VÉNUSÀ flor da vaga, o seu cabelo verde,
Que torvelinho enreda e desenreda…
O cheiro a carne nos embebeda!
Em que desvios a razão se perde!
Pútrido o ventre, azul e aglutinoso,
Que a onda, crassa, num balanço alaga,
E reflui (um olfacto que embriaga)
Que em sorvo, murmura de gozo.
O seu esboço, na marinha turva…
De pé flutua, levemente curva;
Ficam-lhe os pés atrás, como voando…
E as ondas lutam, como feras mugem,
A lia em que se desfazem disputando,
E arrastando-a na areia, co’a salsugem.
Camilo Pessanha (1867-1926)
Clepsidra
Lisboa: Casa Editora Lusitânia, 1922