22 outubro 2014

o sexo do supremo

Raim on Facebook

Velhas Virgens - «abre essas pernas»

«a violência feminina» - bagaço amarelo

Na verdade, não tenho nenhum exemplo de casamento feliz à minha volta. Digo isto com alguma segurança desde que percebi que, para a maior parte das pessoas, a felicidade num casamento vem sempre temperada com alguma resignação. A F. não foi excepção.

- O meu casamento foi bom! - disse ela.

Nessa altura já estava na fase de arrumar todos os livros que tirara das suas inúmeras e preenchidas prateleiras para me ler, a espaços, uma frase escolhida de cada um. Eu estava impressionado com a sua capacidade para memorizar frases chave de romances e, admito, ainda mais por ser capaz de as encontrar com relativa facilidade.

- Quer dizer... não foi mau. - continuou.

E eu ri-me, não por achar piada à frase mas porque não sabia como reagir. Aquela verdade deixava-me nervoso porque ia de encontro ao que eu acabara de concluir nos meus trinta e cinco anos de vida: um casamento bom é um casamento que não é mau.
A F. ia organizando os livros por autores. As frases todas que me lera estavam preenchidas de vida. De Amor, de ódio, de viagens, lágrimas e abraços. Talvez em silêncio tenhamos tirado mais ou menos a mesma conclusão. Os nossos casamentos, por pouco maus que pudessem ter sido, tinham-nos tirado essa vida que ela acabara de resgatar daquelas páginas soltas.
Assim que a mesa ficou desimpedida, desapareceu por um minuto ou dois e voltou com uma garrafa de uísque e dois copos. Ela própria nos serviu, sem me perguntar se eu queria beber ou se preferia puro ou com gelo. Dei o primeiro gole apenas para lhe mostrar que estava de acordo com tudo. Depois cruzei as mãos e foi a primeira vez que a olhei olhos nos olhos. Reparei que era das mulheres mais bonitas que eu já tinha visto.
Enquanto o seus cabelos pretos lhe banhavam os ombros como uma suave maré cheia, fui percebendo a forma como o seu ex-marido se apaixonara perdidamente por ela muitos anos antes. Provavelmente, eu estava a viver exactamente as mesmas sensações que ele. O ar começava a entrar e sair dos meus pulmões com alguma dificuldade e não encontrava as palavras certas para lhe responder a nada. Acabei por dar um gole sôfrego no uísque e tentar concentrar-me no que ela dizia.

- As mulheres têm uma violência dentro delas que os homens não são capazes de perceber.
- Ahn?! - estava assustado.
- Durante anos observei a lenta degradação do meu casamento na expectativa de que o meu marido se apercebesse do mesmo que eu. Queria que ele chegasse à conclusão que o nosso Amor não merecia acabar assim, como um velho que se vai encolhendo até morrer...
- E ele apercebeu-se?
- Claro que não. Todos os dias saía de casa para trabalhar e voltava como se tudo estivesse normal, mesmo naquelas fases em que passávamos dois meses sem sexo. E eu todos os dias ia tendo cada vez mais pena dele...
- É essa violência que dizes que só as mulheres é que têm?
- Sim, exactamente. Observei-o durante anos como se ele fosse um rato de laboratório, porque era isso que ele era de facto. Até que um dia me cansei de o estudar e pus fim àquilo tudo com o divórcio.

Depois disto ela calou-se e senti os seus olhos, pesados, sobre mim. Naquele preciso momento o rato de laboratório era eu, que passara dum desejo enorme de a levar para a cama para uma estranha sensação de incapacidade total para fazer fosse o que fosse.
Imaginei-me, também eu, a ser o objecto de pena da minha companheira de vários anos. A sair todos os dias e a voltar para casa debaixo do seu olhar estudioso, mesmo quando passávamos dois meses sem sexo. Imaginei-a a questionar-se sobre o meu comportamento mecânico e diário, como se fosse possível assim fugir à desilusão da própria vida.
Com o terceiro gole acabei o uísque e, sem pedir licença, servi-me de outro. O copo da F. ainda estava cheio.
Acabara de me aperceber que eu próprio, sem ser capaz de o perceber, sentira essa violência feminina durante anos, como se um chicote silencioso todos os dias me abrisse mais uma ferida invisível na pele. A normalidade da vida passara a ser uma merda e eu adaptara-me cobardemente a ela. Mesmo assim, apesar de tudo, tinha sido ela a salvar-me, essa violência feminina.
A F. ainda me olhava em silêncio, com um sorriso que indicava ser capaz de ler os meus pensamentos.

- Vamos para a cama? - perguntou.
- Sim.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Passo a passo



21 outubro 2014

«Voando só: uma viúva transgénero luta contra a discriminação» (documentário)

Aos 92 anos de idade, Robina Asti, um veterano e piloto da Segunda Guerra Mundial, conta a sua história de vida como uma mulher transexual desde 1976 e a sua luta para ser tratada como qualquer outra viúva.


