12 março 2010

O Idiota

O farsolas meneou a cabeça num trejeito estudado de enfastiado interesse e calma displicência, como se fizesse o favor de a ouvir.
Ela falava e sorria. Falava e sorria com a boca, com os olhos e com as mãos. Na realidade, olhando com atenção, ela falava e sorria com todo o corpo.
O farsolas ouvia, mas, verdadeiramente, não ouvia nada. O farsolas estava ali por si próprio, ainda que se desse ares de genuína, mas altaneira, atenção.
Ela que estava ali por ele, provavelmente pensando que ele era outro, continuava a falar, a contar, a dar-se, entusiasmada e feliz, tentando agarrá-lo pelos ouvidos. Fazendo conversa pelos dois.
O farsolas interessado apenas em si e no que podia conseguir dali, procurava, numa elaborada mas oca encenação, acompanhar e reagir à conversa e ia sucessivamente debitando murmúrios, monossílabos, trejeitos e gestos que, sem lhe fazer perder a pose interessada e o mistério sedutor, se integrassem no que ela lhe dizia e contava.
– E tu? – interpelou-o ela, sorrindo.
– Eu? – engasgou-se o farsolas. – Eu? – repetiu teatralmente, com ensaiada modéstia.
Ela confirmou a pergunta com um aceno gracioso e um sorriso paciente. Ele sorriu indolente e engoliu um terceiro eu, fantasiando que ela o viesse a fazer.
– Eu não gosto de falar de mim – declarou, por fim, sério, erguendo a sobrancelha direita. Pousou a sua mão sobre a dela e erguendo-se ligeiramente sobre a mesa para se aproximar dela, ciciou: – Há tanta coisa boa para fazer com a boca e com língua que perder tempo a falar de mim até parece pecado.
Ela viu-o. Não o viu logo porque ainda deixou escapar um sorriso mas quando o viu, viu.
Ela ergueu-se na direcção dele, aproximou-se do ouvido direito e propôs-lhe no mesmo tom de voz:
– Comes-me se me responderes a duas perguntas.
O farsolas murchou e voltou a sentar-se. Ela também.
– Duas perguntas?
– Duas.
O farsolas suspirou ruidosamente, olhou em volta e regressou a ela:
– Duas perguntas, como?
– Duas perguntas sobre duas coisas de que me lembrei quando me disseste que era pecado falares de ti quando há tanta coisa boa para fazer com a boca e a língua.
– Tipo um concurso? – O farsolas não conseguia disfarçar o embaraço que lhe causava nadar fora de pé, numa praia que não era a sua.
– Sim, tipo isso. Queres ou não? – impacientou-se ela.
– Força!
Ela fixou-o, sorriu sem mostrar os dentes e perguntou pausadamente:
– Quais são os pecados capitais?
– Pecados capitais?
– Sim, quais são?
– São 7? – perguntou o ex-farsolas, esquecido da pose, com uma careta de dúvida.
A mulher acenou positivamente com a cabeça. Ele abriu um sorriso:
– Eu vi um filme com o Brad Pitt que...
– Vais responder ou contar-me o filme? – interrompeu ela, olhando para o relógio de pulso. – É que eu às sete e meia tenho pilates.
– A vaidade – começou ele, concentrado –, a inveja,... a... a... ah! a gula... Três – animou-se. – A vaidade, a inveja, a gula, a... Eu sei. Eu sei mais. A preguiça! É?
Ela confirmou.
Ele embatucou. Pensava, olhava em volta, tentava lembrar-se do filme, julgava o que pudesse ser mesmo mau mas nada, não lhe saía nada.
– Tenho direito a alguma ajuda? – Acabou por perguntar quando esgotou todas as formas e tentativas de, por si, conseguir dizer os restantes três pecados capitais. Olhou ostensivamente para o telemóvel pousado em cima da mesa da pastelaria.
– A ajuda do público – respondeu ela, sem pensar.
O farsolas olhou em volta, havia três pessoas em duas mesas, um empregado a servir às mesas e outro atrás do balcão.
– Desculpem – disse alto o farsolas, chamando a atenção de todos e ante o espanto boquiaberto da mulher. – Nós estávamos aqui com uma dúvida, uma coisa sem importância, se nos pudessem ajudar... É que estávamos aqui a falar sobre os pecados capitais, os sete pecados capitais e só nos lembramos de quatro: da preguiça, da vaidade, da inveja e da gula. Faltam-nos os outros três. Alguém se lembra?
A estranheza do pedido causou um silêncio total e os cinco inquiridos entreolharam-se à espera que algum respondesse.
– Ninguém se lembra? – reforçou o farsolas, dando um ar compreensivo à ignorância alheia mas desesperado ao seu pedido.
– A avareza, a ira e a luxúria – respondeu o homem sozinho numa das mesas.
– É? – questionou o farsolas, excitado, virando-se para a mulher.
– É – validou ela.
– Obrigado – agradeceu o farsolas, erguendo o polegar. Sorridente, acalmou, esperou que os olhares dos clientes e empregados os abandonassem e desafiou: – E a outra? A outra pergunta, qual é?
– “Dir-se-ia que estamos em Sodoma, em Sodoma! – repetiu o general, alçando os ombros.” – citou a mulher.
– O que é isso? – espantou-se ele.
– Uma citação de um livro, de um grande livro – corrigiu ela.
– E qual é a pergunta?
– De que obra é esta citação?
– Tu não disseste que as perguntas eram sobre coisas de que te lembraste quando eu disse que há coisas melhores para fazer com os lábios e a língua do que falar sobre mim? – Acusou o farsolas, aflito com a perspectiva de morrer na praia. – Não disseste?
– Disse – aceitou ela. – Foi do que me lembrei: dos sete pecados capitais e em quais podia integrar-te e desta frase.
O farsolas meneou a cabeça num trejeito espontâneo de enfastiado desinteresse e irritada indiferença.
– Como é que é a frase?
– “Dir-se-ia que estamos em Sodoma, em Sodoma! – repetiu o general, alçando os ombros.”
– “Dir-se-ia que estamos em Sodoma, em Sodoma! – repetiu o general, alçando os ombros.” – repetiu o farsolas, em tom solene e com entoação diferenciada. Suspirou e lançou: – “Dir-se-ia que estamos em Sodoma, em Sodoma!”
– Não sabes?
– Achas? – replicou ele, com desprezo. – E, se não querias nada comigo, não sei porque vieste.
– Se queres saber – disse ela –, não sabia que não queria.
O homem manteve-se pensativo, rodando a chávena de café.
– E se eu soubesse? – perguntou.
Ela sorriu e alçou os ombros:
– Tínhamos de dar razão ao general.
Ele olhou-a, emparvecido:
– E isso queria dizer o quê?
– Que era como estivéssemos em Sodoma – explicou ela, sem resultados na expressão dele. – Que sim – concluiu, aborrecida. – Que se tivesses respondido, eu tinha mantido a minha palavra.
– E assim?
– Assim, vamos embora – respondeu ela, puxando da carteira para pagar a despesa. – Cada um à sua vida.
Atento, o empregado aproximou-se, com duas contas na mão. Deixou uma em cima da mesa deles e levou outra ao homem que sabia os sete pecados.
O farsolas olhou para a conta com desdém.
– Eu pago – disse ela, abrindo a carteira em cima da mesa.
O farsolas encolheu os ombros. Ela colocou o valor certo em moedas junto ao pequeno papel da máquina registadora e levantou-se.
– Eu fico – comunicou o farsolas, rancoroso. – Vou beber uma imperial.
Despediram-se com dois beijos esquinados e ela dirigiu-se à porta.
O homem que também saía agarrou a porta e deixou-a passar, com uma ligeira vénia de cabeça.
– Obrigada – agradeceu sem tom a mulher.
– De nada – disse ele, saindo atrás dela.
Caminharam na mesma direcção, mantendo-se o homem dois passos atrás da mulher, até que ficaram lado a lado à espera para atravessar uma rua.
Ele sorriu, ela não, nem sequer o olhou.
– Desculpe... – interpelou o homem, atabalhoadamente: – A senhora desculpe...
Ela virou-se para ele, com ar seguro, quase intimidador:
– Diga?
– É que eu... – O homem hesitou e recomeçou: – É que eu não pude deixar de ouvir a citação que a senhora fez do “Idiota” do Dostoiévski, é um livro magnífico.
– É.

