05 abril 2010
Maria (By: Anzio Lìthica)
Maria
costurava o seu vestido
de silêncio o tecia
para o ajustar à cintura
e oferecer ao marido
como se dá uma mulher pura.
Maria
vestido de noiva branco
de saudade o vestia
em tecido de fim de pranto
que o noivo chegaria
para quebrar o seu desencanto.
Maria
o vestido envelheceu
tecido de rugas nas linhas
fios do tempo que amareleceu
o branco e entristeceu
botões de virgens princesinhas.
costurava o seu vestido
de silêncio o tecia
para o ajustar à cintura
e oferecer ao marido
como se dá uma mulher pura.
Maria
vestido de noiva branco
de saudade o vestia
em tecido de fim de pranto
que o noivo chegaria
para quebrar o seu desencanto.
Maria
o vestido envelheceu
tecido de rugas nas linhas
fios do tempo que amareleceu
o branco e entristeceu
botões de virgens princesinhas.
Crimen Sollicitationis
Já é quase como bater no ceguinho, algo que a instituição visada jamais admitiria no âmbito dos seus princípios e valores sagrados, falar deste assunto foleiro mas depois da tirada do pregador do Papa, outro infeliz, comparando as críticas à postura da Igreja Católica quanto à pedofilia praticada por (demasiados) sacerdotes dos seus, sobra pouca boa vontade para com o esterco que começa a brotar das frinchas bafientas de uma organização que neste particular se tem comportado como uma seita.
Os padres não são todos pedófilos (bastaria haver um para o cerco se apertar, mas enfim...), nem a Igreja Católica Apostólica Romana entendeu abraçar apenas este último termo e dedicar-se ao deboche dos tempos do Calígula. No entanto, se o nojo inevitável pela revelação dos casos de pedofilia associados à Igreja deveria silenciar muitos fiéis que de repente ignoram prioridades e abrem a boca para saírem em defesa de pedófilos cobardes em vez de forçarem uma mudança radical no seio da instituição que acabe de vez com os silêncios cúmplices, a proliferação quase mundial dos factos em causa acaba por manchar a Igreja no seu todo pela forma atabalhoada como lida com a situação.
E não é de fé que estou a falar, pois mesmo sendo agnóstico entendo que Deus e os homens pouco ou nada têm em comum e a Igreja, como se vê, é composta de gente boa e de enviados do demo capazes daquilo que agora se vai sabendo e que a própria Igreja, encurralada, engasga e não só não oferece a outra face como ainda mostra não resistir à tentação de evitar perdê-la.
As críticas chovem de todo o lado e ninguém poderia esperar outra reacção perante a imensa desilusão que a soma de casos mais a prova dos seus abafos misericordiosos provoca nos fiéis capazes de distinguirem o trigo do joio e mesmo entre os agnósticos que defendem a instituição com base no valor inquestionável da sua acção social. Uma organização religiosa tem mesmo, como um tribunal, que estar acima de qualquer suspeita. Tal como na Justiça, outro bastião da virtude, é estatisticamente possível que surjam ovelhas tresmalhadas do rebanho.
Mas o problema maior nem é essa eventualidade, mas sim a forma como os tais bastiões de virtude devem dar o exemplo no modo como lidam com a coisa. E a Igreja lidou mal. E está a lidar cada vez pior, abrindo espaço às reacções fundamentalistas dos seus detractores mais acérrimos como dos seus acólitos mais fanáticos.
A verdade é que qualquer mãe ou pai terão que olhar os clérigos a quem confiam os seus filhos com uma abordagem mais atenta e cautelosa. Ou estarão a fiar-se numa virgem ofendida mas pouco santa, considerando a demora na divulgação pública destes pecados mortais no seu seio e a mal explicada opção pelo abafar dos casos conhecidos e até denunciados desde há dezenas (fiquemos por aí...) de anos. Essa será a maior derrota sofrida pela Igreja Católica na sequência do seu desacerto neste assunto medonho, caso não consigam reparar os danos no futuro imediato: a perda de confiança generalizada na instituição.
E essa nunca nasce dos problemas mas da forma como estes se enfrentam.
Os padres não são todos pedófilos (bastaria haver um para o cerco se apertar, mas enfim...), nem a Igreja Católica Apostólica Romana entendeu abraçar apenas este último termo e dedicar-se ao deboche dos tempos do Calígula. No entanto, se o nojo inevitável pela revelação dos casos de pedofilia associados à Igreja deveria silenciar muitos fiéis que de repente ignoram prioridades e abrem a boca para saírem em defesa de pedófilos cobardes em vez de forçarem uma mudança radical no seio da instituição que acabe de vez com os silêncios cúmplices, a proliferação quase mundial dos factos em causa acaba por manchar a Igreja no seu todo pela forma atabalhoada como lida com a situação.
E não é de fé que estou a falar, pois mesmo sendo agnóstico entendo que Deus e os homens pouco ou nada têm em comum e a Igreja, como se vê, é composta de gente boa e de enviados do demo capazes daquilo que agora se vai sabendo e que a própria Igreja, encurralada, engasga e não só não oferece a outra face como ainda mostra não resistir à tentação de evitar perdê-la.
