05 maio 2015

Sensível habilidade


A pele é muito sincera e jamais consegue reprimir um arrepio.

Sharkinho
@sharkinho no Twitter

«quero» - Licínia Girão

«La tentazione» (a tentação)
Itália, 2014
Estatueta em barro vermelho da
colecção de arte erótica «a funda São»
quero
a flor do teu jardim
desabrochar na flor da tua vida
sentir o hálito da tua boca depois do charuto fumado
beber pelo teu copo de vinho aromatizado

quero
em mim o cheiro do teu perfume
aconchegar nos meus seios o ardente calor da tua pele
vestir-te como a roupa que me aquece o corpo frio de saudade

quero
ser portadora dos teus segredos
voar em ti exausta

quero
ser a degustação da tua fome
o perfume escolhido do teu cheiro
a escolhida do teu olhar

quero
tão-somente ser o calor do teu frio
somente ser tua

Licínia Girão

Onde está a mosca?

Mulher sentada com vestido longo. Virando-se a peça, por baixo, vê-se o rabo… e uma mosca numa das nádegas
Peça em porcelana que se junta a outros mecanismos e segredos da minha colecção.




Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)

04 maio 2015

Associação alemã de apoio à gaguez - «Guarda a tua paciência...»

«sou um enorme sucesso entre as mulheres» - João

"A verdade é que eu sou um enorme sucesso entre as mulheres. Não é ser convencido nem nada, mas nem posso sair à rua. Elas não tiram os olhos de mim. É incrível. A coisa chegou a um ponto que eu próprio não aguento mais. A sério que preferia ser um tipo banal e passar discreto entre a multidão.
Ainda ontem, por exemplo, para ver se conseguia passear sossegado pela cidade, disfarcei-me de pinguim. Vesti um pijama comprado na Primark que tem luvas e rabo incluído. Pois bem, não resultou. Assim que saí de casa, a primeira mulher por quem passei seguiu-me com o olhar durante o tempo todo. Nem disfarçou. Claro que não liguei. Acendi um cigarro e continuei.
Não aguento muito tempo sem tomar o café da manhã, pelo que entrei numa pastelaria venezuelana e sentei-me num canto onde, pensava eu, ninguém ia reparar em mim. Enganei-me. A empregada foi a primeira a não resistir ao meu charme. Em vez de, muito simplesmente, me perguntar o que eu queria, perguntou-me se estava tudo bem comigo. A fingir-se preocupada, a gaja. Nem lhe respondi. Disse-lhe só para me trazer um café. Acreditem que esteve o tempo todo a olhar para mim, ela e todas as outras clientes, sempre com risinhos comprometedores.
Uma delas até se meteu mesmo comigo. Ganhou coragem e deu-me o contacto dela num cartão de visita. É psiquiatra, a gaja. Eu já reparei que as psiquiatras têm todas um fraquinho por mim, mas não lhes ligo nenhuma. Fico sempre na minha, a ver se não me chateiam. A esta, por exemplo, prometi telefonar, mas claro que não o vou fazer. Uma vez telefonei a uma e marcámos um encontro. A primeira coisa que ela me disse foi para me deitar numa marquesa. O que ela queria sei eu muito bem. Virei logo costas, que para mim o sexo só faz sentido depois de travar algum conhecimento.
Detesto este tipo de cenas, mas não consigo que as mulheres deixem de olhar fixamente para mim. Alguns de vocês até podem pensar que é por eu me disfarçar de pinguim, mas acreditem que não. Hoje disfarcei-me de hipopótamo e foi a mesma coisa. É assim a vida de um homem charmoso."


João
Geografia das Curvas

Postalinho de Santiago (2ª série - 8º e útlimo)

"Coisas que se encontram ao longo do Caminho Português pela Costa para Santiago de Compostela.
Finalmente o famoso «Carallo vinte nove», localizado em Santiago na Rúa Travesa, a seguir ao nº 27, que vem nos guias turísticos."
Antonino S.




Entenda o conceito de metrossexual



Capinaremos.com

03 maio 2015

«O descanso do guerreiro»


Le repos du guerrier from José Grisel on Vimeo.