*

– Foi assim, não foi? – perguntou nervoso o homem, olhando as folhas que pendiam do braço do sofá, logo que a elas se juntou a última que a mulher ainda lia.
– Mais ou menos – respondeu a mulher, com um sorriso luminoso, tornando a pegar nas folhas e ajeitando-as. – Isso foi o que eu te contei – picou, piscando-lhe o olho.
– Eu estava lá, minha cara – declarou o homem, sem conseguir disfarçar o gozo da resposta. – Eu ouvi quase tudo.
– Julgas tu – replicou ela, mostrando-lhe a língua e passando-lhe as folhas. – E acaba assim? – perguntou, mais séria. – Eu a dizer “É”?
– Acaba.
– Então tenho de dizer, senão já não bate certo.
– Diz.
– É.

Falta-lhe em estilo o que lhe sobra em entusiasmo

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11 março 2010

A posta cortada rente

Pedófilos e violadores ocupam os lugares cimeiros dos meus factores de repulsa. Nunca aceitarei, entenderei ou desculparei qualquer pretexto que um desses inventar como desculpa para o seu inaceitável desvio.
A questão é pacífica para mim. Não existem atenuantes. E quando, como no caso do engenheiro trintão conhecido como o violador de Telheiras, invocam alegadas doenças e ainda têm a lata de pedirem ajuda não hesito: castração. Química ou propriamente dita, tanto faz. É mesmo de cortar o mal pela raiz e assim ajudar os pobres coitados, doentes e tal, a pouparem-se a tamanho martírio.

Claro que os pudores de muita gente chegam ao ponto de tornar a castração numa solução drástica, desumana e mais não sei o quê. Não falta quem prefira as soluções mais brandas, a fé num sistema judicial que liberta estes desgraçados, doentes e assim, ao fim de um anito ou dois, condenando-os a terem que enfrentar na rua os seus apetites pela aberração. E eu não consigo pactuar com essa corrente cruel que tende a dar cabo da vida a homens como o tal engenheiro de telecomunicações que guardava as terças feiras para ameaçar garotas, adolescentes, com uma faca e assim as obrigar a satisfazê-lo nas suas necessidades terapêuticas. Porque, como o próprio alega em sua defesa, é um doente e precisa de ajuda.

Eu gostava muito de poder ajudar as pobres criaturas reféns de tais maleitas, salvando-as dessa gente que acredita na reinserção social destas vítimas de um cérebro capaz de congeminar esquemas para abusar de gente pequena mas, estranhamente, sem neurónios que consigam processar a repulsa inata de qualquer ser humano perante tentações tão medonhas quanto nojentas.
Dessa ajuda, considerando o óbvio fracasso dos paninhos quentes do costume que dão tanto que fazer a psicólogos, assistentes sociais, polícias, advogados e por aí fora, e sobretudo tendo em conta que se trata de pessoas doentes, constaria a entrega dos pacientes à Medicina.

E nesse contexto eu privilegiaria sem dúvida como terapia uma cura definitiva, com fármacos eficazes. Mas acima de tudo com a misericórdia absoluta de um bem afiado bisturi.

