16 abril 2019

«escreverei» - Susana Duarte

escreverei à meia noite do poema,
onde se desfazem as pedras das calçadas
e os teus passos.

escolheste seguir as pedras de ontem,
e os caminhos levantaram o pó
dos teus passos.

escreverei à meia noite do poema,
onde o vento desfez a noite, ela própria
uma ave assustada ante a imensidão
do desejo.

morrem os corpos na espera,
enquanto a meia noite do poema se declina
na cor das cerejas.

é na confluência dos dedos
que se desocultam as noites dos corpos,
entidades desejantes, meia noite das vidas
nuas, encontro sobre o leito,
ventos-sul do peito,
quando a meia noite do poema
se escreve nas peles.

Susana Duarte
Blog Terra de Encanto
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Tubarão à vista!

Hoje é um bom dia para ir meter placas com a minha foto nas janelas dos imóveis que tenho para vender. Estou a tentar manter uma postura low profile e este nevoeiro cerrado atenua o inevitável alarido entre o mulherio das zonas em causa.
#Motivation


Sharkinho
@sharkinho no Twitter

Casal frente e verso

Pequena placa em jade recortado com imagem de um casal a praticar sexo, visto de ambos os lados.
Um trabalho meticuloso vindo da Ásia para a minha colecção.



A colecção de arte erótica «a funda São» tem:
> 2.000 livros das temáticas do erotismo e da sexualidade, desde o ano de 1664 até aos nossos dias;
> 4.000 objectos diversos (quadros a óleo e acrílico, desenhos originais, gravuras, jogos, mecanismos e segredos, brinquedos, publicidade, artesanato, peças de design, selos, moedas, postais, calendários, antiguidades, estatuetas em diversos materiais e de diversas proveniências, etc.);
> muitas ideias para actividades complementares, loja e merchandising...

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Quem quiser investir neste projecto, pode contactar-me.

Visita a página da colecção no Facebook (e, já agora, também a minha página pessoal)

13 abril 2019

«O atraso» - Fernando Gomes


Juvénio só pensa em encontrar a belíssima hospedeira que tão gentilmente lhe respondeu no curto diálogo que travaram durante o embarque:
— Desculpe, este voo está mais de uma hora atrasado, e a minha escala para apanhar o próximo é só de meia hora. Acha que chegamos a tempo?
— Sim, claro, não se preocupe!
— Tem a certeza? Estou muito apreensivo.
— Esteja descansado! Garanto que apanhará o outro avião.
O sorriso radioso colado aos olhos transbordantes de azul serenou-o.
Segundos depois, ao tomar o lugar na coxia, o atraso já não o apoquentava. Estava na quarta fila e não conseguia descolar os olhos da graciosa figura que ia cumprimentando os passageiros um a um. Não fosse a importância da viagem de negócios, desejaria que o atraso fosse eterno, que nada o separasse de tão celeste visão. O rumor dos passageiros que se acomodavam, o ronco dos motores, o choro do bebé duas filas atrás, tudo lhe soava longínquo e etéreo. Aquela beleza ofuscante arrebatava-o.
Aquando das instruções de segurança, a deusa posicionou-se tão perto dele, que Juvénio conseguia sentir na alma os gestos largos e mecânicos. Antes de guardar o equipamento de demonstração, ela piscou-lhe o olho e sorriu. Ele corou e engoliu em seco, mergulhado em suor. Pouco depois da descolagem, a beldade veio fazer-lhe companhia num sonho erótico, que, como de costume, ele não conseguiu consumar. Acordou sobressaltado entre gritos lancinantes e rezas aflitas. Antes que conseguisse aperceber-se da terrível força que a gravidade resolvera demonstrar, já se via rodeado por um Atlântico infinito.
Atordoado, tenta agora, desesperadamente, manter-se à tona e, acima de tudo, encontrá-la entre os destroços. Se ao menos tivesse ouvido as instruções de como insuflar o colete... De súbito, vislumbra a sereia, à deriva, flutuando na ponta quebrada de uma das asas. As forças a fugirem-lhe, consegue chegar suficientemente perto dela para soltar o que lhe vai no peito, antes de imergir para sempre no oceano devorador. Com a voz sufocada dos pirolitos, grita-lhe as últimas palavras:
— Sua mentirosa!

Fernando Gomes