31 maio 2015

Andy Warhol - «Kiss» (1963)

54 minutos e 23 segundos de casais a beijarem-se na boca

Luís Gaspar lê «O Beijo» de Paul Éluard


Ainda toda quente da roupa tirada
Fechas os olhos e moves-te
Como se move um canto que nasce
Vagamente mas em toda a parte

Perfumada e saborosa
Ultrapassas sem te perder
As fronteiras do teu corpo

Passaste por cima do tempo
Eis-te uma nova mulher
Revelada até ao infinito.

(Tradução de Egito Gonçalves)

Paul Éluard
Paul Éluard foi um poeta francês, autor de poemas contra o nazismo que circularam clandestinamente durante a Segunda Guerra Mundial. Participou no movimento dadaísta, foi um dos pilares do surrealismo.
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

Com uma volta na ponta


Valha a verdade que ele é bom numa coisa: a penetrar-me como se não houvesse amanhã e esse fosse o seu único objectivo de vida. É daquelas recordações que me intumescem e humedecem mas aceitar um ex de volta parece-me um resto de comida requentada no microondas e creio piamente que ele só quer regressar para entrar por mim adentro.

Não me esqueço da seca da canja de galinha refeição sim, refeição não nem das noitadas pelas discotecas que se até são uma coisa pela qual me pelo e que me dão vontade de despir todinha depois metiam pelo cano toda a intimidade com o séquito que ele carregava para todo o lado como se para ser homem não lhe bastasse estar comigo e precisasse de umas quantas cabeças de cães de carro dos anos sessenta a acenar à velocidade do condutor. Já para não falar que tive de contratar mais cozinheiras para estar sempre uma de serviço a qualquer hora e um gajo a tempo inteiro para tratar da piscina que até valia o dinheiro que lhe pagava por mor de bem me lavar as vistas com aquele torso nu de inverno ou de verão de uma musculatura segura de vinte e tais aninhos. Uma tenrura que fazia salivar o palato de qualquer uma.

Ora como sou prática, vou antes ser accionista da farmácia por via da compra de preservativos de todas as cores e sabores e deixo-o reaparecer mas apenas em unidose.

Pau liteiro


Fui buscar-lhe uma bebida e chamou-me pau mandado. Mal ela sabia que depois de a levar a casa eu seria um pau-mamado.

Patife
@FF_Patife no Twitter

30 maio 2015

Postalinhos da Turquia - 7

"Mesa e bancos de um dos refeitórios de um complexo monástico escavado na rocha («tufo») na Capadócia, agora Museu ao Ar Livre de Göreme, que faz parte da lista de Património Mundial da UNESCO desde 1984. A forma da mesa parece-me... familiar..."
Paulo M.

«As palavras que ele nunca disse» - por Rui Felício

Queimavam-lhe a boca, afloravam-lhe aos lábios, mas no último instante retraía-se, engolia-as. Mil vezes as tinha ensaiado, outras tantas as tinha ocultado. Tímido, perdia-se em conjecturas, adiava sempre o momento de as proferir, enganando-se a si próprio sobre as circunstâncias ideais para o fazer. Inseguro, receava que, ao dizê-las, fosse alvo do escárnio daquela a quem as queria oferecer. Desconfiava das certezas aparentes que todos os sinais lhe indiciavam e que o aconselhavam a decidir-se. Porque lhe tinham ensinado que a certeza absoluta depende da verificação de todas as premissas como hipótese condicional. Bastaria o antagonismo de uma única premissa desconhecida dele, para que a certeza absoluta aparente, que os indícios lhe pareciam garantir, se desvanecesse.
Os anos passaram. Muitos, muitos anos…
Essa aflitiva obsessão foi-se esbatendo com o tempo, gravada num lugar remoto do cérebro, de onde cada vez mais raramente saía. Por instantes breves, como fogacho etéreo, incaracterístico, suave, rápido, como página de um livro que teimosamente se abre sempre nessa mesma folha.
Questionava-se, sempre que isso acontecia, sobre se algum dia as devia ter dito. A razão dizia-lhe que tinha feito bem em as ocultar, o coração dizia-lhe o contrário. A realidade mostrava-lhe que o tempo já tudo tinha curado, que não era altura de manter tais recordações.
Nunca mais se tinham encontrado. Nada sabiam da vida um do outro. Décadas de separação eram o cimento que fechava as suas vidas como túmulos.
Mas inesperadamente encontraram-se.
Ele ficou a saber então que ela todos os dias tinha esperado por essas palavras.
Mas não era agora o momento para serem ditas. Tornavam-se desnecessárias…
Porque, afinal, ambos as conheciam. Desde sempre!

Rui Felício
Blog Encontro de Gerações
Blog Escrito e Lido

«O meu amante de domingo» de Alexandra Lucas Coelho

Um livro delicioso, que recomendo e poderão eventualmente ainda encontrar à venda.
É o nº 1786 da minha colecção.

Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)


Um sábado qualquer... - «Direitos iguais»



Um sábado qualquer...