Luís Gaspar lê «A Carta da Paixão» de Herberto Hélder


Esta mão que escreve a ardente melancolia
da idade
é a mesma que se move entre as nascentes da cabeça
que à imagem do mundo aberta de têmpora
a têmpora
ateia a sumptuosidade do coração. A demência lavra
a sua queimadura desde os recessos negros
onde
se formam
as estações até ao cimo,
nas sedes que se escoam com a largura
fluvial
da luz e a espuma, ou da noite e as nebulosas
e o silêncio todo branco.
Os dedos.
A montanha desloca-se sobre o coração que se alumia: a língua alumia-
se.
O mel escurece dentro da veia
jugular talhando
a garganta. Nesta mão que escreve afunda-se
a lua, e de alto a baixo, em tuas grutas
obscuras, a lua
tece as ramas de um sangue mais salgado
e profundo. E o marfim amadurece na terra
como uma constelação. O dia leva-o, a noite
traz para junto da cabeça: essa raiz de osso
vivo. A idade que escrevo
escreve-se
num braço fincado em ti,
uma veia
dentro
da tua árvore. Ou um filão ardido de ponta a ponta
da figura cavada
no espelho. Ou ainda a fenda
na fronte por onde começa a estrela animal.
Queima-te a espaçosa
desarrumação das imagens. E trabalha em ti
o suspiro do sangue curvo, um alimento
violento cheio
da luz entrançada na terra. As mãos carregam a força
desde a raiz
dos braços, a força
manobra os dedos ao escrever da idade, uma labareda
fechada, a límpida
ferida que me atravessa desde essa tua leveza
sombria como uma dança até
ao poder com que te toco. A mudança. Nenhuma
estação é lenta quando te acrescentas na desordem, nenhum
astro
é tão feroz agarrando toda a cama. Os poros
do teu vestido.
As palavras que escrevo correndo
entre a limalha. A tua boca como um buraco luminoso,
arterial.
E o grande lugar anatómico em que pulsas como um lençol
lavrado.
A paixão é voraz, o silêncio
alimenta-se
fixamente de mel envenenado. E eu escrevo-te
toda
no cometa que te envolve as ancas como um beijo.
Os dias côncavos, os quartos alagados, as noites que crescem nos
quartos.
É de ouro a paisagem que nasce: eu torço-a
entre os braços. E há roupas vivas, o imóvel relâmpago das
frutas. O incêndio atrás das noites corta
pelo meio
o abraço da nossa morte. Os fulcros das caras
um pouco loucas
engolfadas, entre as mãos sumptuosas.
A doçura mata.
A luz salta às golfadas.
A terra é alta.
Tu és o nó de sangue que me sufoca.
Dormes na minha insónia como o aroma entre os tendões
da madeira fria. És uma faca cravada na minha
vida secreta. E como estrelas
duplas
consanguíneas, luzimos de um para o outro
nas trevas.

Herberto Hélder
(Funchal, 23/11/1930) Poeta, ficcionista, jornalista, bibliotecário, tradutor, apresentador de programas de rádio e de televisão.
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

Escritura


O Senhor Doutor não imagina a marcação cerrada que ele me fazia. Começou pelos olhares de soslaio para as minhas pernas traçadas a despontar de saias justas. A urgência repetida em me questionar sobre a eficácia dos balancetes, de pé, debruçado sobre a minha secretária, de cada vez que eu vestia um decote mais aberto. O convite para o cafézinho a meio da manhã ou da tarde, para relatar as suas saídas e gostos pessoais, para tirar da minha púcara os nabos que desenhavam o gráfico da minha disponibilidade.

Em seguida, passou a um estado de prontidão, sempre à porta do elevador na minha hora de saída, para me ofertar flores feitas de clipes ou desenhadas em folhas A4 de papel IOR ou armadas num pau de lápis Noris com post-it’s amarelos, estendidas nuns olhos que inegavelmente soletravam “Comia-te toda!”. Depois, vieram os carros de assalto de mensagens enviadas a meio das reuniões de trabalho em que ambos participávamos, com a expressiva inclusão de fotos das suas calças.

