Os meus braços envolvendo-te o pescoço (és mais alto do que me tinha parecido), os teus braços enlaçando-me a cintura. As mãos tornadas exploradoras de um território que não sabíamos por explorar.
Sinto-te respirar no meu pescoço e gosto. Ouço-te a voz, falas baixinho, e parece-me que nunca te tinha ouvido antes. Sinto-te a carne firme, o ventre liso, os braços de músculos retesados que me cingem a ti. Abro os olhos e vejo-te enquanto me beijas, de olhos fechados. Estás ali. Estás naquele beijo. Estás ali, indiferente ao que nos rodeia. Estás todo ali, sem artifícios, sem mais jogos, sem outra fantasia que não a de estarmos os dois enlaçados, envolvidos.
Sinto-te o desejo na massa dura que agarro sobre as tuas calças. Estou a descobrir-te. Como tu a mim quando me desapertas o cinto, depois o botão, depois corres o fecho das calças e finalmente fazes entrar a tua mão em mim e então és tu que sentes o meu desejo.
Quero-te a ti, que estás ali, nesse momento a ninguém mais, nesse momento és tu, e tu já não és o amigo de anos, mais de uma dezena, o amigo dos jogos, das confissões, das confidências, dos cigarros. Mas és o dos risos, afastamos as bocas para nos rirmos, alegres como crianças que descobriram um pequeno tesouro no quintal, sem culpas, sem recriminações, sem razão que nos atrapalhe.
Olho-te de soslaio no vidro do quadro que nos reflecte. Fodes-me de olhos fechados, primeiro. Depois abriste-os, olhaste-me como quem vê de fora, sem saberes que te via reflectido, que te olhava também eu, que me parecias outro, transfigurado pelo desejo, tu, cujo sabor fiquei a conhecer, depois de te ter conhecido a ti.
Anos e anos, mais de uma dezena, e de repente somos outros e não chegamos a pensar que andámos a perder tempo, porque não andámos; é por causa desse tempo que não perdemos que agora usufruimos deste, que ganhamos, que ganhámos.