25 junho 2023

«Dantes» - António F. de Pina

Dantes
Todos os pássaros eram coloridos
Que pousavam em mim silenciosamente
E eu nunca reparava.

O amanhecer era acutilante e soltava sons
Pelos poros crepusculares e orvalhados
Que eu não entendia.

Tinhas no olhar um brilho intenso
Que as candeias acesas veneravam
Enquanto eu reacendia.

E tinhas os cabelos claros alisados
Que eu nunca ousei despenteá-los
Por desconhecer essa magia.

Dantes
Os búzios lançavam maresias
Nas tardes mornas e arenosas
E nas noites remoçadas e sombrias.

O horizonte nunca entardecia
Nos devaneios que eram o meu espaço
E eu respeitava-os por tanto.

Havia sempre azul para além da noite
Quando o teu abraço imperava
E eu orgulhosamente correspondia.

Dantes
Tudo reverdecia à nossa volta
Quando as horas previsíveis
Enlaçavam a nudez imprevisível.

Agora
Apenas consigo entender
O súbito entardecer no silêncio
Das horas nunca rejuvenescidas.

«O silêncio e o gume da palavra», 2022
© todos os direitos reservados



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