21 setembro 2016

Cu idado!

«as fracas luzes da cidade indicar-me-ão o caminho» - bagaço amarelo

Os candeeiros públicos parecem ter frio. É a sensação que tenho quando reparo na forma como a luz de cada um se encolhe na escuridão da noite. Não iluminam quase nada, mas fazem-se notar como se fossem pequenos pirilampos envergonhados.É por isso que tenho a sensação de estar numa cidade fantasma, onde as pessoas já se foram deitar e fiquei apenas eu, sentado numa paragem de autocarro a tentar perceber como se movem as sombras.
Entre mim e a Lua há dois números vermelhos a desafiar a noite. Um nove e um doze. Faltam doze minutos para o autocarro da linha nove chegar. É isso. Não é a linha que me pode levar ao pequeno e velho rés do chão onde vivo, mas optei por passar na casa duma mulher que não está na cidade.
É claro que, se não está, não a vou poder ver. Ainda assim, conto que a viagem me traga uma certa normalidade. É um trajecto que já fiz várias vezes a esta hora para ir ter com ela, por isso optei por fazê-lo mais uma vez. Distraio-me sempre com as luzes enfraquecidas e pergunto-me o que é que estão ali a fazer. Às vezes lembro-me da cidade de Londres num tempo em que eu não vivi, e de funcionários municipais a acenderem todas as noites os candeeiros a petróleo que iluminaram, por exemplo, os crimes de Jack O Estripador. Talvez os tenha visto num filme qualquer e nunca mais me esqueci.
Uma das sombras da cidade senta-se ao meu lado. Também está só e, mesmo que não a possa ver, percebo que é duma mulher que aperta as golas do casaco numa vã tentativa de se aquecer. Sentou-se exageradamente perto de mim e posso ouvi-la respirar. Talvez tenha medo de estar sozinha e partiu do princípio que eu, por estar à espera de um autocarro, não seja alguém perigoso como foi Jack. Procura, também ela, alguma normalidade. Gostava de lhe perguntar se alguma vez viu um filme em que homens acendem candeeiros a petróleo nas ruas de Londres, mas seria tão bizarro que não o faço.
Para ela, também eu sou apenas uma sombra. Talvez por isso me pergunte agora qualquer coisa que eu não consigo entender. Não falo búlgaro, digo-lhe. Ela cala-se. Provavelmente só queria ouvir a minha voz. Eu, pelo menos, fiquei contente por ouvir a dela.
Tenho a certeza que é bonita. Imagino-a magra, com a pele exageradamente branca e o nariz de cerâmica a ameaçar partir-se. Os lábios marcados pelo frio e alguns sinais no queixo. Talvez tenha o cabelo pintado de ruivo e olhos pretos.
O som característico do autocarro ouve-se no fundo da noite. Os faróis aproximam-se devagar como se fossem de um animal qualquer que, de tão cansado que está, pára mesmo à nossa frente respirando de forma sôfrega. Vem vazio.
Olho uma última vez para a Lua. Tenho a certeza que esteve a ler os meus pensamentos. A mulher senta-se duas filas à minha frente e vira-se durante dois segundos para me ver. Não é nada do que eu imaginei. Muito provavelmente eu também não sou nada do que ela imaginou.
Encosto a cabeça ao vidro da janela como se quisesse ouvir algum segredo vindo lá de fora. Daqui a nada saio num bairro dos subúrbios, olho para as janelas fechadas de um apartamento que pertence a uma mulher que não está e depois faço cerca de três quilómetros a pé até minha casa. As fracas luzes da cidade indicar-me-ão o caminho. Não era preciso, mas é esta a minha normalidade.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Lá vais tu

Lá vais tu para os teus trilhos feitos por ondas. Atrás, a sólida rocha que te ampara e que tens segura. À frente, a liberdade, o carinho da espuma das ondas, a liberdade da linha do horizonte que tão acessível como o fim do arco-íris...
Tens as feições queimadas do sol, tens amor nos olhos e as retinas dilatadas.
Cada passo, cada milímetro da tua prancha conta uma história, uma história que tu quiseste viver, que viveste ou que um dia viverás... Tens vontades, nota-se na garra com que te jogas para o oceano, tens momentos em que amas a vida, amas tudo, amas. Amar é tão bom... És amado, és tu, és ele, és aquele!
ou aqui

Até podia ser um par de aquecedores!


20 setembro 2016

Vitalic - «Second Lives (uncensored official)»

Temos que ser uns para os outros

"Queria avisar que não sigo miúdas cuja foto de perfil mostre mais pele que roupa. Nada contra, apenas não estou interessada em pele alheia."
Sophie
‏@Mammyeu

Aproveito para avisar que antes pelo contrário.

Sharkinho
@sharkinho no Twitter

«Projeto Mulheres» - Carol Rossetti - 56

O livro «Mulheres - retratos de respeito, amor-próprio, direitos e dignidade», de Carol Rossetti, está em venda em Portugal, editado pela Saída de Emergência.







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«A literatura portuguesa é má na cama?» - Nuno Saraiva

Ilustração de Nuno Saraiva para a capa da revista «Ípsilon» do jornal «Público» de 12 de Fevereiro de 2010.
Reprodução 1/10 assinada e com dedicatória do autor: "Para o Paulo Moura, um grande abraço do Nuno Saraiva".
Um mimo (premiado) na minha colecção.
















