magríssimo, esquelético mesmo, as faces encovadas de onde lhe sobressaiam as maças do rosto, quase a romper a pele macilenta. O cabelo preto de azeviche, empastado de brilhantina barata, parecia colado à cabeça. As orelhas de abano pareciam ter sido cosidas com agulha ferrugenta dos dois lados da cabeça, prontas a despegarem-se ao menor sopro de vento.Como numa lúgrube cruzeta, adejavam as roupas muito largas, de tons pretos ou cinzentos.
Falava pausadamente para disfarçar a gaguez. Lia e relia a papelada que os alunos lhe entregavam na secretaria do liceu para se matricularem, pagarem as propinas ou requererem exames, na demanda ínfrene de descortinar algum formulário incompleto ou mal preenchido.
Quando descobria algum erro, adoptava uma postura vencedora,altaneira, que o seu metro e sessenta empinado pelo tacão alto dos sapatos de fivela lhe permitia, e vociferava lentamente, em voz pastosa, fitando o aluno por trás dos seus óculos de aros grossos de imitação de tartaruga:
- Olha lá rapazote, aqui no Liceu não se admitem analfabetos. Vai para um colégio qualquer e volta cá só quando já souberes preencher os papéis.
Puxava a manga de alpaca para o cotovelo, engordurada de meses a fio sem ser lavada e pegava nos papéis do aluno que se seguia na fila.

Mas que homem era aquele, quem era de facto o burocrata a debater-se imundo na camisa de forças do rígido normativo da secretaria, humilhado às escondidas pela rapaziada? Será que acalentava algum sonho? Qualquer homem os tem. E ele? Tinha algum? Ou alimentava-se apenas da autoridade efémera sobre os alunos que as regras do liceu lhe conferiam? Bastar-lhe-ia comer o pó dos processos escolares que enchiam as paredes e as secretárias?
Não! Viemos a saber que não!
Figura caricatural, dentro do esqueleto que lhe furava a camisa passajada, o coração do Lacerda também amava.
Também sonhava! Aquela mulher de lábios grossos, carnudos, de pernas roliças, seios fartos a saltarem pelo decote da blusa às flores, a quase rebentarem os botões de osso de javali que a cingiam ao corpo, trazia-o ensandecido. Fora a única mulher que conhecera em toda a sua vida que não se ria dele, que lhe sorria meiga, que o escutava atenta, que lhe sussurrava palavras de amor e que gemia nos seus braços esqueléticos, na penumbra do quarto daquele primeiro andar onde todos os dias se ia encontrar com ela.
Ultimamente, o Lacerda pedia por vezes dinheiro emprestado aos colegas, porque aquele amor louco lhe estava a esgotar as economias. Nem parecia o mesmo! A partir do meio da tarde, ansiava que os ponteiros do relógio ganhassem maior velocidade, para sair do trabalho, encharcar-se em perfume reles que empestava tudo à sua volta, apanhar o eléctrico na Alameda e depois apear-se em andamento perto da Praça 8 de Maio.
Era vê-lo então a embrenhar-se nas vielas da Baixa, chocalhando os ossos, em passo estugado, os tacões de pau de cinco centímetros já descambados, a baterem ritmados na calçada. Chegado, subia dois a dois os estreitos degraus de madeira carunchosa até ao primeiro andar.
Recobrava o fôlego, abria os braços em direcção à sua amada, deixava antever os dentes amarelos num arremedo de sorriso, num esgar cadavérico e articulava melancolicamente, disfarçando a gaguez:
- Meu amor! Vamos?
- A Carmen, assim era o seu nome, espanhola de Cáceres que imigrara há um bom par de anos para trabalhar em Coimbra, sorria-lhe, passava-lhe a mão pelo cabelo oleoso e levava-o pela mão ossuda, como a um menino, para o quarto daquele nº 13 da Rua Direita…

Rui Felício
Blog Encontro de Gerações

Disconnecting people



Ricardo - Vida e obra de mim mesmo
(crica na imagem para abrir aumentada numa nova janela)

