"Quiero música, maestro, se lo pido por favor, que esta noche estoy de Tangos!"
blog A Pérola
14 outubro 2012
«O último tango em Paris» - por Quito Pereira
João Pires aconchegou a gola do casaco, naquela tarde fria de Janeiro. Sentado num banco da Estação de Santa Apolónia, olhava a chuva miudinha e enervante que caía sobre Lisboa. No seu olhar errante, mirava as carruagens na gare, enquanto um altifalante roufenho, debitava informações sobre a chegada e partida dos comboios. Depois, fixava-se nos carris a perder de vista, até à curva onde o olhar lhe consentia. Eram os carris do Destino. Estava de partida para Paris, agora que o país que o vira nascer, o empurrava para a fronteira. Na Beira - Baixa, deixou a mãe viúva, encostada à soleira da porta, limpando as lágrimas ao avental negro que era o espelho da sua alma. Abraçaram-se em silêncio e João partiu, levando na mala em partes iguais, um quinhão de esperança e outro de desespero.
Ao apito estridente do chefe – da - estação, o comboio partiu, com um solavanco. Depois, foram dois dias de viagem, com transbordos e paisagens diversas. Mas João ia absorto nos seus pensamentos, recordando a família e a aldeia que deixara para trás, o berço da sua infância. No bolso, ciosamente guardado, o pecúlio que a mãe lhe dera e tirara do fundo da arca onde guardava o centeio, fruto de muita poupança. Também uma carta – de - chamada, que lhe compraria a força dos braços, numa qualquer obra de Paris.
Tudo correu bem. Apesar de dividir a camarata com três companheiros, João Pires deixou-se embalar ao ritmo da grande cidade. À tarde, depois do trabalho, percorria com os amigos as ruas da capital, ao som dos acordeons que despontavam em cada rua e em cada viela. Era o perfume francês, que lhe embriagava a alma.
Num Sábado, pleno de sol, mais afoito e conhecedor dos segredos da grande metrópole, João saiu sozinho à conquista de Paris. Novo e bem - parecido, João percorreu os Campos Elísios, em direcção ao Arco do Triunfo. A correria dos automóveis, o movimento dos passantes, o clamor da cidade, tudo era uma nova realidade a que se ia acostumando.
Até que, numa pequena esplanada se sentou. Precisava de um café retemperador. Foi então, que uma rapariga se acercou dele. Era empregada do pequeno estabelecimento e a barreira da língua, que poderia ser um entrave ao diálogo, mais não foi que a troca de uma gargalhada. Riram. Riram muito. Depois, mais sérios, olharam-se nos olhos e Nicole apressou-se a trazer a bebida requerida. João ficou ali, sentado, a sorver o café em pequenos tragos e a observar todos os movimentos da bela francesa de olhos grandes e cabelo loiro. E ela, de faces ligeiramente roborizadas, escondia que naquele momento o seu coração batia forte. Decididamente, juntara-se gasolina à fogueira, ao som arrebatador de um entusiasmante tango em Paris.
Nessa noite, João dormiu mal. E, no emprego, trabalhava maquinalmente, fazendo contas aos dias que faltavam para Sábado e de novo encontrar Nicole, no simpático bar de uma esquina da cidade. Durante meses, foi assim. Mais conhecedor da língua, João esperava que ela saísse do trabalho e ela, um dia, confidenciou-lhe que morava numa mansarda, numa rua próxima dos Campos Elísios. João acompanhou-a até lá. Subiram a escada escura, até à porta da habitação. Depois beijaram-se. E ele, fez menção de entrar. Ela, porém, suave e delicadamente, empurrou-o com uma mão no peito, impedindo-lhe a passagem e, devagar, fechou a porta. João ficou ali, parado e sozinho, a esbracejar em ondas de desespero. Depois partiu, para junto dos companheiros, trazendo na mente a ideia que os dias de férias a passar em Portugal, ficariam para outra ocasião. Seriam passadas com Nicole. Iria propor-lhe que ela também pedisse dispensa na mesma altura, para voarem nas asas da paixão. Se assim o pensou, melhor o fez. E ela, louca de amor por ele, concordou.
Foi num dia de Setembro, que, de mãos dadas, se passearam pelos jardins do “Trocadero”, mesmo junto à Torre Eiffel. As férias estavam no fim e João preparava-se para regressar ao trabalho. Para trás, ficavam as caminhadas nas margens Sena e as noites passadas na mansarda, naquele ninho de amantes. Ali, em momentos escaldantes e sôfregos, trocavam de alma, trocavam de corpo e trocavam de beijos ardentes. Antes, ao som do gira – discos, dançavam o tango, ao ritmo da voz temperada e envolvente de Carlos Gardel.
