14 dezembro 2021

Luís Gaspar lê um poema sem título de Nadine Stair


Se pudesse voltar a viver a minha vida,
da próxima vez gostava de fazer mais erros.
Descontraía. Fazia mais disparates.
Levaria menos coisas a sério.
Corria mais riscos. Acreditava mais.
Subia mais montanhas e nadava em mais rios.
Convidava os amigos mesmo que tivesse nódoas
na carpete.
Usava a vela em forma de rosa antes de ela se
estragar no armário,
Sentava-me na relva com os meus filhos
sem me preocupar com as manchas verdes na roupa.
Tinha rido e chorado menos em frente da televisão
e mais em frente da vida.
Tinha contado mais anedotas e visto
o lado cómico das coisas.
Tinha descoberto menos dramas em cada esquina,
e inventado mais aventuras.
Se calhar, tinha mais problemas reais,
mas menos problemas imaginários.
É que, sabem, sou uma dessas pessoas que vive
com sensibilidade e sanidade hora após hora,
dia após dia.
Oh, tive os meus momentos,
e se pudesse fazer tudo de novo, outra vez,
tinha muitos mais.
De facto, não tentaria mais nada.
Apenas momentos, uns após outros,
em vez de viver tantos anos à frente de cada dia.
Fui uma dessas pessoas que nunca foi a lado nenhum
sem um termómetro, botija de água quente, casaco para
a chuva e pára-quedas.
Se pudesse fazer tudo outra vez, viajava mais leve do que viajei.
Se tivesse a minha vida para viver de novo,
começava mais cedo a andar descalça na Primavera,
e ficava sempre assim, mesmo mais tarde, no Outono.
Ia a mais bailes.
Cantava muitas mais canções.
Diria muitos mais «amo-te» e «desculpa».
E apanharia mais papoilas.

Nadine Stair

Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

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