Certa cor só existe em céu
é o verdazul do anoitecer
ao cortar o horizonte
sublinha as luzes e os telhados.
Quando eu era menina
subia às árvores para lhe tocar
agora, subo ao teu corpo
pelos teus ramos
e o verde embala-te o tronco
que o azul vem contornar.
25 julho 2011
24 julho 2011
A Rapariga Vulgar (V)
(Aquele escombro absurdo do silêncio mutilado, à deriva num mar de ruído, mantém o olhar inquieto, incauto, quer enrolar o burburinho sólido, tóxico e puxá-lo ao fundo de um castanho ansioliquido. O mundo recolhe às famílias, sobram cá fora os que não pertencem a ninguém.)
Aquela, a última do entardecer, é a melhor hora do dia. Ele fuma cigarros, embala o pensamento na inquietude serena do fumo, observa a rapariga vulgar, sem a interrupção incómoda das onomatopeias grunhidas do homem do estabelecimento ao lado. Dali, consegue ver bem até o que não vê. Mais um homem pára o carro e a rapariga entra. Deixa a imaginação segui-los, torna-se, assim, uma sombra invisível que se funde com os seus corpos. A rapariga está deitada, exposta, submissa, delicada. O desejo invade o homem pelos olhos, numa guerra sem opositores conquista o baixo ventre e lança, embriagado pela vitória, empurrado pelo sangue, uma rigidez de um vermelho nítido, a fome viva, lúcida e inequívoca. Vê-o subir o corpo da rapariga, as nádegas duras, masculinas, em contracções vorazes, o peito moreno, as formas geométricas do masculino, um cheiro ardente a suor preso nos dedos, pêlos negros nas costas quadradas, ossudas. Também ele é a rapariga debaixo do homem, deitada, exposta, submissa, delicada. Tremem-lhe os lábios entre o desejo e a bestialidade do primeiro beijo, o trespasse das margens do proibido. O cigarro parece acariciar-lhe a boca, agora que a fome parece ter tornado a pele mais fina, até a aragem parece uma carícia, uma língua proibida, saliva interdita, pensamento varado pela vergonha. E o Sr. João continua ali, sente-se exposto e delicado, submisso ao amante que a imaginação rouba da rapariga para os seus braços, deitado como uma belíssima flor incompleta.
Aquela, a última do entardecer, é a melhor hora do dia. Ele fuma cigarros, embala o pensamento na inquietude serena do fumo, observa a rapariga vulgar, sem a interrupção incómoda das onomatopeias grunhidas do homem do estabelecimento ao lado. Dali, consegue ver bem até o que não vê. Mais um homem pára o carro e a rapariga entra. Deixa a imaginação segui-los, torna-se, assim, uma sombra invisível que se funde com os seus corpos. A rapariga está deitada, exposta, submissa, delicada. O desejo invade o homem pelos olhos, numa guerra sem opositores conquista o baixo ventre e lança, embriagado pela vitória, empurrado pelo sangue, uma rigidez de um vermelho nítido, a fome viva, lúcida e inequívoca. Vê-o subir o corpo da rapariga, as nádegas duras, masculinas, em contracções vorazes, o peito moreno, as formas geométricas do masculino, um cheiro ardente a suor preso nos dedos, pêlos negros nas costas quadradas, ossudas. Também ele é a rapariga debaixo do homem, deitada, exposta, submissa, delicada. Tremem-lhe os lábios entre o desejo e a bestialidade do primeiro beijo, o trespasse das margens do proibido. O cigarro parece acariciar-lhe a boca, agora que a fome parece ter tornado a pele mais fina, até a aragem parece uma carícia, uma língua proibida, saliva interdita, pensamento varado pela vergonha. E o Sr. João continua ali, sente-se exposto e delicado, submisso ao amante que a imaginação rouba da rapariga para os seus braços, deitado como uma belíssima flor incompleta.