As críticas chovem de todo o lado e ninguém poderia esperar outra reacção perante a imensa desilusão que a soma de casos mais a prova dos seus abafos misericordiosos provoca nos fiéis capazes de distinguirem o trigo do joio e mesmo entre os agnósticos que defendem a instituição com base no valor inquestionável da sua acção social. Uma organização religiosa tem mesmo, como um tribunal, que estar acima de qualquer suspeita. Tal como na Justiça, outro bastião da virtude, é estatisticamente possível que surjam ovelhas tresmalhadas do rebanho.
Mas o problema maior nem é essa eventualidade, mas sim a forma como os tais bastiões de virtude devem dar o exemplo no modo como lidam com a coisa. E a Igreja lidou mal. E está a lidar cada vez pior, abrindo espaço às reacções fundamentalistas dos seus detractores mais acérrimos como dos seus acólitos mais fanáticos.
A verdade é que qualquer mãe ou pai terão que olhar os clérigos a quem confiam os seus filhos com uma abordagem mais atenta e cautelosa. Ou estarão a fiar-se numa virgem ofendida mas pouco santa, considerando a demora na divulgação pública destes pecados mortais no seu seio e a mal explicada opção pelo abafar dos casos conhecidos e até denunciados desde há dezenas (fiquemos por aí...) de anos. Essa será a maior derrota sofrida pela Igreja Católica na sequência do seu desacerto neste assunto medonho, caso não consigam reparar os danos no futuro imediato: a perda de confiança generalizada na instituição.
E essa nunca nasce dos problemas mas da forma como estes se enfrentam.
04 abril 2010
Regato
Quero que lances o fogo das mãos,
me incendeies sentidos
e labaredas;
quero que provoques
o gotejar contínuo do meu regato,
água, luz:
a tua imensa paixão.
Foto e poesia de Paula Raposo
Sal
A
Menina
Menina linda
Menina linda sem sal
água que arde é água salgada
dentro de ti só um jardim num aquário
A
face
de Outono
e nenhuma folha caída
no vazio do teu imaginário
faz do sorriso perfeito, perfeitamente banal.
Doce
a madrugada
de expressão tão amena
mas esse olhar lindo nunca será fatal,
Sabes, não se queda a madrugada seduzida
se reflecte o vazio do teu calendário
nas páginas brancas do teu diário;
cada dia que te folheamos igual.
É quase a beleza perdida
na perfeição inacabada
da menina linda
sem sal.
A
Menina
Menina tão linda
Mas uma namorada de seda
que na penugem macia não traz bem nem mal
é corpo de palavras perfeitas mas apenas vocabulário
lido com a emoção de quem lê um dicionário
A menina linda, tão linda
mas tão sem sal.
Menina linda
linda.
Sal.
Menina
Menina linda
Menina linda sem sal
água que arde é água salgada
dentro de ti só um jardim num aquário
A
face
de Outono
e nenhuma folha caída
no vazio do teu imaginário
faz do sorriso perfeito, perfeitamente banal.
Doce
a madrugada
de expressão tão amena
mas esse olhar lindo nunca será fatal,
Sabes, não se queda a madrugada seduzida
se reflecte o vazio do teu calendário
nas páginas brancas do teu diário;
cada dia que te folheamos igual.
É quase a beleza perdida
na perfeição inacabada
da menina linda
sem sal.
A
Menina
Menina tão linda
Mas uma namorada de seda
que na penugem macia não traz bem nem mal
é corpo de palavras perfeitas mas apenas vocabulário
lido com a emoção de quem lê um dicionário
A menina linda, tão linda
mas tão sem sal.
Menina linda
linda.
Sal.
03 abril 2010
Voltas trocadas
Teria preferido que a esbofeteasse. Mas não. Ele estendeu a mão e acariciou-lhe o rosto como nunca antes o fizera. E sorriu.
Desarmada, conseguiu suster a custo as lágrimas e entretanto apaixonou-se um pouco mais.
Desarmada, conseguiu suster a custo as lágrimas e entretanto apaixonou-se um pouco mais.
Boneca de plástico
Acordou de olhos azuis no tecto rosa. Chamou-os de volta por chamar, já sabia os dias de cor; quando os dias são iguais aos dias somos sempre cegos. Era um pouco desengonçada, mas o movimento diário de erguer o tronco formava sempre um perfeito ângulo recto. Na hora certa, subia como um ponteiro dos segundos até à hora certa, içada pelos fios do mundo. Afastou a cama de si. Endireitou com cuidado a perna direita e sentiu o frio do plástico nos dedos, embora os dedos fossem igualmente frios; era por isso que raramente gostava de tocar nos humanos, não gostava que pensassem que estava morta, como eles; só os que a aqueciam primeiro lhe podiam tocar. Tomou banho sem sentir a água. Vestiu-se sem sentir a roupa. Usou os dedos para puxar os cantos dos lábios em direcção às orelhas e acenou um até logo ao amante semi-adormecido. Tomou um café sem sabor que escaldava e viveu mais um dia frio sem gosto, com pressa sem motivo para voltar a casa, misturada na multidão que era de gente tão igual a si.
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