Verdades simples

É essa a verdade que guardo em mim
aquela que consegues ouvir
que te grito pelas mãos quando te beijam
(escuta)
mesmo que eu não diga

É essa a verdade que aninho em mim
aquela que consegues sentir
quando te beijo pelas mãos que te tocam
(sente)
mesmo que eu não diga

É essa a verdade e o princípio e o fim
aquela que sentes sorrir
quando os corpos simplesmente se beijam
(sou)
mesmo que eu não diga

Porque a verdade é sempre simples
(meu amor, tão simples)
quando se (re)conhece a luz
na pele de corpos nus.

Nu Piano Toca Uma Cítara



O dia para mim começa numa ogiva sôfrega (pálpebras abertas) penso em ti...
Por ti elevam-se os meus lábios, tocados.
O sexo, num manancial erecto. Fogo. Atrás de palavras, com a mão numa palavra, onde estou verdadeiramente debruçada. A mão fecha. Pede à boca que vibre. Um pensamento. Na substância deste meu instante carnal. Nu pensar.
Sobre a pele, o falo alto. O rosto queima-se. Num ritmo pensante, que inunda os sonhos. A fantasia queima.
Genitais em seda, apuram-se altos, nos nós dos dedos, na escrita suprema, no sentimento, tu. Colina em espuma, que a escrita arranca à mão que o escreve.
Agora.
Vibram pés, crus, carnais, ofegantes e vivos.
Sinto o plural, escondido na fluência dos movimentos. Atrás das noites, nas minhas noites, das nossas noites, onde a carne se une perfeita como um livro...
Gosto de pensar em ti, em cada um dos teus dedos, suspensos no meu corpo, entre folhas inspiradoras, enchendo-me de cardumes quentes, correntes de ar extremas e únicas.
Existe em mim um piano, quente e rápido. Que estala e aumenta o silêncio, tremente na minha boca pequena, coberta de entoações e poemas.
Existe em ti uma cítara, que me faz tremer do princípio ao fim, onde te amo, lentamente, entre o meu sexo e a tua boca, onde o silêncio é aplainado a cada beijo nosso...

Beijo,



O popular - mas no entanto raro - peixe-inchado.

10 março 2010

«Autoputaria» - poema de Ildásio Tavares

Ildásio tavares e um galo de Barcelos - foto www.BahiaVitrine.com.br
"Recomendo a publicação em «a funda São» deste poema do meu querido amigo e poeta Ildásio Tavares, que é um dos maiores poetas do Brasil – e que também, nos seus momentos de “saudável loucura” escreve poemas destes.
Foi o Ildásio quem prefaciou a minha antologia «Música do Mundo» editada no Brasil.
Casimiro de Brito, 4/3."
Autoputaria

O poeta é um fodedor
fode tão completamente
que chega a foder atrás
o que não fode na frente,

E os que fodem o que ele fode
na fodida sentem bem
não a foda que ele deu
mas as fodas que não têm.

E assim nas rodas da cona
gira a entreter a razão
este comboio de esperma
que se chama meu colhão.

Ildásio
_____________________________
Esta maltinha não pode ler nada de que goste, que ode logo:

"O Ildásio tem mesmo ar de quem gosta tanto de «bifes» que até lambe a frigideira... eita macho brabo!

Tesão é fogo que arde sem parar,
é ferida que dói, e não se acalma;
é um contentamento para dar
três ou quatro fodas com muita calma.

É um não querer mais que bem foder
é um andar de pau-feito entre a gente;
é nunca contentar-se só por ver;
Um cu, uma boca, uma cona bem ardente(s).

É querer estar com "ele" bem entalado;
É foder um cu bem apertado
Ou fazer um minete bem caprichado
Saber como causar forte desejo
Nas conas e nos cus humanos, o mesmo ensejo

Peço desculpa ao Luís Vaz, por lhe ter avacalhado as rimas...

