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«A menina do chapéuzinho vermelho e
o lobo relativamente mau»
Livro de José Vilhena, 1975
Colecção de arte erótica «a funda São» |
O Murta até nem era frequentador habitual do Café do Silva, mas ultimamente não falhava um dia.
Andava loucamente apaixonado e, naquele tempo, excepção feita aos bailes de garagem dos fins de semana a que ele e a linda rapariga acorriam pressurosos, os contactos nos restantes dias eram extremamente dificeis.
As raparigas eram mantidas numa férrea redoma.
Mesmo quando, excepcionalmente, tinham permissão para irem aos tais bailes, era habitual serem acompanhadas pelas mães que fiscalizavam o seu comportamento com olhos de lince.
Raras eram as familias que tinham telefone em casa e, mesmo naquelas onde o havia, seria impensável um telefonema de namorados se, como era o caso, o namoro formal ainda nem sequer tivesse sido autorizado pelos pais da moça.
Mas a necessidade aguça o engenho...
O pai da moça, cujo nome aqui omito por respeito à sua memória, usava chapéu como a maioria dos homens de então, e fazia parte das suas rotinas diárias, pendurá-lo num cabide atrás da porta da sua casa.
Colocava-o na cabeça sempre que saía de casa e voltava a pendurá-lo no cabide que existia no Café do Silva logo que ali chegava para tomar uma bica e jogar às damas.
Alisava o cabelo empastado de brilhantina com as palmas das mãos, secava-as às calças e sentava-se a uma mesa , convidando algum dos presentes para uma partida de damas, ou encetando alguma conversa acalorada sobre os últimos jogos de futebol do União ou da Académica.
O Murta aproveitava então a sua distracção e subrepticiamente retirava do forro do chapéu pendurado no cabide, um bilhetinho dobrado da sua amada.
Depois de o ler, escrevinhava nas costas do mesmo bilhete, uma dúzia de palavras carregadas de amor, voltava a dobrá-lo e recolocava-o no forro do chapéu.
Rui Felício
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