Numa tarde cinzenta de Outubro, João Pires foi confrontado com o destino. Um pé mal colocado, o desequilibrar de um andaime e o estatelar- se desamparado na calçada. Correram os companheiros, aflitos, em sua ajuda, mas João não dava sinal de vida. Rapidamente, foi levado para um hospital de Paris. Em coma, permaneceu vários dias. Até que acordou. Porém, o seu estado de saúde era grave e a sua recuperação muito lenta. Por vários meses, permaneceu internado. Mas, num dia de Abril, já recomposto mas ainda débil, João regressou ao estrondo da cidade. Porém, a rota dos seus pontos – cardeais, apenas lhe lembrava um destino: o bar de Nicole. Ainda meio trôpego e magro, João partiu na procura da sua amada. No estabelecimento entrou, mas não viu Nicole. Do lado de lá do balcão, em silêncio, Pierre, o dono do pequeno bar, olhava-o, num misto de surpresa e de compaixão. Então, João sentou-se e perguntou por ela. Pierre olhou-o, taciturno, e, de uma gaveta, retirou um pequeno envelope fechado, que, sem explicações entregou a João. Com um ar grave e as mãos trémulas, João abriu o envelope que continha um pequeno bilhete e leu:
João
Não estou certa que leias estas linhas. Nunca mais voltaste e desesperei de esperar por ti. É estranho que neste tempo que passámos juntos, nunca me ter preocupado em saber onde moravas ou o que fazias. De saber tão pouco de ti. Foi pecado meu. Restou-me esperar. Penso, agora, que tudo não passou de uma fugaz ilusão e que tu rumaste a outras paragens ou, talvez, a outra mansarda. Já não estou em Paris. Parti para Itália, com Ângelo. Apesar da diferença de idades, decidi viver com este italiano cortês, com quem me sinto segura e a tua ausência fez-me ter a certeza que tudo terminou entre nós. Deixei a minha casa e o café do Pierre, onde não tinha futuro. Tal como tu, que deixaste do teu país, também eu atravessei a fronteira, na procura de uma vida melhor. Gosto do Ângelo, mas apenas gosto, porque é amável e leal para comigo. Mas foi por ti que um dia me apaixonei e guardarei para sempre a recordação dos momentos felizes que contigo vivi.
Sempre tua
Nicole
Por minutos, João ficou de olhos fixos no chão, meditabundo. Pierre, varria o chão do bar, num mutismo comprometido. Então, levantou-se com dificuldade, apertou a mão a Jean Pierre e partiu.
Por Paris deambulou, até que a noite o cobriu com a sua capa de escuridão. Sentado num lugar isolado, nas margens do Sena, a carta amarfanhada entre os dedos, João escutava o rio, com um olhar ausente. No seu cérebro, em turbilhão, lembrava o rosto da bela Nicole. Também a penumbra da velha mansarda, os tangos dançados no auge da paixão e a voz inesquecível de Carlos Gardel. Com a cabeça entre as mãos, no zénite do desespero, deu um grito e atirou-se ao rio, que rapidamente o tragou e acolheu no seu ventre.
Depois, o silêncio. Apenas o lúgubre murmurar do Sena, em sentido pranto. Até a voz argentina de Gardel, de triste, emudeceu. João Pires acabara de dançar, em passada lenta e sofrida, o seu último tango em Paris.
Quito Pereira
Blog Encontro de Gerações
Boa, rapaz!
Ricardo - Vida e obra de mim mesmo
(crica na imagem para abrir aumentada numa nova janela)
13 outubro 2012
«fecho éclair» - bagaço amarelo
No avião teve o primeiro remorso e até chegou a pronunciar o nome dela, Ana, atraindo por instantes a atenção do passageiro ao seu lado. Pensou em como o corpo dela se está a transformar com a gravidez de quem vai ser, em breve, o seu primeiro filho. Os seios como frutos maduros, as pernas como raízes grossas e a barriga em forma de balão parecem pertencer já mais a esse filho do que a ele mesmo. Não fazem Amor há dois meses e as conversas entre ambos também não têm fugido muito às questões de organização doméstica. Contas por pagar, roupa por passar, louça por lavar, etc. Ana.
Mal saiu do avião e se pôs a passear pela cidade, a primeira sensação de novidade que teve foi a de poder olhar para todas as mulheres que passavam por ele como se fossem suas potenciais amantes. Talvez por isso precisasse de estar sozinho, para sentir de novo essa chama do sexo a arder-lhe no corpo. Andou toda a manhã alegremente perdido, até se meter num comboio e ir dar ao parque de diversões onde se encontra agora.
