"Que raio de enchidos se encontram expostos nas montras de Istambul..."
Paulo M.
05 junho 2015
«Vidro» - João
"Sentaram-se lado a lado, de corpos exteriormente relaxados face a um Sol mais generoso, e disse-lhe, conta-me lá, o que é que achas que foi? Suponho, disse ele, que ela é como vidro para mim. Transparente. O olhar fixo no olhar é uma conveniência, e mais que isso, é um prazer. Um genuíno prazer, fala-se muito por aí, mas nem seria preciso. Ela é vidro. É transparente, vejo através dela, consigo lê-la melhor que ninguém. Ou talvez seja espelho, respondeu, talvez tu digas que é vidro mas na verdade seja espelho, e tu vejas o teu reflexo, ou do que és, ou do que podes ser, pensaste nisso? E claro que pensara, não uma, sequer duas, inúmeras vezes. Na capacidade de elevar, de puxar, de fazer as pessoas em pessoas diferentes. Mas fosse vidro ou espelho, o essencial estava ainda assim naquelas ideias simples. Deixando passar a leitura ou devolvendo palavras, o mistério era esse, como duas coisas opostas se complementavam e resultavam naturais, como se sempre assim tivessem sido, como resultavam unas. Acredito, prosseguiu ele, que isso lhe causasse algum desconforto, sabes? Não deve ser fácil ser-se trespassado assim, sentirmos que alguém nos consegue ler por dentro quando passamos tanto do nosso tempo a tentar precisamente evitá-lo, que ninguém nos leia, e que existam espaços de reserva.
E roubavas tu essa reserva? Devolveu. Não, não creio que roubasse, disse-lhe. Mas podia ver se quisesse, podia entender. E isso é paradoxal, porque quem parece encerrar em si uma certa frustração de não haver quem a leia, fecha-se e assusta-se perante quem a lê. São anos e anos de uma concha fechada, de uma dura cerviz, e a água não entalha a pedra de um dia para o outro, leva muito tempo, e as rochas humanas, mesmo que apenas por fora, são assim também. Demoram a confiar, a abrir. A mostrar o néctar como as flores que se abrem aos insectos. E isso, bem vês, deixa-me siderado, porque conseguir ver a luz através da solidez do corpo de alguém é experiência rara, e algum desígnio precisa encerrar, mesmo que se esconda quando se procura, mesmo que fuja ao entendimento como as mãos de um ilusionista experiente. E dentro dessa rocha que tu dizes que há, encontraste alguma coisa? Claro, retorquiu. Encontrei o tal néctar como o das flores. E é doce."
João
Geografia das Curvas
E roubavas tu essa reserva? Devolveu. Não, não creio que roubasse, disse-lhe. Mas podia ver se quisesse, podia entender. E isso é paradoxal, porque quem parece encerrar em si uma certa frustração de não haver quem a leia, fecha-se e assusta-se perante quem a lê. São anos e anos de uma concha fechada, de uma dura cerviz, e a água não entalha a pedra de um dia para o outro, leva muito tempo, e as rochas humanas, mesmo que apenas por fora, são assim também. Demoram a confiar, a abrir. A mostrar o néctar como as flores que se abrem aos insectos. E isso, bem vês, deixa-me siderado, porque conseguir ver a luz através da solidez do corpo de alguém é experiência rara, e algum desígnio precisa encerrar, mesmo que se esconda quando se procura, mesmo que fuja ao entendimento como as mãos de um ilusionista experiente. E dentro dessa rocha que tu dizes que há, encontraste alguma coisa? Claro, retorquiu. Encontrei o tal néctar como o das flores. E é doce."
João
Geografia das Curvas
04 junho 2015
«respostas a perguntas inexistentes (301)» - bagaço amarelo
O mais bonito nos homens que não sabem fazer declarações é que nunca desistem de tentar. Passam a vida a esbarrar na incompreensão feminina, que ora reage com desprezo total, ora com um sorriso igual ao de quem parte em viagem, isto é, de quem vai embora porque está farto de ali estar.
As mulheres deviam ter mais atenção aos homens que bebem. Acredito que não há um único bêbado neste mundo que não o seja por causa delas. Delas e, claro, da sua incompetência natural para fazer declarações de Amor.
Lembro-me do dia em que percebi que não sabia fazer declarações de Amor. Foi num dia como o de hoje. A espuma da minha cerveja descia pelo vidro num lento suicídio em direcção ao fundo do copo e ela, que ainda só tinha dado dois goles, sugeriu-me que pedisse outra.
- És bonita! - disse eu.
Os olhos dela continuaram a olhar para o meu copo, como se estivessem a admirar uma obra de arte qualquer, indiferentes ao que eu acabara de dizer. Para meu espanto, o mundo continuava a funcionar à minha volta como se nada fosse. Menos mal. Os clientes continuavam a entrar e sair daquela esplanada e o empregado de mesa, demasiado calmo para o número de clientes que esperavam por ele, empilhava copos vazios numa bandeja que me parecia demasiado pequena para o efeito.
- Outra cerveja, por favor! - pedi-lhe assim que passou perto de mim.
É claro que ela ficou indiferente. A minha declaração não chegava a ser de Amor. Era apenas uma tremida constatação da sua beleza, pela qual ela nem sequer tinha responsabilidade nenhuma. Acabei a minha segunda cerveja no mesmo momento em que ela acabou a primeira. Vi-a levantar-se, pagar e afastar-se enquanto me dizia adeus com a mão esquerda. Aquela era uma despedida que me despedia a mim, definitivamente, de candidato a poder Amá-la.
- Paguei as três... - disse ela. Depois desapareceu.
Fiquei eu e o bar.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
Mosca com segredo
Peça única em bronze de uma mosca com asas articuladas, mostrando um pénis no interior.
Mais uma peça única de P. Leroux a juntar-se a várias outras na minha colecção.
Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)
Mais uma peça única de P. Leroux a juntar-se a várias outras na minha colecção.
Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)
Almas gémeas
Dá-me um prazer especial ter sido eu quem, em 2005, recordou a fotografia do José Cid com o disco de ouro emoldurado como única peça de roupa. Foi um recorte da revista «Nova Gente» que tinha guardado desde os anos 90.
HenriCartoon
HenriCartoon
03 junho 2015
Postalinho de Córdova
"Julgavas que, nesta viagem, não te mandava nenhum postalinho, hem?!?
É o bilhete de entrada na Alcáçova de Córdoba.
Beijinhos.
Daisy"
A simpática senhora deste bilhete é a protagonista do quadro «Naranjas y limones» (Laranjas e limões) de Julio Romero de Torres.
É o bilhete de entrada na Alcáçova de Córdoba.
Beijinhos.
Daisy"
A simpática senhora deste bilhete é a protagonista do quadro «Naranjas y limones» (Laranjas e limões) de Julio Romero de Torres.
«Laranjas e limões». 1927.
Óleo e tempera sobre tela. 104 x 74 cm.
Museu Julio Romero de Torres, Córdoba (Espanha)
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