19 março 2023

«Nunca me ocultes» - António F. de Pina

Nunca me ocultes as fontes do teu riso
De onde brotam filamentos de ternura
Nem teças sonhos que escureçam ou denigram
As incandescentes madrugadas que são minhas.
Nunca me ocultes a carícia da nascente
No caudal aveludado dos teus dedos
Não me peças névoas nem penumbras
Nem silêncios nem destinos. Só poemas.
Nunca me ocultes o murmúrio ou o som
Que trazes desprendido em cada beijo.
Diz-me apenas no rubro do desejo
Diz-me apenas: "Meu amor estou aqui!"

Nunca me ocultes o teu claro e terno olhar
Nem a serena refulgência do teu rosto.
Não me ocultes o som macio do mar
Que trazes humedecido no teu peito.
Não me segredes palavras cruas de dor.
Só aquelas que amanhecem os conceitos.
Não me ocultes os passos da tua noite
Nem o súbito luar da lua cheia
E não me perguntes para onde eu vou
Nem contes os meus passos indecisos.
Diz-me apenas com sentidos mais precisos
Diz-me apenas: "Meu amor estou aqui!"

«O silêncio e o gume da palavra», 2022
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