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Prostituição: carta aberta - a realidade na sombra
Publicação de 21/5/2010 da Miss Joana Well, eliminada pelo Blogger em 28/3/2023 sem qualquer justificação mas que, por ser importante divulgar e não ter nenhum conteúdo ilegal em Portugal, volto a publicar.
Não, eu não quero falar.
Prefiro escrever poesia, metáforas, contos. Mas aqui não há luz; existem corredores na sombra e outros ainda no escuro. E na sombra e no escuro crescem os fungos. Falar é lançar luz. Falar é acender a lâmpada que permite que os olhos alheios percorram estes corredores.
Esta é a realidade, não como a pensam, não como a julgam, não como a imaginam, não como tem sido mostrada: é a realidade tal como ela é. Falar é tentar manter os corredores limpos e dignos. A realidade. A realidade é que recebo mensagens de mulheres (e homens) e não sei o que responder. Aliás, mal entendo o que me escrevem: "Quero ser acompanhante de luxo"... "Quero ser acompanhante de alto luxo"... "Sou muito bonita por isso quero ser acompanhante de luxo"... "Quero ter uma vida fantástica, fácil, quero ganhar muito dinheiro, quero jantar, viajar e conhecer pessoas interessantes e/ou famosas, quero ser acompanhante de luxo".
E depois a cartada final: "Explica-me como faço"...
E eu tenho vontade de responder que não faço a mais pequena ideia, que nem sei o que significa a palavra "acompanhante" aplicada a este contexto, nisto que é a prestação de serviços sexuais; tenho vontade de lhes dizer que sou prostituta e só conheço prostitutas como eu, prestadoras de serviços sexuais; que a palavra acompanhante, neste contexto, é apenas uma forma de suavizar, uma forma de defender a nossa sensibilidade e a de quem nos procura, uma forma de proteger olhos mais susceptíveis, uma forma em forma de placebo, uma ilusão com que tentamos defender o estômago. Eu sou prostituta; defende-me o estômago a aceitação da palavra. O que conheço é prostituição: algumas cobram mais pelos seus serviços e outras cobram menos, valores esse que podem ser cobrados por relação sexual, por tipo de relação sexual, por tempo: quinze minutos, meia hora, uma hora, duas ou três horas, um dia, uma noite, uma semana. Só muito excepcionalmente a procura não solicita a prestação sexual, a forma de solicitar e a forma de lá chegar pode ser mais explícita ou implícita, mais directa ou mais indirecta, mais ou menos romântica – mas o objectivo é chegar ao sexo, independentemente do tipo de "preliminares" escolhidos: conversa, jantar, empatia, telefonema e marcação daí a meia hora, etc. Os serviços mais procurados são os cobrados por número ou tipo de relação sexual ou os serviços cobrados por tempo até à marca da hora (quinze minutos, meia hora, uma hora). Serviços mais "longos" são raros e quanto mais "especiais" mais raros são. A qualidade do serviço sexual é avaliada por alguns com base – essencialmente ou apenas – na estrutura geométrica da coisa: posições, malabarismos, tipos de sexo, o rosto, o corpo da parceira, e assim por diante. Outros avaliam-no – essencialmente ou apenas – com base na química, na empatia, na simpatia, na sensação de exclusividade, ou o que for. As características do serviço procurado, em cada caso, dependem mais do próprio cliente do que do tipo de serviço escolhido: um cliente pode contratar um serviço pago por relação sexual ou, por exemplo, por meia hora, e, ainda assim, ser um cliente que dá mais importância à química e à empatia do que à "estrutura geométrica" do sexo e da mulher escolhida. As prostitutas que normalmente chamamos de "acompanhantes de luxo" são – quase sempre – as que maioritariamente prestam serviços por meia hora ou uma relação (entre os 50 e os 80 euros) e uma hora (entre os 80 e os 100 euros). Destes valores para cima existe mercado mas é mais escasso e escasseia mais quanto mais o valor sobe. Aliás, basta espreitar um dos sites mais conhecidos, onde as acompanhantes se anunciam, para verificar que, dentro dos valores que referi (até aos 100 euros), se pode contratar serviços de belíssimas mulheres dispostas a agradar; a concorrência é feroz, o número de mulheres nesta actividade é uma elevadíssima incógnita. Tudo se pode encontrar dentro destes valores, por isso, as mulheres que cobram ainda mais, especialmente se ainda desconhecidas ou principiantes, vão ter menos (às vezes, nenhuma) procura. Só um golpe de sorte pode fazer com que uma mulher, ao iniciar-se nesta actividade, comece a cobrar valores superiores a estes e tenha sucesso, especialmente se estiver a contar com serviços maravilhosos que incluem jantares, passeios, noites, etc., para não falar dos riscos constantemente ignorados em aceitar um desses serviços que implica acompanhar um estranho. É também necessário ter um local onde receber os clientes: serviços de deslocação a hotel são mais raros e deslocações a domicilio implicam enormes riscos.
