Sentados no confortável sofá, uma luz tépida projectava as suas sombras, o Pedro com um copo na mão, a Inês reclinada, a blusa meio aberta, a perna esquerda dobrada sob a direita, conversavam…
Discorriam sobre os mais variados assuntos, sem que aparentemente houvesse entre eles nenhuma conexão. Eram palavras, simples palavras, que escondiam o pensamento comum.
Os olhares, os movimentos dos corpos, os gestos, iam, a pouco e pouco, denunciando esse pensamento e disfarçando os desejos cada vez menos ocultos que lhes toldavam a compostura.
A conversa decorria, mas já acompanhada pelo toque falsamente casual das mãos, pela profundidade dos olhares, pela irreprimível aproximação dos corpos.
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«Érostrato - Rito teatral»
de Pedro Barbosa
Centelha, colecção Teatro, 1983
da colecção de arte erótica «a funda São» |
Ela deixou-se escorregar no sofá, distendeu-se, abriu os braços num convite. Ele aproximou-se, abraçou-a, beijou-lhe os lábios, primeiro de forma suave, depois com crescente sofreguidão.
O diálogo mantinha-se, agora com as vozes roucas, entrecortadas com gemidos e juras de amor, traduzindo o visível prazer que ambos estavam a sentir.
Protegida pela escuridão, a Sónia, a mulher do Pedro, assistia a tudo, calada, sem que ninguém o soubesse.
Sem ciúme, pelo contrário, sentia-se estranhamente orgulhosa, admirando a forma perfeita como o Pedro se estava a desempenhar.
Apetecia-lhe gritar que ele era o seu marido, que aquele era o homem mais sensual e meigo do mundo, que sabia fazer feliz qualquer mulher, e que era assim que a amava a ela própria todas as noites.
Quando a cortina se fechou e as luzes cruas da plateia se acenderam, a Sónia foi a primeira a gritar “Bravo!“ , juntando os seus aplausos aos dos restantes espectadores do Teatro da Trindade que tinham presenciado a versão moderna da peça “Pedro e Inês”.
Rui Felício
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