23 junho 2012

Homens, aprendam a instalar uma ventoinha de tecto

«conversa 1895» - bagaço amarelo

Ela - Gostava que te tivesses apaixonado por mim, pelo menos uma vez na vida.
Eu - Para quê? Já falámos sobre isso...
Ela - Pois já.
Eu - Somos bons amigos, acho eu, e se tu nunca te apaixonaste por mim, não percebo porque é que raio quererias que eu me apaixonasse por ti.
Ela - Para te fazer sofrer um bocadinho. Só isso.
Eu - Para me fazer sofrer?!
Ela - Sim, tenho esta sensação estúpida de que nunca ninguém sofreu por mim.
Eu - Estás bem?
Ela - Sempre que um homem se apaixonou por mim, eu apaixonei-me por ele. Sou uma fácil...
Eu - Não sabes se algum homem sofreu por ti em silêncio...
Ela - Pois não, mas queria tanto saber.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Gravuras do livro «Égarements de Julie», de 1949

Três das 21 gravuras que ilustraram o livro.
Litografias sobre Vélin de Rénage (folha A4 - imagem: 16,5x13,5cm)
A partir de agora, na minha colecção.




Um sábado qualquer... - «Tetris»





Um sábado qualquer...

22 junho 2012

Banho aos checos




HenriCartoon

Burras ou não burras, catarro e Frusteka

Depois do sucesso destas duas louras a falarem de amizade, boleias e hemorróidas, eis que elas regressam...

O azul do mar

Nunca foste capaz de te esquecer, pois não?
Não. Nunca ultrapassei o que me fizeste.
E nunca foste feliz?
… Fui. Sim, fui… Cheguei a ser.
Comigo?
Contigo.
Mas estávamos condenados. Condenados desde o principio.
Provavelmente. Vendo as coisas hoje, estávamos.
Achas que a culpa foi minha?
Quando se ama não há culpas.
Achas?!
Não, na realidade, não. Só na política portuguesa é que não há culpas, em tudo o resto há. Ainda que possam ser repartidas.
Eu amava-te, isso é verdade. E o que fiz, fi-lo por amor.
Eu sei. Sempre soube.
Mas nunca esqueceste.
Mas tentei. A sério que tentei.
E amaste-me?
… Sim...
Tens de pensar?
Em quê?
Se me amaste. Hesitaste. Não estavas a pensar?
Estava mas, pensando bem, não precisava.
Claro que não. Estamos a ser absolutamente sinceros, foi o que combinámos.
Não precisamos de pensar.
Pois.
Na verdade, acho que nunca te amei. Gostei de ti e quis amar-te mas nunca te amei, porque, mesmo nos momentos que gostava de ti e queria gostar de ti ainda mais e esquecer o que me fizeste, tinha de estar a pensar em querer esquecer… Acho… Acho que se alguma vez te tivesse realmente amado tinha esquecido o que me fizeste e nunca consegui… Desculpa.
Não tens de me pedir desculpa. Eu tive-te. Quis ter-te e tive-te. E não te peço desculpa.
Eu sei.
Sabes?
Sei, sempre tive consciência disso, mas…
Mas?
Dava-me conforto que alguém me quisesse e que, ainda por cima, me quisesse assim. O teu amor psicótico era o alimento da minha auto-estima desequilibrada.
Desculpa?!
O teu amor psicótico era o alimento da minha auto-estima desequilibrada.
Já tinhas pensado nessa frase?
Já.
E era por isso que me traías?
Por pensar na frase?
Não! Por causa do meu amor psicótico e da tua auto-estima desequilibrada.
Acho que sim. Também porque não era feliz… Mas sim, principalmente, porque ora estava de rastos ora estava no topo do mundo e porque queria demonstrar e perceber que podia haver quem gostasse de mim sem seres tu. E tu?
Eu?
Sim, tu. Traías-me porquê?
Eu… Eu… Acho que pelas mesmas razões que tu: queria que gostassem de mim, de estar comigo. Queria provar que era capaz e que, apesar de ti, havia quem me quisesse. Queria pensar que era livre. Que podia viver sem ti. Deixar de te amar. Libertar-me de ti. Ser outra pessoa.
És?
Hoje?
Sim. Sou. E tu?
Também. Estou diferente.
E, no entanto, estamos aqui.
Estamos só a tomar café.
Pois estamos...
A tomar café…

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