18 janeiro 2016

Compilação de anúncios censurados da Doritos

«No fim ganha alguém?» - João

"Acordei num mar de destroços e estilhaços em terra. Como se tudo fosse mentira, o futuro um buraco e o passado uma negação, como se tivesse sido joguete ou arremesso, como se todas as palavras tivessem jorrado da boca apenas para quebrar um silêncio incómodo, sem nelas haver qualquer significado, como se fossem vazias de tudo, desligadas dos momentos e dos gestos quando se diziam, como se a falsidade cobrisse, como manto pesado, todo o espaço onde estou, onde estive, onde tenho estado.

Acordo envolto em tristeza. Escura, dura e pesada, como se tivesse sido cilindrado, como se nunca tivesse nascido nem cruzado as mesmas ruas, aquecido os mesmos espaços, como se nunca tivesse fugido na noite e na chuva, com um iogurte e um pacote de bolachas para me aconchegar o estômago de todas as horas de cansaço. Como se a mentira fosse a tua face. Como se o vazio fosse o teu corpo. Como se o chão fosse tapete voador num tornado.

E embora eu recuse acreditar nisso, embora recuse aceitar tudo o que acorda comigo nesta manhã, embora não reconheça os destroços e estilhaços, é o que vejo, é o que me mostram, e o caminho tem de ser o meu, por mim e para mim, como ontem, como sempre. Varrendo devagar, até à tempestade seguinte. Vigiando. Como eterno castigo."

João
Geografia das Curvas

Tenho que comprar um puxador de porta destes!


Via mon ami Bernard Perroud

Fartura... farta...

Crica para veres toda a história
Abundância


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17 janeiro 2016

Sacrilégio! Sacrilégio! Sacrilégio!...



Uma sugestão de Carlos M.M.M. na página da São Rosas no Facebook

«respostas a perguntas inexistentes (321)» - bagaço amarelo

Parei em cima duma das pontes do canal do Côjo. O trânsito de moliceiros repletos de turistas era intenso, pelo menos para aquilo que, como aveirense, estou habituado a ver durante os meses mais frios. Dois rapazes com skates passaram por mim e, pelo canto do olho, tentaram perceber o que eu estava fazer. Estava a filmar, tão simples quanto isso. A filmar sem nenhum objectivo concreto, mas apenas pelo gozo que filmar me dá. Viram a minha Gopro em cima dum pequeno relógio de cozinha, sorriram, e continuaram o seu caminho.
Para além dos turistas nos barcos, alguns transeuntes caminhavam calmamente nas margens do canal. Dali de cima, era como se todos estivessem num silêncio próprio de quem se encontra em paz. Duas mulheres de mãos dadas pararam alguns segundos para observar um grupo de patos que, na esperança de obter comida, se aproximou delas a furar esse silêncio. Reparei então como a minha mão já não segura a mão de ninguém há algumas semanas. Fechei o punho e abri-o novamente, coloquei a câmara na ponte e comecei a filmar.
Ando com uma estranha sensação de solidão, porque apesar de a sentir sou eu próprio que a alimento. Não me apetece estar com muitas pessoas em simultâneo. Na verdade, para ser sincero, nem sequer há muitas pessoas com quem me apeteça estar. Por isso mesmo é que sorri quando as duas mulheres passaram por mim, ainda de mãos dadas, e as ouvi discutir. Eram namoradas e estavam zangadas, mas mesmo assim davam as mãos.
A uma certa distância, tudo nos parece pacífico, mas quando nos aproximamos e percebemos os detalhes, percebemos também que a paz é uma utopia. Acho que tive este pensamento pela segunda vez na vida. A primeira vez foi em criança, quando vi uma fotografia do planeta Terra num Atlas. Era bonita, mas ali na rua onde eu vivia havia uma série de problemas que eu conhecia melhor do que os astronautas que tinham tirado aquela foto. Mais tarde vim a descobrir que o Amor também é assim: bonito por fora, eventualmente cruel nos seus detalhes.
De todas as pessoas que conheço, existe uma (ou três, vá lá) com quem me vai apetecendo estar. É uma amiga a quem nunca dou a mão, mas de quem recebo tudo o que há para receber duma amiga. Estava a pensar nela quando lhe ouvi a voz e, por um segundo, um detalhe nesse mundo que eu vi num Atlas há muitos anos atrás me pareceu perfeito.

- Como estás? - Perguntou.
- Mal. Bebes uma cerveja comigo?

Nessa tarde, ela foi o meu detalhe. É dos detalhes que nós dependemos, não da fotografia do Atlas. Talvez seja por isso que eu gosto de filmar.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Postal das cartas de amor


Nunca escrevi cartas de amor ridículas.
Porque sempre guardei as palavras no fundo de mim, até a digestão as processar.