Flying Solo: A Transgender Widow Fights Discrimination from Lambda Legal on Vimeo.

Pequenos mas trabalhadeiros: erguei-vos!

Farto-me de ouvir elogiar os pequenos prazeres da vida. Avancem sem medos, companheiros de luta menos avantajados.

«de todos os momentos que foste» - Susana Duarte

de todos os momentos que foste, talvez não saibas ainda que o mais belo
foi o momento que antecedeu o beijo. foi o momento que o antecedeu,
e não o beijo, que mudou de lugar as madrugadas, moveu o ar das noites
e o luar das minhas manhãs. de todos os momentos que foste, o mais belo
foi a antecipação do futuro, ainda que, depois, se tenham perdido todas
as madrugadas das mãos. de todos os momentos que foste, o mais belo
foi aquele em que o abraço antecipava amoras, e as amoras eram beijos
rubros tingindo a manhã. de todos esses momentos, foste apenas um raio
de sol perdido entre os meus olhos. nada mais foste, pois não soubeste
raiar de luz as escolhas da tua vida. de todas elas, a mais fácil foi partir.
de todas elas, a mais imperdoável, foi partir. dos teus dedos, nada mais
ficou dos momentos que antecipavam o beijo, senão a mágoa das noites
sem dia, e dos dias em que te foste. de todos os momentos, a maior mágoa
é não teres sabido ser. de todas as madrugadas, esta será a mais triste.

Susana Duarte
Blog Terra de Encanto

Diabo com enorme falo leva uma mulher num carrinho de mão

Pequena mas maravilhosa, pelo seu detalhe, estatueta em bronze com base em mármore.
Uma das minhas peças favoritas da colecção.

Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)





20 outubro 2014

Delta Lingerie - «Grandma's Underwear» (a roupa interior da avó)


Delta Lingerie: Grandma's Underwear from kobi cohen on Vimeo.

«respostas a perguntas inexistentes (284)» - bagaço amarelo

depois de uma paixão de uma só noite

A partir da ponte, o Porto parece uma cidade de brincar. Uma criança qualquer desenhou uma série de casas, umas em cima das outras, e pintou-as da forma mais colorida que pôde. É bonito, aquele quadro do qual me afasto lentamente em direcção ao sul. Ainda ontem eu próprio fazia parte dele. Era mais um pequeno ponto daqueles que se passeiam à beira-rio como se andassem à deriva.
Afastar-me desta cidade lembra-me sempre o dia em que me despedi da S. Ela à janela, com as madeixas coloridas no cabelo, a ficar cada vez mais pequenina e eu em direcção ao sul, a pensar que ainda ontem tinha passeado nela como quem anda à deriva.
O problema das paixões de uma só noite é o dia seguinte, quando nos afastamos e entregamos todas as dúvidas sobre um Amor a um copo de uísque, à espera que ele nos explique aquilo que ninguém sabe. Sentamo-nos num balcão qualquer com um misto de tristeza e alegria, acho eu que tristeza por estarmos novamente sós e alegria exactamente pelo mesmo motivo, pedimos uma bebida e o tempo senta-se ao nosso lado a beber também até perder a noção de si mesmo.
Depois dessa paixão de uma só noite ficou um limbo, um vazio qualquer cheio de nada, e eu a perguntar ao uísque se devia ou não dizer-lhe qualquer coisa que fosse. Talvez o Amor só se dê quando não há dúvidas, quando nos atiramos a ele como uma criança para uma onda do mar, e enquanto o Amor não se dá o Não Amor vai remendando a alma.
O Porto é a minha cidade do Não Amor. Apaixono-me por ela todos os dias, sempre com dúvidas e hesitações.
O uísque respondeu-me que a S também não tinha dito nada. Depois de uma paixão de uma só noite.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Revelações indesejadas

Cuidado com seus desejos.



Capinaremos.com

19 outubro 2014

«Boobies... not a big deal» (mamas... não são lá grande coisa)


Boobies from Caity Hall on Vimeo.

Luís Gaspar lê «Ante o silêncio» de Manuela Barroso


No silêncio onde mergulhas a flor do pensamento verás
que nas pétalas da gente o vento não tem a força nem o
canto dele vence a eterna dança do Amor

No homem como na flor continua a valsa do vento
umas vezes
é trigo amargo
outras é mel onde trago
leve aragem ao pensamento

Na floreira da vida quando os ventos estremecem
o caule da flor tardia

os olhos escurecem perante a flor murchando
onde sem seiva fenecem os sonhos
que vão morrendo na flauta do vento.

(Do livro “Laços”, de Manuela Barroso e Teresa Gonçalves. Ed. Versbrava.)

Manuela Barroso
Maria Manuela Barroso Nogueira Martins Ferreira de Castro nasceu em Terras de Bouro. Frequentou a Universidade do Porto, onde se licenciou em Filologia Românica. Foi professora do Ensino Secundário, lecionando as disciplinas de Português e Francês.
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa