30 janeiro 2011

Dos elefantes no peito

Que tudo me doa assim, intensamente. Antes
a dor que o cinzento em todas as coisas;
que mordam o ódio, a dor, a verdade, entredentes
e que possam sair na fúria cega das palavras.
Serena-me mas nunca me acalmes. Por mais que tentes
eu agarro a violência, a chama, a paixão e as lágrimas;
na selva do peito hão-de ecoar como centenas de elefantes
em corrida, o forte estrondo da liberdade pelas florestas.

«Quinze contos para nada» - por Rui Felício


O Alberto, caixeiro viajante, vivia em Coimbra, mas passava a semana fora, a vender os seus produtos por todo o País.
Sempre que calhava passar por Penamacor, hospedava-se na Pensão Alzira. Era como se já fosse da casa. A Alzira e o João, seu marido, tratavam-no como se fosse da família.
Certa noite, depois de jantar, sabendo que o João tinha ido a Lisboa tratar de um assunto e que o comboio da Beira Baixa só o traria de volta cerca da uma da manhã, dirigiu um lânguido olhar à Alzira e fez-lhe uma inesperada proposta. Dava-lhe 10 contos se ela fosse para a cama com ele antes de chegar o marido.
Ela saiu da sala esbaforida e voltou pouco depois com um enorme facalhão, com ar ameaçador.
Disse ao Alberto que até não lhe desagradava a ideia, mas que jamais faria nada sem que o marido concordasse. Por isso, iriam esperar pela sua chegada e ela perguntar-lhe-ia se ele a autorizaria a aceitar o negócio.
O Alberto, aflito, ainda lhe pediu várias vezes para ela esquecer a proposta que num momento de loucura ele lhe fizera.
Mas a Alzira estava decidida! Apontou-lhe a faca perto da garganta. Esperariam e ela faria aquilo que o marido achasse melhor.
Por volta das duas da manhã, o João entra em casa, beija a mulher, olha o Alfredo compungido e encolhido a um canto e perguntou o que se passava.
- Aqui o nosso amigo Sr. Alberto fez-me uma proposta muito interessante! - disse a Alzira.
- Ofereceu-me 10 contos para nos comprar aquela mula velha e meio cega que temos no quintal. Mas eu não quis decidir nada sem tu vires. Resolve tu! – continuou ela, dirigindo-se ao João...
O Alberto, até aí, calado e assustado, fez um sorriso rasgado, virou-se para o João e disse-lhe:
- A D. Alzira está equivocada Sr. João. Eu ofereci foram 15 contos.
O João, espantado, tartamudeou para a mulher:
- Oh Alzira, então era preciso esperares por mim? Aquela pileca nem um conto de réis vale, mulher!
Olhou o Alberto e disse-lhe:
- Meu amigo, a mula é sua! Dê cá os 15 contos!
No dia seguinte, o Alberto arrastou a mula por uma corda a caminho da fronteira. Dois quilómetros mais à frente, puxou da pistola que habitualmente trazia consigo, deu dois tiros no animal e encaminhou-se à estação de Fatela para apanhar o comboio...

Rui Felício
Blog Encontro de Gerações

Estas checas vão-me ajudar...

... a explicar-vos a diferença entre um museu do erotismo e a minha colecção de arte erótica.
Este museu do erotismo que elas apresentam é em Praga. É o Museu das Máquinas do Sexo. A minha colecção, embora tenha uma ou outra peça de brinquedos sexuais, é de arte erótica.



Agora... algum gajo ou alguma lésbica viu mais do que duas checas boazonas?

Hip! Hip! Hurra!