Bartolomeu"


O Santoninho até ode a dobrar:

"Ah! Ildásio, poeta do caralho,
Que chamas foder a enrabar!
Certo é que vais ter muito trabalho
Para estes conceitos explicar!

No Brasil se fode na buceta,
E enrabar... é comer o cu!
Não sei o que chamam à punheta
Mas... podes explicar-me tu?"

"Um poeta fode como os outros
Em rimas mais ou menos apressadas!
Fode no céu, na terra, até na lua...
Em redondilhas, sonetos e quadras!

O poeta é quem come o cu da musa
Que lhe inspira os versos desbragados!
E pede um broche quando está com tusa
E vem-se em ais e uis declamados!

Um poeta fode noite e dia sem parar,
Esteja sol, vento, chuva ou neve!
O tesão de um poeta é poetar...
E a poesia cantar em foda breve!"


Como anda tudo de saco cheio, o Bartolomeu dá uma segunda (ode):

"Sem cuecas vou p'rá cama
Já de pixota bem dura
Vou comer a cona à Ana
Aquela cona tão pura

Levo o caralho na mão
E a língua aos saltinhos
Ela já geme de tesão
Eu, exibo os pergaminhos

- Dá-me o teu bacamarte -
Com voz rouca, diz-me ela
- Fode-me com toda a arte
Ou atiro-te pela janela

Foi-se-me abaixo o tesão
Perante tão grande ameaça
Mas para não lhe dar razão
Mandei-lhe a língua à conaça

Nas suas mãozinhas de prata
Depositei-lhe o mangalho
Depois, espetei-lho na rata
Nunca tive melhor trabalho

- Come-me o cu depressinha -
Ordenou-me com precisão
Fui buscar óleo à cozinha
E lambuzei-lhe o cuzão

Depois bem devagarinho
Apontei-lhe a carola
Comi-lhe o cu com carinho
E acabei na ratola!"


O Santoninho não pode ver nada e ode outra também:

"Um poeta faz amor, rimando...
Dedilhando os lábios pelos seios,
Sentindo o coração da musa, arfando...
E usando os dedos, sem receios!

Ah! O que o poeta não faz pela mulher...
Ao ouvido lhe diz versos por que ela anseia...
E lhe deixam os membros a tremer!
A mulher, para um poeta, é uma teia...

Segreda versos, canta-lhe a beleza...
De carícias quentes, o corpo lhe regala!
Em cada gesto que a prende, há certeza
De que o poeta quer a musa, p'ra mimá-la!"


O OrCa odeu lá em cima, mas vale a pena repetir a ode aqui:

"ó palavras que me encheis a boca tanto
quanto o pranto preenche a alma vazia
ó palavras que me encheis de tal quebranto
quanto a fome de comer me dá azia

ó palavras que abocanho verso a verso
num poema sem tamanho apetecido
ó palavras com que mordo o universo
ao ficar de tanta fome remordido

ó palavras vinde a mim – tomai-me todo
tende em mim no corpo todo uma guarida
ó palavras dai-me alento se não fodo
pois sem vós nem sei bem que faça à vida

ó palavras de cumprir cada destino
elegantes ou de perfil curto e grosso
ó palavras contra a fome que abomino
dai-me alento que estou pr’àqui que nem posso

ó palavras minhas irmãs ou amantes
masturbáticas solenes coniventes
ó palavras que não fique como dantes
tudo em volta ao sairdes dos meus dentes!"


Julgavam que isto ia arrefecer? O Santoninho não deixa:

"Olha! As palavras que se fodam!
Os pensamentos que se enterrem.
Os cus e as conas que se comam
E os lábios e as línguas... desemerdem!

E que os falos profanem os lugares sagrados,
Num contínuo vaivém de mete e tira...
E deixem cus e conas lambuzados
E a paisagem seja linda, p'ra quem mira!