«O livro» - por Rui Felício
Vestiu o seu melhor vestido que deixava adivinhar todos os contornos do seu corpo, perfumou-se, pegou no embrulho de papel de seda com um laço dourado e dirigiu-se a casa do Filipe. Tinham combinado jantar em casa dele só os dois. Era o dia do seu aniversário...
Tocou a campainha e quando o Filipe abriu, beijou-o , deu-lhe os parabéns e entregou-lhe o embrulho, dizendo que não conhecia o autor mas que era um romance que a empregada da livraria lhe tinha recomendado.
O Filipe agradeceu a prenda, rasgou o papel do embrulho e, atónito, só ao fim de uns minutos conseguiu articular palavras:
- Onde conseguiste este romance? Há meses que tento encontrá-lo. Já corri dezenas de livrarias e está sempre esgotado. Obrigado!
Ela via a felicidade que lhe transparecia do olhar, da boca entreaberta, dos gestos, da maneira sensual como os seus dedos acariciavam a capa e folheavam sôfregas e ao acaso as páginas.
Como ela desejava naquele momento ser tocada pelas suas mãos da mesma forma que ele acariciava embevecido aquele livro!
Mas o Filipe era um viciado na leitura. Depois de jantarem, sentaram-se no sofá da sala mas ela sentia que a atenção dele estava dedicada exclusivamente àquele livro. Ela sabia que só depois de ter devorado aquelas quatrocentas páginas é que o Filipe lhe dedicaria alguma atenção.
Ficou a observá-lo, paciente, excitando-se em silêncio com os suspiros e os gemidos que por vezes ele deixava escapar a cada virar de folha.
Por volta das quatro da madrugada o Filipe finalmente concluiu a leitura, recostou-se no sofá, estendeu-lhe os braços e ela anichou-se no seu colo.
Despiram-se. Ela sabia que depois da excitação da leitura não podia perder tempo com preliminares. O Filipe estava prestes a atingir o orgasmo.
Ela seria o epílogo daquele livro...
Rui Felicio
Blog Encontro de Gerações
23 julho 2011
Inevitavelmente
Inevitavelmente
um sorriso entre dois silêncios;
a marca do beijo
amortecendo a queda.
Inevitavelmente
um aperto entre dois orgasmos;
a marca da canção
provocando o silêncio.
Inevitavelmente
uma surpresa entre duas vozes;
a marca do clarão
inebriando a noite.
Inevitavelmente.
Sempre: silenciando o silêncio.
Poesia de Paula Raposo
«Sereia» - azulejo de Júlio Pomar
Comprei este azulejo do Júlio Pomar já há alguns anos, na loja da Casa de Serralves.
Custou-me uma pequena fortuna, mas apaixonei-me pela sereia que teve o problema do sexo resolvido: duas caudas e o assunto fica tratado.
Custou-me uma pequena fortuna, mas apaixonei-me pela sereia que teve o problema do sexo resolvido: duas caudas e o assunto fica tratado.
22 julho 2011
The Gabarola Series (4)
- Ó sua boazona, se tu quisesses dava-te uma trancada sem pestanejar.
- Sem pestanejar? Despachavas a coisa enquanto o diabo esfrega um olho, não é?
Pecado
O meu corpo não tem fundo;
tudo o que já foi imundo
será, contigo, solene.
O meu corpo, por ti, treme,
é uma ventosa sugando,
o gemido mais profundo
que neste mundo se geme
Contigo, serei a amante,
mas contigo, serei o Mundo
Rendemos além-pele à nudez
e as formas que já não vês
perderam-se naquele instante,
eram as formas do pecado
mas um corpo é Templo Sagrado
corpo no corpo de quem o ame.
tudo o que já foi imundo
será, contigo, solene.
O meu corpo, por ti, treme,
é uma ventosa sugando,
o gemido mais profundo
que neste mundo se geme
Contigo, serei a amante,
mas contigo, serei o Mundo
Rendemos além-pele à nudez
e as formas que já não vês
perderam-se naquele instante,
eram as formas do pecado
mas um corpo é Templo Sagrado
corpo no corpo de quem o ame.
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