Ou seja, ser prostituta (excluindo a rua) implica despesas elevadíssimas: apartamento ou quarto, anúncios em sites ou jornais e investimentos na própria imagem. Alugar um apartamento e receber sozinha também é um risco, evidentemente; passamos o dia a quebrar a regra de segurança numero um - não abrir a porta a desconhecidos. Encontrar uma colega ou mais com quem dividir o apartamento também se pode revelar tarefa complicada: as personalidades podem chocar-se ou a pessoa escolhida pode revelar-se pouco responsável com horários, higiene, divisão de despesas, etc.; tudo se torna complicado num mundo em que se reserva a identidade, ninguém sabe quem é quem e tudo pode acontecer mais facilmente.
Face a estas dificuldades e desconhecimento do meio, muitas mulheres optam por trabalhar por conta de outrem, porque a casa suporta todas as despesas e pode proporcionar mais segurança; em troca, cada mulher dá à casa uma percentagem por cada cliente que atende, geralmente cinquenta por cento. Considero esta opção legítima enquanto opção, enquanto escolha e preferência e decisão da própria mulher; todos os profissionais têm o direito de decidir se querem trabalhar por conta própria ou de outrem.
Alertas: o lenocínio é ilegal. Tradução: ele existe na sombra, não há ninguém que fiscalize as condições em que ele existe, não há ninguém que proteja as trabalhadoras da entidade profissional. As condições a que as mulheres nesta actividade estão sujeitas quando trabalham em casas dependem, neste momento, única e exclusivamente do carácter do proprietário ou proprietária da casa em que "aterram" e isto pode, sim, tornar as coisas muito complicadas. O lenocínio não vai deixar de existir por ser ilegal, isto só lhe vai dar carta branca para existir nos moldes que a gerência dessas casas quiser.
A prostituição não vai deixar de existir por ser escondida, "alegal", discriminada enquanto profissão; vai apenas continuar a existir numa escuridão que esconde criaturas e acontecimentos negros, bem negros. A "alegalidade" é perigosa, a "alegalidade" deixa-nos desprotegidas perante riscos diversos, a "alegalidade" é apenas um "lavar de mãos" imoral e vergonhoso. Não sou acompanhante, sou prostituta; não conheço acompanhantes, apenas prostitutas; desconheço vidas fantásticas, glamourosas, luxuosas - mas conheço riscos, dificuldades, uns dias melhores que outros e alguma compensação financeira. Claro que não conheço a realidade toda, mas garanto que já por aqui ando há tempo que chegue e sobre para conhecer a maior parte. A quem decidiu escolher este caminho desejo boa sorte – é que vai mesmo precisar dela!
Miss Joana Well
21/5/2010
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Pérolas do Twitter... digo, 𝕏 - 45
Junta-te aos 2100 passarinhos e passarinhas que me seguem no Twitter... digo, 𝕏.
Esta pérola até merece ser uma entrada do DiciOrdinário ilusTarado... se houver uma 4ª edição.