E beija, beija a flor que se te oferece!
E deixa em cada beijo... um suspiro...
E aquece aquela boca que arrefece!"

Deuses

Ultimamente só ouvia o estrondo. Não podia recuar; o caminho atrás de si era um abismo. Sentado à sua frente, o homem peludo, completamente nu, dava gargalhadas. Era Deus.

Versos no meu corpo



Sopra um poema
Desnudo no meu corpo
Caminho gravado em mim
Sob o silêncio da lua

Versos sensuais
Em ondas de paixão
Intensa volúpia
Escrita na minha pele

Forte desejo
Dedilhado com luxúria
Implorado na tua boca
Estrada insaciável de amor

Ardentes chamas
Provocadas por teus beijos
Vontades supremas
Queimando meus segredos

Teu olhar quebra quimeras
Invade a privacidade latente
Do meu corpo excitado
Estrofe lasciva de cobiça

Quero para mim
Esse poema esquecido
Essência derramada
Sorvida no prazer

Sopra um poema
No meu peito aberto
Que escorre molhando o papel
Dos versos gravados no meu corpo




Maria Escritos
http://escritosepoesia.blogspot.com

Lucía, gabinete de sexologia -"Riem-se de mim!"

Mais uma história do livro «Lucía, gabinete de sexologia», com a autorização de publicação pela editora el Jueves:




09 março 2010

O que é ouro sobre azul?

É a voz do Luís Gaspar a ler a poesia erótica da Paula Raposo (sim, essa moça que me dizia há poucos meses atrás que não escrevia poesia erótica).
Aí têm ouro sobre azul:

Poesia erótica 46 - Paula Raposo

InVocações

Abracei-o. Então percebi. Era uma árvore. Tantos ramos, tantos ramos cobertos de sentenças azuis, vestidos de veludo; um abraço denso, enraizado no meu corpo - tantos ramos - a beleza terna, perfeita; o amor tão imenso que reflecte a sua impossibilidade como uma condenação de rara beleza, escreve-se como um reflexo da lua em prata numa noite que era negra. E quando a lua sobe mais alto, as sombras descem. Era uma árvore. E eu era uma cor que empalidecia, uma criatura translúcida, amarrada ao tronco fundo por ramos. Sinto a seiva a sair de nós e choro. Ninguém me disse que aqui era assim. Vejo um autocarro a passar no prisma do mundo que é o teu. E então percebo. Não estamos juntos - eu agarro-me a ti e tu agarras-me mas estamos em mundos separados. Sentamo-nos e já não rimos - como antes - sentamo-nos onde os mundos se tocam; a bebida que me serves deita fumo e o fumo soletra que, um dia, um de nós vai conseguir andar pelos dois mundos. És tu - soletrou o chá - escreve as tuas palavras na barreira dos limites, elas são mágicas, as tuas palavras, ele é o homem mágico que te ensinou as palavras mágicas. Escreve-as muitas vezes, tantas vezes as hás-de escrever que, um dia, nem vão ser palavras, vão ser apenas magia e as portas do mundo abrem-se. O autocarro passou no teu mundo, no meu passou um coelho cor de rosa sem orelhas, era surdo. Estavas nu, meu encanto, meu desejo, meu amor, tinhas frio por mim, tapei-te no lençol liquido do meu olhar - sempre te aqueceu. Dá-me o sumo do sono do transe e a tua mão morena. Toma a minha mão branca. Somos um desenho. Agora, o autocarro também é do meu mundo, dança na água, os passageiros riem porque, pela primeira vez na vida, o seu dia não é um absurdo. A magia das palavras ganha força, amor. Vê como ganha força. Um dia, amor, um dia, o meu mundo vai enfeitiçar o teu - só com palavras. Sente-me crescer, é para ti.

«Rockabaret» - performance...

... gravada no Gobden Club emn 16 de Setembro de 2006 e relembrada pelo Robes Pierre no Clube d'a funda São no Facebook.