«Tango» - Zheng Qiuna
Óleo sobre tela, China, 2003
Colecção de arte erótica «a funda São»
Enlaçados fortemente
Deslizam pela sala,
Ele sorri, ela não fala…
Bem colados,
os peitos bem unidos
em requebros sensuais,
embaralhados
os corpos e os sentidos
nos movimentos desiguais –
ela enrolava-o todo nos vestidos!
E os olhos falam de um desejo,
exigente, febril, incendiado!
As bocas recortaram-se num beijo…
- uma promessa
apenas
que se não confessa,
pondo-lhe sombras morenas
no olhar cobiçoso e abrasado!
……………………………………………………
A orquestra emudeceu…
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Agora ao canto da janela
o perfil dela,
loiro, branco, estilizado,
tem o ar frio e recatado,
de quem não entendeu
aquilo que prometeu…
Judith Teixeira (1888-1959) Poemas a Tinta
Estoril-Junho
1922
Aqui dão mais detalhes:
Com o título "Quem se despiu na via pública, ontem, às 4 da tarde?", no Diário de Lisboa (4.5.75), Rogério Rodrigues conta a história de uma mulher "de que não se conhecia o nome", que ontem, às quatro da tarde, fazia strip-tease enquanto dançava, ao centro do cruzamento da Avenida Miguel Bombarda com a Avenida 5 de Outubro."Visivelmente surpreendidos, alguns espectadores da cena, invulgar em ruas de Lisboa, dirigiram-se para a mulher no intento de a proteger das vistas de quem passava e de quem parava, persuadi-la a vestir-se e abandonar o local. No meio da confusão, surge o repórter António Capela, que começa a disparar. Os populares, indignados com o que consideram 'uma baixeza moral', investem sobre ele, insultam-no, empurram-no, agridem-no e só a intervenção do proprietário da drogaria vizinha impede que não lhe partam a máquina. (...) Entretanto a mulher tinha sido levada para o limiar de um prédio com porteira à porta. Já vestida, olhava apática para as pessoas que a rodeavam. Dizem-me que se chamava Maria Teresa. 'Não sou Maria. Não sou Teresa. Tenho muitos nomes.' Tinha os lábios encortiçados e recusava o copo de água que lhe ofereciam.""Quem se despiu na via pública, ontem, às 4 da tarde?". interroga-se o jornalista. que passa a contar o percurso de vida, entretanto averiguado, de uma mulher de 41 anos, divorciada, sucessivamente actriz de revista, emigrante no Brasil, cantora de fado e que agora, no intervalo de tratamentos no Júlio de Matos, "mudava discos no pick-up" de uma boite em Benfica.Usava o nome de Teresa Torga "porque há um escritor que se chama assim" e ela gostava muito de ler, conta uma vizinha. A última vez que o repórter a viu seguia ela num carro da polícia para a esquadra do Matadouro. Zeca Afonso lê a crónica, magnífica, põe-lhe notas e voz, e imortaliza-a.
(in "Os dias loucos do PREC" de Adelino Gomes e José Pedro Castanheira. Ed. Expresso/ Público, 2006).
E aqui explicam um pouco mais e podes ouvir algumas músicas cantadas pela Teresa Torga.
José Afonso - «Teresa Torga»
Letra e música: Zeca Afonso in «Com as minhas tamanquinhas»
No centro da Avenida
No cruzamento da rua
Às quatro em ponto perdida
Dançava uma mulher nua
A gente que via a cena
Correu para junto dela
No intuito de vesti-la
Mas surge António Capela
Que aproveitando a barbuda
Só pensa em fotografá-la
Mulher na democracia
Não é biombo de sala
Dizem que se chama Teresa
Seu nome é Teresa Torga
Muda o pick-up em Benfica
Atura a malta da borga
Aluga quartos de casa
Mas já foi primeira estrela
Agora é modelo à força
Que a diga António Capela
T'resa Torga T'resa Torga
Vencida numa fornalha
Não há bandeira sem luta
Não há luta sem batalha
"Fiz aquela estrada na madrugada fria, umas vezes molhada, a estrada vazia a acelerar por ali fora, minutos, pouco menos, pouco mais, gente que concorria comigo nas faixas da vida paralela a caminho de qualquer lugar, mas eu arrancado da cama, cama onde me apetecia estar, onde queria ficar, quente, contigo, com o teu corpo atirado para cima do meu, e sempre havia calor, como havia calor, e eu queria tanto ficar, queria tanto estar, e arrancávamo-nos um do outro, os dois do leito, olhando os ponteiros do relógio, a luz a quebrar a escuridão em dois, a entrar pela janela e deixar distinguir o contorno da roupa tão depressa despida horas antes, e eu a lançar-me num beijo teu e num abraço triste, de que não vás, que fiques, que te quero aqui, que quero ver o sol forte, mais forte que esta luz ténue, quero recebê-lo contigo, e triste vias-me partir, e triste partia eu, e fiz aquela estrada na madrugada fria, na madrugada molhada, os quilómetros vazios, e suponho que tu te preparavas para o dia nascente com a saudade vertida na roupa já fria.
“Das traseiras da tua casa deitas uma escada e por fim, vens ter a mim, vens ter a mim, e eu qual Romeu digo-te sim, dou-te amor quem mo quer dar a mim?
Tenho os meus armários cheios de cartas a dizer I love you, que eu só quero alguém como tu, vem por-me a nu, vem por-me a nu. Queria amor e amor deste tu.”
(contém excertos de Linha das Fronteiras, dos Trovante)"
Todos procuramos certezas no Amor, sem percebermos que são elas o seu fim. Um Amor a sério vive sempre da dúvida e da insegurança, do receio e da saudade. Por mais que se tenha de um Amor nunca é suficiente. A insuficiência e a insegurança, como duas irmãs gémeas, andam sempre de mão dada.
Pedir a quem se Ama que dê mais é a mesma coisa que pedir a um rio que mude o seu curso natural. Não se faz nem leva a lado nenhum. Para viver bem com um Amor é preciso viver bem com o insuficiente.
Mal do Amor quando é suficiente, quando um dos apaixonados diz para si mesmo que já chega. Todos procuramos certezas no Amor, é verdade. Eu procuro-as na insuficiência, porque é dela que vivo.
Pede-me o que quiseres e dar-te-ei o que puder.
Façamos tudo o que melhor nos aprouver.
Consensualmente unidos pelo prazer.
Ousemos sonhar sem que os transformemos em pesadelos.
De forma controlada, descontrolemo-nos.
Hoje sonhei contigo... com o teu cheiro másculo e o teu sabor doce. Com a tua voz forte e o teu toque meigo. Com o teu desejo selvagem e a tua carícia reconfortante.
Hoje sonhei contigo... ouvi o teu riso contagiante e deixei que lesses a mágoa no meu olhar. Apreciei cada centímetro do teu corpo e deixei que usasses o meu. Fodemos com urgência para depois nos amarmos de forma lascivamente prolongada. Chupámos o sexo tentando soprar a alma. Demos início à tempestade que nos levou à calmaria.
Hoje sonhei contigo... e foi como um regresso a casa: tranquilo mas nervoso; desejado mas não esperado; sentido mas distante.
Hoje sonhei contigo... e foi apenas isso: um sonho...