Refulgente olhar que a treva encerra
Voa em recessão ao centro da terra
Sem deixar esperanças na alva clareira
Do sonho que é a vida mas tão passageira.
Rútilos cabelos que a saudade aflora
Penosos punhais que não vão embora
Pendentes presentes sobre o teu semblante
Bocas tresloucadas que haurem o instante.
Com sofreguidão exaure-se o tempo
Num mar de paixão e contentamento
Rompem labaredas pelas frestas dos dedos
Que queimam as asas que nascem dos medos.
Mas os anos passam no giro da vida
Luz de candeeiro no fim da torcida
O cabelo branqueia já custa a calçada
O coração bombeia na artéria cansada.
E defronte ao espelho o olhar desliza
Como que levado pela própria brisa
Fica a sombra escura sempre decidida
Do sonho que é a vida como despedida.
«O silêncio e o gume da palavra», 2022
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