19 abril 2010
Mais fome de ti
Ninguém escreveu ainda as palavras que consigam traduzir o que sinto por ti.
Sim, por ti.
Porque é que me olhas com esse sorriso malandro?
Por quem havia de ser?
Por quem mais sinto sede e fome, como se tivesse caminhado sedenta e faminta durante um tempo que me pareceu uma eternidade?
Sim, aos olhos dos deuses esse tempo não durou mais do que um instante. Mas para mim traduziu-se na eternidade. Num «para sempre», vivido aqui e agora.
O instante só faz sentido quando recordo o primeiro olhar com o qual me provocaste um arrepio na espinha, como se o mundo fizesse «pausa» e nada mais acontecesse em parte alguma.
Nesse momento, nesse preciso momento e instante, e agora (mais do que nunca) senti (e sinto) que um vazio no meu ser encontrava algo que o completa. Havia uma fome de amor (em mim) que encontrou (em ti) o espaço e o tempo certos. Diria mesmo, perfeitos.
Mais que perfeitos. Mais fome (e sede) de ti.
Por isso, hoje sento-me à máquina para te escrever e acalmar a sede e a fome. Guardo a esperança secreta da minha escrita ser (por ti) surpreendida e o meu pescoço (por ti) seja beijado.
Ninguém escreveu ainda as palavras que consigam traduzir o que sinto por ti.
Excepto eu.
Projecto Olhar a Palavra
Texto de Joana Sousa
Fotografia de João Paca
Marionetas
Quebram os espelhos que as fizeram mulheres demasiado cedo. Tranças desmanchadas por reflexos. Tranças cortadas por cacos... Mas as imagens, agora aos pedacinhos, devolvem bocadinhos das meninas. Sem tranças. De cabelos apanhados ao alto pela firmeza aparente das mãos. Guardam, bem escondido, o laço das bonecas com que já não podem brincar. Ficou o armário vazio e a vontade silenciosa de o encher de fantoches.
À primeira vista
Um olhar cristalino, um sentimento genuíno daqueles que julgamos perdidos quando a infância se despede.
Um olhar que nos impede de ignorar a mensagem por detrás, aquilo que a alma é capaz de revelar quando se permite espelhada sem reservas no lago tranquilo das emoções serenadas pelo tempo seu amante.
Um olhar que não se revela distante numa pose encenada, não se camufla numa visão mascarada por falsos pretextos, fracos contextos ou qualquer outra distracção desnecessária.
Um olhar que espelha uma memória conservada da emoção menos filtrada pelo processo de erosão que não acontece no coração (que só entende a liberdade) mas apenas na mente que reinventa a realidade ao sabor de caprichos do tempo que arrasta como uma brisa aleatória os detritos de uma história rabiscada numa folha de rascunho condicionada por meros factores circunstanciais.
Um desejo sem estímulos artificiais contido num beijo clandestino, apressado, que sela um pacto firmado no devir da confiança que um olhar pleno de esperança jamais consegue ocultar.
Um olhar que nos impede de ignorar a mensagem por detrás, aquilo que a alma é capaz de revelar quando se permite espelhada sem reservas no lago tranquilo das emoções serenadas pelo tempo seu amante.
Um olhar que não se revela distante numa pose encenada, não se camufla numa visão mascarada por falsos pretextos, fracos contextos ou qualquer outra distracção desnecessária.
Um olhar que espelha uma memória conservada da emoção menos filtrada pelo processo de erosão que não acontece no coração (que só entende a liberdade) mas apenas na mente que reinventa a realidade ao sabor de caprichos do tempo que arrasta como uma brisa aleatória os detritos de uma história rabiscada numa folha de rascunho condicionada por meros factores circunstanciais.
Um desejo sem estímulos artificiais contido num beijo clandestino, apressado, que sela um pacto firmado no devir da confiança que um olhar pleno de esperança jamais consegue ocultar.
18 abril 2010
Macho
Antes de te saber
pensei-te precipício,
abismo insondável
de uma vaga alterosa;
pensei-te macho
-puro ainda-
feito de magia
e reencontros.