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29 janeiro 2011

Sol posto


Viu-a sair da porta com a certeza absoluta de que saía da sua vida também, mas nada fez para a impedir. Achou que precisava de decidir e ela não deixava porque sempre que ele pensava ela interrompia e o barulho que fazia era algo que impedia um pensamento de fluir.
Preferiu deixá-la sair, sem alarido, sem luta, pois não tinha nada em disputa que o motivasse para tentar barrar-lhe o caminho, apetecia-lhe ficar sozinho por algum tempo e isso proporcionava-se naquele momento em que ela agiu em conformidade com a dura realidade da sua relação moribunda, a vontade ausente, perdida, o hábito e pouco mais a justificar a presença de qualquer deles naquela ligação interrompida por alguma razão, ou várias, que nem conseguia agora encontrar por entre as vagas memórias do muito que correra mal.
Preferiu aceitar o final e entendê-lo como o mais lógico corolário de um amor cujo inventário há muito denunciava a escassez, sentia que perdia mais de cada vez que insistia e depois ela não saía mas apenas se prolongava de forma artificial um romance que correra mal logo à partida, anunciando a despedida que nem chegaria a acontecer porque ele preferiu deixá-la sair sem uma palavra proferir que pudesse levá-la a resistir ao apelo que esboçara ao longo dos meses em que bocejara o seu enfado indisfarçável e lhe provou ser inviável a manutenção de um amor sem emoção, abaixo das expectativas criadas.
Deixou correr as águas passadas e concentrou-se, apoiado no parapeito da janela, no horizonte de onde o sol se preparava igualmente para partir.

Hálito

Ficou-me na boca
o hálito dos teus beijos
-naquele final de tarde-
não mais resistindo
ao apelo instintivo
de nos amarmos.
Um dia seremos
as fiéis testemunhas
de nós próprios.

Poesia de Paula Raposo

Aprendam a dançar com uma mulher árabe

Pesca



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28 janeiro 2011

Eu e a Naomi Wilzig

Este artigo da UOL sobre o WEAM (World Erotic Art Museum) fez-me lembrar as minhas desventuras quando comecei a adquirir peças para a minha colecção nos leilões do eBay norte-americano (agora já há eBay em muitos outros países).
As melhores peças eram todas açambarcadas por uma tal de Miss Naomi. Se eu oferecia, por exemplo, um máximo de 200 dólares por uma peça, ela ganhava com um valor 5, 10 ou 20 vezes superior.
Fosse quem fosse, era alguém com muito dinheiro e que não olhava a custos para obter as melhores peças.
Entretanto, passados poucos anos, soube da criação do WEAM em Miami (E.U.A.) por uma senhora milionária de 75 anos, de seu nome Naomi Wilzig. Soube então que ela, nas suas viagens, punha uma placa ao pescoço a dizer «Buy Erotica».
São um pouco mais de 1.000 m² com o acervo particular da Miss Naomi, "uma colecção avaliada em 10 milhões de dólares e que reúne 4.000 peças como esculturas, quadros e até móveis". "O WEAM consegue surpreender o visitante com obras que vão desde 300 a.C. até trabalhos contemporâneos. As mais de 20 salas do museu são divididas em temas como antiguidades, culturas orientais, art deco e art noveau, mundo gay e trabalhos mais recentes, como a prótese peniana utilizada no polémico filme «Laranja Mecânica», de Stanley Kubrick".
Como refere o director de arte do WEAM no citado artigo, “o que se vê no museu não é pornografia, é o mundo unificado num acto erótico”.
Aqui vos deixo algumas fotos do WEAM:


E eu? Quando terei um espaço aberto ao público com a minha colecção, com mais de 2.000 peças e de 1.600 livros? Como costumo dizer, tenho peças que a Miss Naomi gostaria de ter...

Mistério bíblico

Será que quando o cabelo de Sansão foi cortado por Dalila ele também perdeu a força na pila?

Tradução de Mulher

Não precisei de ter um filho; eu fui mãe no recreio da escola, mãe do menino que jogava à bola e caiu, fui beijar onde doeu, embalei quando perdeu; mãe e mulher ainda menina e só o colo me cresceu. Quando parou de doer, o menino continuou a correr, já cansado sentou-se no muro, ao meu lado estava sempre seguro, veio comer o pão com queijo, nada de mais, dividiu como quem dá o beijo, menina e mulher, amante antes do desejo sequer nascer. Fui amiga, fui rapaz e fui rapariga, irmã, fui namorada, fui a filha endiabrada, a cúmplice de mão dada, fui tudo antes de o ser. E agora, que perdi o rapaz do recreio da escola - esse tempo faz o peito crescer - ainda o encontro no peito do menino-homem que me chama para ser mulher.

preliminarmente...