É claro que quando se trabalha 10 horas por dia, como era hábito naquela empresa, sobra muito pouco tempo para procurar divertimento fora do local de trabalho e lá acabámos por nos enrolar.

Feitas as contas, o saldo de cama até era muito equilibrado e caso morássemos juntos reduziríamos as despesas de cada um para metade, o que perspectivava um bom investimento, pelo que foi uma questão de acertar uma data nas agendas para assinar a escritura. Ao final da tarde, como se tornou moda, com uns cocktails e uns aperitivos de entrada para estimular o sorriso nos convidados enquanto se despacha a catrefada de fotografias do acto público.

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Deixei-lhe a pachacha tão em brasa que até acionou o sistema de alarme de incêndios do hotel.

Patife
@FF_Patife no Twitter

02 maio 2015

«Bottom feeders» (alimentadores de traseiras)


Bottom Feeders from Matt Reynolds on Vimeo.

«Reprodução» - por Rui Felício


O Coronel Ramires, pai de Vasco Ramires que ganhou uma medalha no Concurso de Saltos Equestres dos Jogos Olímpicos de Munique em 1972,tinha uma quinta no Tramagal onde fazia criação de cavalos de raça lusitana e puros-sangue ingleses cruzados com árabes.
José Cid, cantor de todos conhecido e que possuía uma herdade na Chamusca, terra ribatejana, perto do Tramagal, comprou-lhe vários cavalos.
Por razões que não vêm agora ao caso, honro-me de ter merecido a amizade do Cor. Ramires e do seu filho.
Um fim de semana fui convidado, entre outras pessoas, a ir visitar a sua bela Quinta do Tramagal. O Cor. Ramires orgulhava-se dos seus cavalos e queria mostrar-nos a forma como os criava e os ensinava. Dizia-me ele, que era sempre com mágoa que via sair algum dos seus animais, depois de os ter visto nascer e de durante 3 ou 4 anos ter assistido ao seu crescimento e à evolução das suas qualidades como cavalos treinados para provas desportivas equestres. Mas tinha que os vender para rentabilizar a exploração.
Naquele dia, íamos assistir a um fenómeno natural mas a que os homens da cidade, não estão habituados. Uma égua, que andava “saída”, ia ser montada por um cavalo garanhão.
Num terreiro vedado, assistimos aos jogos de sedução da égua e do crescente entusiasmo do cavalo, perfeitamente visível aos olhos de todos quantos observavam.
A Helena, jovem e bonita mulher criada na quinta desde criança, ali vivia e acompanhava a vida dos cavalos nos mais pequenos pormenores. Por isso, tinha sido nomeada pelo Cor. Ramires como “Tratadora Principal”, cargo complexo que ele não lhe atribuiria se ela não fosse realmente, como era, uma competente especialista na matéria.
Perto de mim, e percebendo a minha crescente concentração na patente excitação daqueles dois animais, disse-me, com uma pequena gargalhada:
- Parece que também se está a excitar!...
- Para falar a verdade, você não se engana, Helena... – respondi eu, meio a sério, meio a brincar.
A Helena atiçou-me ainda mais, dizendo-me, desta vez em voz baixa para que os outros convidados não ouvissem:
- Só depende da sua vontade ! Uma palavra sua e far-lhe-ei a vontade com todo o prazer.
Um turbilhão de pensamentos revolteava-me a cabeça. Reuni toda a coragem e disse-lhe:
- Oh Helena, não me provoque! Você já percebeu qual é a minha vontade. Diga-me quando e onde!
Responde-me a Helena:
- “Onde”? Bem, o sitio é este mesmo que é o mais adequado.
- Quanto ao "Quando", pode ser já! A égua, que está cheia de cio, é toda sua...!
Rui Felício
Blog Encontro de Gerações
Blog Escrito e Lido
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NB: Conto dedicado ao amigo Carlos Domingos, homem que passou grande parte da sua vida no meio equestre de Mafra e que mantém um amor à equitação e aos cavalos que não esconde.