O Rui detesta fumar. Enjoou aquele sabor artificial do tabaco e a constante sensação de estar intoxicado, fartou-se daquele cheiro a fumo impregnado na roupa todas as manhãs (é sempre de manhã, ao vestir-se, que dá por ele) e até já se esqueceu do prazer que teve nos primeiros cigarros da sua vida. Mesmo assim acaba de acender um cigarro, talvez porque também deteste não fumar.
Para além do tabaco, detestar uma coisa e o seu contrário só lhe aconteceu no Amor. Lá está, sente-se cansado de Amar Ana mas também detestaria não Amá-la. Ri-se sozinho entre duas passas sem sabor e diz para si mesmo que não está maluco. Malucos estão aqueles que gritam na Montanha Russa que se agita mesmo por trás de si, cujos carros quando passam vão fazendo um ruído idêntico ao que seria o dum fecho éclair gigante.
Hoje parece ser o dia dos contrários para ele. Fuma detestando fumar, não Ama adorando Amar. Além disso, num dia em que se sente tão cinzento quanto a própria vida, acabou a passear sozinho num parque de diversões nos subúrbios de Madrid.
É neste lento contar do tempo que uma mulher se aproxima dele e lhe pede lume. A primeira coisa em que ele repara é que ela é bonita, ou melhor, que lhe apetece achá-la bonita. Tem os cabelos pretos, talvez pintados, e os olhos de um castanho claro contrastante. Depois de acender o cigarro dela no dele não se vai embora, mas antes decide sentar-se no mesmo banco a contemplar a diversão dos outros. Os gritos na Montanha Russa, mesmo por trás deles, continuam a intercalar o fecho éclair gigante.
Ali, à frente do silêncio de ambos, desfilam famílias de pais e mães que tentam divertir-se divertindo os filhos. Ele sabe que um dia fará exactamente o mesmo, com Ana e o seu filho. Talvez até venha a disputar com ela o colo da criança, como vê agora dois pais fazerem num momento em que a criança decide chorar. Mas neste momento, olhando para aquela mulher sentada mesmo ao seu lado, a fumar um cigarro cuja chama nasceu no mesmo fogo, apetece-lhe amá-la.
O fecho éclair atrás deles corre mais uma vez, salpicado de gritos de pessoas que lhe parecem tão assustadas quanto felizes. Também o das calças dele parece querer abrir, dada a pressão que o falo, entusiasmado pela simples imaginação de poder levar a estranha para o Hotel, lhe causa. Vai esperar que ela acabe o cigarro e convidá-la para uma bebida. Se ela aceitar, tentará ter sexo. A vida é uma montanha russa.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
12 outubro 2012
Mais literatura histérica
Lembras-te deste tema da literatura histérica, quando o abordámos aqui? Mulheres lêem um livro, em voz alta, com um vibrador introduzido na vulva e ligado.
Experiência 4
Aprecia como se safa a Danielle a ler «Still Life With Woodpecker», de Tom Robbins:
Experiência 5
Esta senhora, Stormy Leather, nem consegue passar da segunda página de «American Psycho», de Bret Easton Ellis:
Experiência 4
Aprecia como se safa a Danielle a ler «Still Life With Woodpecker», de Tom Robbins:
Experiência 5
Esta senhora, Stormy Leather, nem consegue passar da segunda página de «American Psycho», de Bret Easton Ellis:
Entre dunas
Em cada poro respiro-te o perfume marinho
que ondula pela tua encosta de pedra,
mas polida pelas mãos de espuma branca
desse corpo salgado e imenso
sob a claridade do dia
e a vigília prateada da lua...
Ergues-te entre as dunas de areia macia,
sorvendo-me o licor de mel
que se destila em cada uma das minhas concavidades
de veludo e seda...
E quando o vento refresca esse sol quente de Primavera
começa a chover sobre a nudez que nos tinge a pele...
Ardemos sob esta água fria!
Enlaço-te uma e outra vez entre a foz do meu rio
até me alimentares de sémen e saliva!
Lua Cósmica
http://luacosmica.blogspot.pt/
11 outubro 2012
Antecipação
Entreabro as minhas
coxas
no início dos teus beijos
imagino as tuas
pernas
guiadas pelo desejo
oiço o teu
gemido
calado pelos meus dentes
imagino a tua boca
rasgada
sobre o meu ventre
Maria Teresa Horta in As Palavras do Corpo
blog A Pérola
coxas
no início dos teus beijos
imagino as tuas
pernas
guiadas pelo desejo
oiço o teu
gemido
calado pelos meus dentes
imagino a tua boca
rasgada
sobre o meu ventre
Maria Teresa Horta in As Palavras do Corpo
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