15 fevereiro 2022

Luís Gaspar lê «Poema lido pelo poeta em Nápoles» de Casimiro de Brito


Ama-me, diz ela, crucifica-me
de amor. No chão da cama a crucifico.
Deito-a de costas, abro-lhe os braços
e prego-a até eu próprio desfalecer. Na boca
a prego, nas mãos a prego e ela agita-se
e ela sorri e ela chora e as suas lágrimas
confundem-se com a sua saliva. E ela começa
a mastigar-me. E depois
viro o seu corpo e prego-a ao centro
e então é ela que, pregada,
me devora e concilia com a Via Láctea
que a ambos submerge. E depois
deita-se de bruços e pede-me
que a sacrifique um pouco mais, na sua flor
sombria, mas eu já não tenho forças e então
sou eu quem, humildemente, se deixa
crucificar.

Casimiro de Brito
Casimiro Cavaco Correia de Brito (Loulé - Algarve, 14 de Fevereiro de 1938) é um poeta, ensaísta e ficcionista português.

Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

2 comentários:

  1. Invejo os poetas!
    Invejo a sua capacidade de ver para além daquilo que vemos.
    Invejo a forma como nos falam, da vida, da paixão, do amor, do sexo!
    às vezes até invejo a forma como nos falam da morte...
    Invejo os poetas...
    Um beijo

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Uma por dia tira a azia