– E agora, José?
O nomeado olhou desconfiado a mulher que o nomeara e, sem se mexer, replicou:
– Agora o quê?
– Nada – respondeu a mulher, arqueando ligeiramente as sobrancelhas. – Queres mais alguma coisa? – perguntou, servil.
José flectiu e esticou os braços como se fizesse uma flexão, olhou para as mãos abertas espalmadas no lençol e para os ombros nus da mulher. Apreciou-lhe o contorno do pescoço, estudou-lhe o rosto vistoso, fixou-se nos olhos amendoados, tanto na forma como na cor e respondeu: – Não, porquê?
– Não queres mais nada? – insistiu a mulher.
– Não – repetiu José, enfastiado com a insistência.
– É que se saísses de cima de mim eu ia-me lavar – disse a mulher, com o tom mais suave e cordial que conseguiu.
– Ah… – Surpreendido mas sem se mexer, José soltou uma gargalhada e continuou a rir. – É que eu estou tão habituado a foder e a não sair de cima que até me esqueço – confessou com inusitada franqueza.
A mulher sorriu, um sorriso forçado mas bem disfarçado, e não respondeu: não sabia o quê. José flectiu o braço esquerdo, rodou o tronco e as pernas e caiu de costas na cama, ainda a rir.
Em silêncio, a mulher levantou-se e foi-se lavar. “É pena que o país não se lave assim, com esta facilidade”, suspirou para si sentindo a água quente escorrendo-lhe purificadora por todo o corpo.
No quarto, o homem ainda lançava gargalhadas e “porreiros” como se tivesse dito alguma coisa com graça e a mulher, ouvindo-o enquanto se esfregava com exagerada energia, decidiu ir no dia 12 à manifestação. “Que te lixes, José!... Vou e vou ser mais uma gota para ver se te lavamos de vez.”