15 setembro 2010

«Doce prazer» - por Rui Felício

Através de um olhar sensível e guloso ela foi a escolhida, entre outras.
Delicadamente, as mãos vão na sua direcção, tocam-na, acariciam-na...
A sua superfície húmida aumenta-lhe o desejo de a ter. Com medo de a magoar, deixa as mãos, levemente, com cuidado, girar em volta do seu corpo.
Começa a despi-la...
Detém-se perto do seu umbigo, de cada vez que as mãos por ali passam...
À medida que a pele branca vai aparecendo, apetecível, provocante, cresce-lhe água na boca, a respiração acelera-se e de repente, descontroladamente, sem pudor, o instrumento que minutos antes, com muito carinho, junto com as mãos, também a tocava e despia, entra profundamente no seu corpo, dividindo-o ao meio, explorando-lhe as entranhas.
Sofregamente, aproxima a boca, abre-a, coloca-a sobre o corpo desejado e chupa-lhe o sumo saboroso, agridoce, que a cada movimento ela deixava escorrer de dentro de si. Como se essa fosse a última coisa que ele faria na vida.
Vai-se deliciando, desfrutando o seu gosto, aqui, acolá , em todo o lado...
Tenta prolongar o momento, mas a sua ânsia crescente , faz com que tudo acabe em breve.
Ela amolece, esvaziada... O seu corpo, que antes era túmido e firme, está agora esvaído, sem rigidez...
Retomado o fôlego pouco tempo depois, o olhar dele, que a escolhera entre as outras, revela-se insaciável e retoma a procura de uma próxima.
Quer reviver o prazer obtido há pouco.
Escolhe outra, também ela bela, também ela insinuante, e começa a repetir tudo, agora com esta.
Usando a mesma faca, ainda molhada do sumo da anterior laranja que delicada mas firmemente, tinha descascado...

Rui Felício
Blog «Encontro de Gerações do Bairro Norton de Matos»

Trocar

Trocaste o corpo por um poema
e eu agora vim buscar
mais do que o corpo tem para dar.
Trocaste o corpo por um poema
e eu agora vim receber
mais do que um corpo pode ser.
Trocaste o corpo por um poema
e eu estou aqui, em ti, a pedir
muito mais do que um corpo pode sentir.

Trocaste o corpo por um poema
mas saberei eu, com palavras, falar
do poema que o meu corpo te quer dar;
mas saberei eu, com palavras, escrever
o poema que o teu corpo quer receber;
mas saberei eu, com palavras, definir
muito mais do que um corpo pode sentir?

Trocaste o corpo por um poema
e eu agora vim buscar
mais do que o corpo tem para dar
e mais do que tenho para trocar.

Quatro postalinhos do Car(v)alho

Recordações de Estremoz.




Revisão em alta



HenriCartoon

14 setembro 2010

«Efeito bolha» - um truque gráfico com resultados curiosos

Adoro especialmente a última imagem.
E já fiz isto com fotografias cá de casa. Resulta mesmo. Quem souber trabalhar com programas gráficos experimente, que eu recomendo.



Capinaremos

Vem-se aí o novo livro da Paula Raposo, «o verbo ser»


As palavras que a nossa Paulita nos dá a ler (ou melhor, vende, mas é um preço tão baixinho que é quase dado) incorporam cada vez mais uma carga erótica que, embora sempre tenha estado presente, ela dizia que não tinha. Mas isso foi antes de andar em más companhias (por estas bandas).

"NU

Se te falar de amor
Despida de palavras
Que me dirás
Da ousadia com que me visto?

Que pensarás
Da minha nudez eufórica
Ou da metáfora
Com que cubro
O âmago de todas as questões?

Talvez te surpreendas
E te cales indeciso,
Enquanto folheias
Mais que distraído
O jornal desportivo.

Quando me souberes ler
Poro a poro,
Eu continuarei a falar-te de amor,
Mas com palavras vestidas
E entrelaçadas.
E só as despirei quando tu
Quiseres estar presente,
Num rasgo de loucura
Tacteando o amor nu."

Ninguém melhor que o Grande Mestre OrCa para apresentar a Paulita e seu (em breve nosso) «o verbo ser». Aqui fica um excerto do prefácio:
"Paula Raposo (...) incorpora nos seus poemas o parceiro idealizado como interlocutor e a quem propõe, assumindo-o, transformá-lo também no seu leitor, em palavras quase ao rés da confissão no leito, falando afinal de si própria, em aberturas de alma muito apropriadas à linguagem poética (...).
Depois, o amor constrói-o ela de mar, de música, também de silêncios, num universo mítico onde dois seres apenas valem o mundo, por eles perpassando todo o bem e todo o mal, a quinta essência do que a todos nos enforma.
Eivado, cada livro seu, de desilusão, pois que o amor romântico – alerta-nos Pessoa no seu Livro do Desassossego – é um caminho de desilusão, logo ele se destempera e busca a redenção num erotismo exaltante, porque inevitavelmente é de corpos nus de todas as roupagens, em estádios diversos de amar, que aqui se trata...
(...) não me custou favor nenhum reiterar o que amiúde lhe venho dizendo quanto ao que me parece ser uma progressiva confiança, determinação e segurança patentes em cada novo poema que nos traz, unindo forma e conteúdo em enlaces de cada vez maior eficácia."

Jorge Castro

"CONVEXO

Deixa-me aninhar
No teu colo côncavo
Onde eu te beijo a boca
E a saliva se entranha
Nos poros de toda a paixão
Líquida do momento.

Porque o teu colo é um momento
E o meu momento
É o meu convexo de ti."


«O verbo ser», livrinho de cordel da Apenas Livros, vai ser apresentado no dia 30 de Outubro (sábado) pelas 18h, no Café Restaurante Jardim do Lago, na Av. do Lago, no Monte Estoril.

Corre-corre

Este desenho foi feito por mim, numa agenda, em 18 de Agosto de 2002. Nessa altura, ainda não sonhava algum dia poder vir-me a ter um blog. Isso, foi um desafio da minha amiga Gotinha, que aceitei em Novembro de 2003. Mas a minha colecção de arte erótica já tinha uma dimensão e uma variedade consideráveis.
Este desenho, a que chamei «corre-corre», sempre me fez coceguinhas... e penso que merece juntar-se aos quadros a óleo e acrílico, aguarelas, desenhos a tinta da china, lápis de cera, carvão, lápis,... da minha colecção.

13 setembro 2010

Miana Poema

Senta-te aqui, Mariana, sente-me os dedos,
são raízes ao teu peito, nunca mais nos deixes
os olhos secar; senta-te aqui, dá-me a mão,
toco-te no braço, no espaço entre os dias,
nunca mais deixes os olhos fechar. Cabelos
ruivos, teus, soltos nas minhas costas e estes
dias já são dias de voltar ao que fomos então.
Vem cá, na fragilidade dos teus lábios, o que dizias
tu aos caminhos meus que se tornaram rios, gelos
que se tornaram sol, espaços que tocam nestes
meus, agora teus, tão teus como meus são.

Postalinhos da Celestitalinda e do Car(v)alho

Este veio-se da Celestelinda:


Café para taradas


E este veio-se do Car(v)alho:


Café dos bons amigos

«Fit to Flex» - aulinhas da Kelly Brook

Extração do siso


Alexandre Affonso - nadaver.com

12 setembro 2010

Meninas, o que escolhem?

Cais

Três viagens em simultâneo. A viagem pelas estradas deste País, o livro no meu colo, os carris meus das ideias. Talvez ainda uma quarta viagem pelas pessoas que vou vendo e tentando ler. Devagarinho, o último beijo dos amantes no cais já deixa as marcas da separação nos lábios; o embarque engole-os. Uma criança grande, do alto dos seus trinta anos, abraça os pais; a viagem diz-lhe que é grande e que é pequena. Os pensadores no meu colo, a capa rosa; uma estudante ao meu lado sobrevoa linhas de apontamentos e aterra o olhar no meu colo só o tempo suficiente para ler o título que embalo. Discutem estações de comboio e apeadeiros da vida. O sumo está fresco. Não sei que viagem me levou mais longe mas sei que uma outra me chamou para longe de mim: a bordo do sono naveguei o resto do caminho. Deve ser por isso que ninguém volta da morte, quem nos vem buscar é o sono e ele é francamente irresistível. Acordo. Um táxi é um corpo que tem um motorista por alma. Tantos ali viajam, uns mais tempo que outros, uns mais vezes que outros; só ele habita aquele hotel vivo. Fala-me da fauna da noite, que fiz bem em não entrar naquele café. Conheço bem a fauna mas não digo, a lucidez embaraça-me a voz e respondo com o sorriso frágil que sei que espera, é fácil porque eu até tenho medo de tudo. Compro muitas coisas em pacotes na estação de serviço. Coisas, só coisas que trago num saco. No saco trago mais uma viagem, são estranhas as pessoas à noite, as pessoas das estações; no saco trago a dúvida, eu sei que se movem e falam mas pergunto-me se são fauna ou flora. Casa. Cama. Cais. Sono, o irresistível senhor dos sonhos e da serenidade. Vou. Uns quebram para não partir; outros partem para não quebrar.