A colecção de arte erótica «a funda São» tem:
> 1.900 livros das temáticas do erotismo e da sexualidade, desde o ano de 1664 até aos nossos dias;
> 4.000 objectos diversos (quadros a óleo e acrílico, desenhos originais, gravuras, jogos, mecanismos e segredos, brinquedos, publicidade, artesanato, peças de design, selos, moedas, postais, calendários, antiguidades, estatuetas em diversos materiais e de diversas proveniências, etc.);
> muitas ideias para actividades complementares, loja e merchandising...

... procura parceiro [M/F]

Quem quiser investir neste projecto, pode contactar-me.

Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)

19 setembro 2016

«Por amor a las tetas» - divulgação do video publicitário

Campanha realizada no Chile, contra o cancro da mama.


Por Amor a las Tetas from Por Amor a las Tetas on Vimeo.

Postalinho de Budapeste (1 de 4)

"Budapeste, capital da Hungria, é célebre pelas suas termas.
Mas também deveria ser célebre pelas belas mulheres que proliferam em estátuas e altos relevos de muitos monumentos e edifícios.
Na porta de entrada das termas do hotel Gellert, na zona de Buda, estão vários homens e mulheres a receber-nos. Eles cobertos de tecido, elas descobertas..."


"... mas... aquele senhor da direita... está com ar comprometido... e onde tem ele metido o braço direito?!..."


"... Ah! Já percebi o olhar dela!"
Paulo M.



Arte táctil

Maus em sexo

Crica para veres toda a história
Pós de fada


1 página

18 setembro 2016

Luís Gaspar lê «Esforça meu coração…» de Jorge Aguiar

Português moderno

Esforça meu coração,
não te mates, se quiseres:
lembra-te que são mulheres.

Lembra-te qu’está por nascer
uma que não errasse;
lembra-te que seu prazer,
por bondade e merecer,
não vi quem dele gostasse.
Pois não te dês a paixão,
toma prazer, se puderes
lembra-te que são mulheres.

Descansa, triste, descansa,
que seus males são vinganças;
tuas lágrimas amansa,
deix’ as suas esperanças;
porque, pois nascem sem razão,
nunca por ela lh’ esperes;
lembra-te que são mulheres.

Tuas mui grandes firmezas,
tuas grandes perdições,
suas desleais naturezas
causaram tuas tristezas,
Pois não te mates em vão,
que, quanto mais as quiseres,
lembra-te que são mulheres.

Que te presta padecer,
que t’ aproveita chorar,
pois nunc’ outras hão de ser,
nem são nunca de mudar?
Deixa-as com sua natureza,
seu amor nunca lho esperes:
lembra-te que são mulheres.

Não te mates cruamente
por quem fez tão grande falta,
que quem de si não sente,
por ti não lhe dará nada.
Vive, lançando pregão
por onde fores e vieres
que são mulheres, mulheres!

Português antigo

Esforça meu coraçam,
nom te mates, se quiseres:
lembre-te que sam mulheres.

Lembre-te qu’é por nacer
nenhua que nam errasse;
lembre-te que seu prazer,
por bondade e merecer,
nam vi quem dele gostasse.
Pois nam te dês a paixam,
toma prazer, se puderes
lembre-te que sam mulheres.

Descansa, triste, descansa,
que seus males sam vinganças;
tuas lágrimas amansa,
leix’ as suas esperanças;
ca, pois nacem sem rezam,
nunca por ela lh’ esperes;
lembre-te que sam mulheres.

Tuas mui grandes firmezas,
tuas grandes perdições,
suas desleais nações
causaram tuas tristezas,
Pois nam te mates em vão,
que, quanto mais as quiseres,
verás que sam as mulheres.

Que te presta padecer,
que t’ aproveita chorar,
pois nunc’ outras ham de ser,
nem sam nunca de mudar?
Deyx’ as com sua naçam,
seu bem nunca lho esperes:
lembre-te que sam mulheres.

Nam te mates cruamente
por quem fêz tam grande errada,
que quem de si nam sente,
por ti nam lhe dará nada.
Vive, lançando pregam
por u fores e vieres
que sam molheres, mulheres!

Jorge Aguiar
Alcaide-mor da fortaleza de Zagala, por carta de nomeação de 14/03/1478, Jorge de Aguiar foi capitão de uma armada que partiu para a Índia, em 1508, e se perdeu nas ilhas Tristão da Cunha. Teófilo Braga, di-lo filho de Pedro de Aguiar e de Mécia Sequeira, ama da princesa Joana (filha de D. Afonso VI, e marido de D. Violante de Vasconcelos, filha de João Rodrigues de Vasconcelos. Jorge de Aguiar participa no “Processo do Cuidar e Suspirar” que abre o Cancioneiro de Resende, alinhando nas fileiras a favor do “Cuidar”.
Este poema faz parte do iBook “Coletânea da Poesia Portuguesa – I Vol. Poesia Medieval”
disponível no iTunes.
Transcrição do Português antigo para o moderno de Deana Barroqueiro.

Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa