"Não estás a entender, dizia-lhe, e os corpos agitavam-se, e ela chorava e resistia, e dizia que não podia, que não devia ser assim, que tinha de ser mais, que só podia ser mais, e ele a pegar-lhe e ela a contorcer-se, e os pulsos a querer fugir e ele a agarrá-los com força, e a encostá-la à parede com força e a dizer-lhe ao ouvido que não estava a entender, que não era nada disso, e ela a debater-se como se fosse uma virgem da Ilha dos Amores numa fuga agitada mas cheia de vontade, a dualidade de não querer e querer tanto, e o sexo a acontecer entre eles, a parede a segurá-los, mais a eles que ao resto do edifício, e ela a queixar-se que era pouco, e ele a insistir que não era nada disso, e depois, depois de ela se vir e tremer até ao chão, sem forças, ele a pegar num casaco quente e a cobrir-lhe o corpo a arrefecer, e a aninhar-se frente ao seu rosto e a repetir-lhe que não tinha entendido nada, que não era nada daquilo, e ela percebeu então. Percebeu por causa do casaco quente, dos olhos dele, e porque não se foi embora como nas histórias de foda, dos dias curtos de sentir."
João
Geografia das Curvas
28 dezembro 2015
27 dezembro 2015
«Batucada» - Kunstenfestivaldesarts 2014
Performance criada por Marcelo Evelin, coreógrafo brasileiro, sobre as ideias e a dinâmica do convívio humano, concentrando-se no corpo como meio de expressar-se no espaço público.
Batucada / Kunstenfestivaldesarts 2014 from Kunstenfestivaldesarts on Vimeo.
Batucada / Kunstenfestivaldesarts 2014 from Kunstenfestivaldesarts on Vimeo.
«respostas a perguntas inexistentes (318)» - bagaço amarelo
Conversar era um hábito que perdera com o casamento. Uma vida a dois, preenchida por quatro filhos, afastara-o do mundo que conhecera alguns anos antes, mas que agora lhe parecia longínquo. Um mundo de conversas com amigos e de copos babados, de alguns abraços e de olhares soltos para mulheres desconhecidas.
Adormeceu à mesa.
A mulher dele tinha sido a minha primeira namorada. Éramos então dois adolescentes, cujo Amor parecia impossível de terminar um dia e cuja vida se adivinhava dinâmica e feliz. Sem sobressaltos, sem zangas, sem filhos. Sobretudo sem adormecermos à mesa derrotados pelo cansaço.
Creio que durou um mês, esse sonho.
O Fred ressonava. Acordei-o com o cuidado de um pai que acorda um filho, dei-lhe um cobertor e mandei-o para o sofá da sala.
Fechei a luz, ouvi-o ressonar e telefonei à Laura.
- O teu marido dorme cá hoje!
Do outro lado ouvi o silêncio mais pesado que se pode ouvir. Passou-me tudo pela cabeça, incluindo a certeza que ela tinha de que estivéramos a beber até um de nós adormecer. Talvez estivesse desconfortável pelo leque de possibilidades temáticas que dois homens que dormiram com a mesma mulher podem ter. Talvez até já nem se lembrasse de mim.
- Laura?!
O silêncio continuou mais um pouco, mas desta vez com uma respiração libertadora.
- Que saudades que eu tenho duma noitada assim! - disse ela.
- Compreendo!
- Lembras-te de nós? - Insistiu.
- Lembro. Claro que lembro.
E o silêncio tornou-se mais leve.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
26 dezembro 2015
«Clic 4» - Milo Manara
Livro da série Clic, do mestre do erotismo em banda desenhada.
Na última aventura da reprimida Claudia Cristiani, o controle remoto que activa os seus desejos sexuais cai nas mãos de Angelina (Deva), uma modelo disposta a tudo para garantir que o seu pai seja indemnizado por ter ficado cego num acidente numa fábrica de produtos químicos. Livro dentro de um saco personalizado.
Junta-se a diversos outros livros e ilustrações de Milo Manara, na minha colecção.
Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)
Na última aventura da reprimida Claudia Cristiani, o controle remoto que activa os seus desejos sexuais cai nas mãos de Angelina (Deva), uma modelo disposta a tudo para garantir que o seu pai seja indemnizado por ter ficado cego num acidente numa fábrica de produtos químicos. Livro dentro de um saco personalizado.
Junta-se a diversos outros livros e ilustrações de Milo Manara, na minha colecção.
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25 dezembro 2015
«As tentações da carne (conto de Natal)» - por Rui Felício
Velho e gordo, o padre Simão é uma pessoa bondosa, amado e respeitado pela população da pequena aldeia de São Julião, paredes meias com a Ericeira.
Caminha penosamente em direcção à igreja onde vai dizer a missa de domingo.
Exausto, já no adro, acerca-se dele a Dona Elvira, frequentadora diária da igreja, que o padre conhece há muitos anos:
-Sr. Padre Simão, trago-lhe aqui uma prenda para o seu Natal.
E tira de uma cesta de verga, uma enorme e grossa enguia, ainda viva e a remexer-se.
- Foi o meu marido que a apanhou esta manhã no rio Lizandro, lá em baixo.
O velho padre arregalou os olhos, pegou nela e agradeceu-lhe reconhecido. Ele era doido por enguias e as pessoas da freguesia sabiam disso.
A igreja já estava cheia, estava na hora da missa.
Na sacristia, enquanto vestia os paramentos, pensou como havia de fazer para guardar a enguia. Já não tinha tempo de ir a casa e também não queria deixá-la ali. Tinha medo que o sacristão a roubasse...
Resolveu enrolá-la à volta da cintura, por baixo da sotaina e prendê-la com um cordel. E, se bem o pensou, melhor o fez.
Na altura do sermão, subiu ao púlpito e a sua voz pausada, profunda e grave era acompanhada por amplos gestos teatrais, que por vezes lhe descompunham as vestes.
Incentiva os fiéis a privarem-se e a absterem-se das tentações da carne, que são a origem de todos ao males do mundo.
Mas a respeitosa e silenciosa atenção do auditório, a que estava habituado, começava a ser beliscada aqui e ali, primeiro pelos olhares espantados dos homens, depois pelos risinhos abafados das mulheres.
O padre, seguindo os olhares que se concentravam todos num único ponto, compreendeu o que se passava. O raio da enguia estava a sair-lhe por entre as pregas das vestes, e remexia-se e ondulava, grossa e inquieta, ao longo das suas pernas.
Envergonhado, o padre Simão corou atrapalhado e em voz trémula, retomou o sermão:
- Eu falava no nosso dever de afastarmos as tentações e os prazeres da carne e assim deve ser, por amor a Deus Nosso Senhor.
Mas, meus irmãos e minhas irmãs, o que estais vendo não é carne! É peixe!
Caminha penosamente em direcção à igreja onde vai dizer a missa de domingo.
Exausto, já no adro, acerca-se dele a Dona Elvira, frequentadora diária da igreja, que o padre conhece há muitos anos:
-Sr. Padre Simão, trago-lhe aqui uma prenda para o seu Natal.
E tira de uma cesta de verga, uma enorme e grossa enguia, ainda viva e a remexer-se.
- Foi o meu marido que a apanhou esta manhã no rio Lizandro, lá em baixo.
«Contos eróticos de Natal» Compilação de vários autores Hugin Editores, 2000 Colecção de arte erótica «a funda São» |
A igreja já estava cheia, estava na hora da missa.
Na sacristia, enquanto vestia os paramentos, pensou como havia de fazer para guardar a enguia. Já não tinha tempo de ir a casa e também não queria deixá-la ali. Tinha medo que o sacristão a roubasse...
Resolveu enrolá-la à volta da cintura, por baixo da sotaina e prendê-la com um cordel. E, se bem o pensou, melhor o fez.
Na altura do sermão, subiu ao púlpito e a sua voz pausada, profunda e grave era acompanhada por amplos gestos teatrais, que por vezes lhe descompunham as vestes.
Incentiva os fiéis a privarem-se e a absterem-se das tentações da carne, que são a origem de todos ao males do mundo.
Mas a respeitosa e silenciosa atenção do auditório, a que estava habituado, começava a ser beliscada aqui e ali, primeiro pelos olhares espantados dos homens, depois pelos risinhos abafados das mulheres.
O padre, seguindo os olhares que se concentravam todos num único ponto, compreendeu o que se passava. O raio da enguia estava a sair-lhe por entre as pregas das vestes, e remexia-se e ondulava, grossa e inquieta, ao longo das suas pernas.
Envergonhado, o padre Simão corou atrapalhado e em voz trémula, retomou o sermão:
- Eu falava no nosso dever de afastarmos as tentações e os prazeres da carne e assim deve ser, por amor a Deus Nosso Senhor.
Mas, meus irmãos e minhas irmãs, o que estais vendo não é carne! É peixe!
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