Pensei-te longe,
sempre tão longe,
tudo antes de te saber.
Foto e poesia de Paula Raposo
Alda: conto difícil
Sentamo-nos, uma vez mais, nesta fracção de segundo onde moras. Sim, há espaço para os dois neste instante; mas é só neste instante que nós cabemos. É no momento que somos, colados a saliva num tiquetaque dentro de um envelope remetido para mais tarde ou nunca mais. Eu sei que é difícil; que o entardecer mais perfeito é o mais breve; que o envelope se enche de trivialidades que nos fazem transbordar; que eu não sou quem não sou. Eu sei que, tantas vezes, um anzol rasga até romper, sem retirar das águas o peixe ferido. E sei que, ainda assim, esse é o anzol piedoso. Eu sei. É difícil. Mas é infinitamente mais difícil, para mim, estar sem ti. Para ti é mais fácil.
«D&G Perfume Anthology» - Cores diferentes para diferentes estados de espírito
E as gravações do anúncio:
17 abril 2010
Ora! Ide-vos...
Aqui jaz o amor romântico - reza a minha campa. Deixo-vos, oh tristes
criaturinhas, a minha última imagem, a que me mereceram; sim,
essa, a universal, o dedo que orgulhosamente vos estico.
Fodei-vos,
imitadores de terceira categoria, fodei-vos vós que nem vos sabeis
desgraçar patética e honradamente como qualquer amor que se preze
exige.
Fodei-vos, vós que percorreis os jardins da ponderação e que
deitais fora, como quem deita fora um par de calças usado, o bom do
amor impossível e suas vicissitudes febris, tresloucadas, de peça única por um
moderno par de jeans de ganga, fabricado aos milhares, exactamente
igual amorzinho-que-vem-a-calhar ou
amor-não-lá-muito-conveniente-vamos-dar-apenas-umas-quecas-ao-fim-de-semana-que-´tá-na-moda.
Fodei-vos, vós que não tendes conhecimento da ânsia enfurecida e
estupidificante que faz qualquer amante - que faça justiça a essa
designação - morrer de marasmo longe da amada criatura.
Fodeis-vos, vós
que perante o amor não ficais convencidos que conseguis beber os
mares e rasgar os céus se for isso que torna um novo encontro possível.
Fodeis-vos mais as vossas análises de carreira, estatuto, opinião
familiar e outras contas de somar essas e outras parvoíces semelhantes.
Fodeis-vos,
vós que sois capazes de fazer todas essas somas e, ainda assim,
permaneceis convencidos que amais até ao tutano. Tédio até ao tutano,
é o que sois. Barris que envelhecem de grande pança, sem nada de
realmente muito emocionante para relatar.
Fodei-vos, seus incapazes de
uma boa "desgraçadelazita", de um trambolhão que fractura costelas já em
pandemónio e que ainda ajuda - apesar das lesões que causa - o coração a mexer
mais livre, mais forte, mais perdido.
Fodei-vos, seus
pseudo-românticos da estabilidade e do politicamente correcto.
Fodei-vos, vós que sois a vergonha de Romeu e Julieta - neste século
não se fará história, nem no amor, nem na política, nem na economia,
nem sequer nas vossas cuecas - este é o século dos
palhaços-sempre-com-a-mesma-máscara-de-ponderação-insonsa-a-dormir-em-pé. Pois, Romeu e Julieta que
dão-quecas-confortáveis-às-escondidas-que-fugir-aborrece-o-papá-e-a-mamã,
não me quer parecer que façam nada de muito notável em qualquer outro
capítulo se nem a força visceral do amor os move; casam com o
semelhante mais próximo, se casar não for muito inconveniente a nível
fiscal, compram casa e carro, talvez tenham um filho ou dois se der
jeito, engordam e envelhecem. E sentem que lhes falta algo. Sempre o
vazio, sempre a semi-infelicidade inexplicável, sempre o "vai-se
andando", o "estou mais ou menos".
