A Zélia foi me apresentada, na Pastelaria Ceuta, pelo Zé Luis Português Borges da Silva naqueles bons tempos de solteiros que passámos em Lisboa.
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Era uma miúda algarvia, divorciada, de olhos e sorriso lindos!
Tivemos uma relação durante quase um ano. Mas como em tudo na vida, ultrapassada a euforia inicial, as rotinas instalam-se e o entusiasmo arrefece. Nunca nos zangámos, mas as dúvidas apareceram e questionei-a se valia a pena prosseguir...
Disse-lhe que achava que ela já não gostava de mim. Ela negou, insistiu que cada vez gostava mais e que as minhas dúvidas não tinham razão de ser...
Mas eu sentia que era diferente...Que a paixão do principio tinha esmorecido, senão mesmo desaparecido por completo. Ela prontificou-se a fazer tudo o que eu quisesse, como teste do seu amor. Eu só tinha que escolher...
Perguntei-lhe se ela por mim seria capaz, por exemplo, como prova do seu amor, de ir a um restaurante mexicano que havia em Lisboa e comer aqueles pratos exóticos que eles lá tinham, tipo formigas, baratas, lagartixas, etc... Claro que lhe disse isto a brincar mas ela levou-o completamente a sério e respondeu-me que podia ser já no dia seguinte. Iríamos jantar ao tal restaurante mexicano e eu escolheria o prato que ela comeria de bom grado para me provar o seu amor.
Embora eu insistisse que tudo não passava de uma brincadeira minha, que foi uma parvoíce que me veio à cabeça, ela fez questão de fazer esse teste.
Ou esse ou outro qualquer era para ela indiferente!
Mesmo achando eu, ser um teste estúpido, combinámos então ir ao tal restaurante.
Escolhi, para mim, um bife com ovo a cavalo. Para ela, um prato designado por “baratas negras fritas no próprio molho, à moda de Zapata”
Observei a Zélia a trincar as baratas, agoniei-me ao ver, de vez em quando, um liquido amarelado que por vezes lhe escorria da boca e que ela pressurosa, enxugava com o guardanapo. O estalar da cascas a partirem-se entre os seus dentes provocava um ruído inquietante...
Pareceu-me ver os restos das patas das baratas, presas nos interstícios dos dentes da Zélia...
Um verdadeiro nojo!
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No fim de comer, fitou-me e disse-me:
- Odiei comer esta porcaria. Queres melhor prova do que esta? Ainda duvidas do meu amor por ti?
Não tive outro remédio senão reconhecer que a Zélia tinha levado ao extremo o seu teste e disse-lhe:
- Admito que me enganei Zélia. Não duvidarei mais de ti...
Feliz, a Zélia aproximou os seus lábios dos meus e pediu-me um beijo. Como paga do seu esforço...
Recusei beijá-la com a desculpa de que estávamos em local público...
Mas na realidade, o que eu não conseguia era esquecer aquelas patinhas de barata ainda entre os alvos dentes da Zélia.
Afinal era o meu amor por ela que já se tinha esvaído... Incapaz de resistir ao mais pequeno teste...
Rui Felício
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