A coisa passa-se assim: mulher que é mulher tem de mexer comigo. Tem de haver ali alguma coisa entre a sugestão e o pecado, com laivos de poesia à mistura, que lhe deslize pelo corpo, que lhe escorra pelos dedos e que desabroche num sorriso.

Tem de haver curvas, claro, mas curvas de nível, como coisa inusitada mas persistente. Localizadas, certeiras, previsíveis e, ainda assim, contendo em si o mistério de um poema, deixando depois a cada um e a cada gosto o sentido da justa proporção das coisas.

E tem de haver, também, saboneteiras, como dizia o velho Vinícius de Morais, que mulher sem saboneteiras é senhora de menos graças. E os joelhos são fundamentais, de personalidade definida mas sem imporem a ossatura; tal como a curvatura interna da coxa, essa inefável raiz da coxa, – tem de se impor pela suavidade do contorno, mas é imperativo que ele marque presença. E aí então, ao toque, deve prevalecer um arrepio de veludo, apenas perceptível de olhos semicerrados.

No percurso dos seios até às nádegas, a óbvia e necessária sugestão de violoncelo. E as coxas, depois, devem ser pródigas, parideiras, mas nunca excessivas. Por isso as nádegas devem desenhar-se em espaços algures entre o pêssego e o sonho e afirmarem a sua presença gloriosa depois de uma cintura bem marcada.

Entre o umbigo, o ventre e o monte de Vénus deve existir uma cumplicidade de vales e colinas, onde cada elemento se complementa e se sequencia como regra constante do universo, como valsa impossível em vergel inventado.

Sempre a barriga da perna deve conter a simetria com a sua irmã gémea, num sobressalto claro do joelho, que a anuncia, e do artelho, que a remata, e com proporções tais que façam empalidecer de inveja as colunas gregas da antiguidade clássica.

E pode até haver marcas da guerra dos dias, refegos de parto ou de assim ser, vincadas, ténues ou profundas, como a Vida, mas tudo deve assumir a volúpia de ali estar apenas porque sim e serem assumidas e servidas, sempre em regime de profundo e assumido voluntariado, à mesa ou à cama ou, mesmo, no tapete da sala ou, ainda, no desconchavo anárquico de uma súbita urgência, no esplendor da relva de um jardim ou de um esconso discreto de escada, como no rebordo rumorejante da onda salgada, mas indubitavelmente como uma bandeira de carne e coração na explosão de um momento.

Tem de haver essa conjugação de sentir, de querer, de estar e de partilha, de se dar tanto ou mais de quanto se recebe, no turbilhão que afoga os corpos e os liquida em êxtases de volúpia. Mulher com reservas de pudor, mentais ou físicas, é – como acontece com o homem – o inevitável acto falhado, a infelicidade do desperdício, a comédia triste do melodrama.

Os fluidos devem fluir… fluidamente, na exacta apetência dos sentidos, no fulgor inexcedível da circunstância, na fruição da natureza em grito a plenos pulmões, nem que seja sob a forma de um murmúrio, de um espasmo gorgolejante, de um ai que mal se entoa.

E a mulher é feita também de cabelos. Curtos, compridos, lisos, ondeados, encarapinhados, fulvos, morenos, alourados, onde os nossos dedos se emaranham, se embaraçam na tepidez da nuca. E uma leve penugem, também, que sobrevenha em recônditos descobertos de um corpo, pode ser factor determinante.

Em tudo, aquela cadência de veludo, ao correr dos dedos e uma mistura de quente e de frio só decifrável nesse nível de impressão digital deixada muito levemente sobre a pele.

E depois há sorrisos, cúmplices de olhares, que só existem quando a mulher é.

E aí se realizará um momento perfeito.