No começo do amor, quando as cidades
nos eram desconhecidas, de que nos serviria
a certeza da morte se podíamos correr
de ponta a ponta a veia eléctrica da noite
e acabar na praia a comer morangos
ao amanhecer? Diziam-nos que tínhamos
a vida inteira pela frente. Mas, amigos,
como pudemos pensar que seria assim
para sempre? Ou que a música e o desejo
nos conduziriam de estação em estação
até ao pleno futuro que julgávamos
merecer? Afinal, o futuro era isto.
Não estamos mais sábios, não temos
melhores razões. Na viagem necessária
para o escuro, o amor é um passageiro
ocasional e difícil. E a partir de certa altura
todas as cidades se parecem.
António Manuel Pires Cabral nasceu em Chacim, Macedo de Cavaleiros, em 1941. Licenciou-se em Filologia Germânica. É conhecido sobretudo como ficcionista e poeta. Na área da ficção, publicou até ao momento oito livros de contos e seis romances. Tem textos traduzidos para alemão, castelhano, catalão, eslovaco, francês, húngaro, inglês e italiano.
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa
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