Pois, fodei-vos todos, seus
parolos macambuzios da cantiguinha amorosa da juke-box. Fodei-vos de "moeda" entalada na vossa "ranhura"! Ide-vos! E tu? Sim, tu... Tu também!!!
criaturinhas, a minha última imagem, a que me mereceram; sim,
essa, a universal, o dedo que orgulhosamente vos estico.
Fodei-vos,
imitadores de terceira categoria, fodei-vos vós que nem vos sabeis
desgraçar patética e honradamente como qualquer amor que se preze
exige.
Fodei-vos, vós que percorreis os jardins da ponderação e que
deitais fora, como quem deita fora um par de calças usado, o bom do
amor impossível e suas vicissitudes febris, tresloucadas, de peça única por um
moderno par de jeans de ganga, fabricado aos milhares, exactamente
igual amorzinho-que-vem-a-calhar ou
amor-não-lá-muito-conveniente-vamos-dar-apenas-umas-quecas-ao-fim-de-semana-que-´tá-na-moda.
Fodei-vos, vós que não tendes conhecimento da ânsia enfurecida e
estupidificante que faz qualquer amante - que faça justiça a essa
designação - morrer de marasmo longe da amada criatura.
Fodeis-vos, vós
que perante o amor não ficais convencidos que conseguis beber os
mares e rasgar os céus se for isso que torna um novo encontro possível.
Fodeis-vos mais as vossas análises de carreira, estatuto, opinião
familiar e outras contas de somar essas e outras parvoíces semelhantes.
Fodeis-vos,
vós que sois capazes de fazer todas essas somas e, ainda assim,
permaneceis convencidos que amais até ao tutano. Tédio até ao tutano,
é o que sois. Barris que envelhecem de grande pança, sem nada de
realmente muito emocionante para relatar.
Fodei-vos, seus incapazes de
uma boa "desgraçadelazita", de um trambolhão que fractura costelas já em
pandemónio e que ainda ajuda - apesar das lesões que causa - o coração a mexer
mais livre, mais forte, mais perdido.
Fodei-vos, seus
pseudo-românticos da estabilidade e do politicamente correcto.
Fodei-vos, vós que sois a vergonha de Romeu e Julieta - neste século
não se fará história, nem no amor, nem na política, nem na economia,
nem sequer nas vossas cuecas - este é o século dos
palhaços-sempre-com-a-mesma-máscara-de-ponderação-insonsa-a-dormir-em-pé. Pois, Romeu e Julieta que
dão-quecas-confortáveis-às-escondidas-que-fugir-aborrece-o-papá-e-a-mamã,
não me quer parecer que façam nada de muito notável em qualquer outro
capítulo se nem a força visceral do amor os move; casam com o
semelhante mais próximo, se casar não for muito inconveniente a nível
fiscal, compram casa e carro, talvez tenham um filho ou dois se der
jeito, engordam e envelhecem. E sentem que lhes falta algo. Sempre o
vazio, sempre a semi-infelicidade inexplicável, sempre o "vai-se
andando", o "estou mais ou menos".
Pois, fodei-vos todos, seus
parolos macambuzios da cantiguinha amorosa da juke-box. Fodei-vos de "moeda" entalada na vossa "ranhura"! Ide-vos! E tu? Sim, tu... Tu também!!!
IBIZA FUCKING ISLAND
16 abril 2010
Adelaide(s): conto dos actos
Existo aqui. Sem gritos. Sem mim. Vejo televisão. A rapariga de longos caracóis percorre a sequência de cenas que a leva a um acto irreversível. Não! Impeçam-na, impeçam-na, impeçam-na... Impeçam-me...
Aqui
Sei de ti aqui
porque te sinto
e me beijas;
abraças e me deixas
o teu cheiro
nos lençóis.
Deixas-me a nuvem
do teu orgasmo
no silêncio sem silêncio,
no grito e no espasmo;
deixas-me
a luz do momento
numa palavra
enlouquecida
entre o vento e a calmaria.
O estupor
e a felicidade,
que o sonho não me deixe
nem se desfaça
e a nuvem permaneça
em mim.
Foto e poesia de Paula Raposo
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