31 dezembro 2012
Em primeiro plano
Fixei o olhar na gota de água, mas não tardei a perceber que aquilo que prendeu a minha atenção foi o ombro desnudo por onde ela deslizou.
«conversa 1918» - bagaço amarelo
Eu - Então, por aqui?
Ela - Sim, o meu marido pediu-me para comprar lubrificante e não consigo decidir-me por um...
Eu - Há uns da Durex engraçados, mas são um bocado caros. O quente e o frio são fixes. O de Piña Colada cheira um bocado a anos oitenta.
Ela - Lubrificante para o carro... foi o que o meu marido me pediu...
Eu - Ah! Eu ia agora tomar café. Queres vir?
Ela - Acho que estás a mudar de assunto, mas pronto, vamos lá.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
30 dezembro 2012
Antonio Zambujo - «Flagrante»
Que não podia dar certo
E era coisa de evitar.
Como eu, devias supor
Que com gente ali tão perto
Alguém fosse reparar.
Mas não; fizeste beicinho,
E como numa promessa,
Ficaste nua para mim.
Pedaço de mau caminho,
Onde é que eu tinha a cabeça
Quando te disse que sim?
Embora tenhas jurado
Discreta permanecer,
Já que não estávamos sós;
Ouvindo na sala ao lado
Teus gemidos de prazer,
Vieram saber de nós.
Nem dei p'lo que aconteceu,
Mas, mais veloz e mais esperta,
Só te viram de raspão.
A vergonha passei-a eu:
Diante da porta aberta
Estava de calças na mão!
Letra: Maria do Rosário Pedreira
Música: António Zambujo
Sexo cru, sexo cozido
No início do ano um homem foi encontrado desmembrado e parcialmente cozido em um apartamento de Berlin. Acredita-se que a ação ocorreu durante um jogo de sexo entre os participantes e que acabou indo além dos limites.
O prazer sexual em comer o parceiro seguiu as entrelinhas e entranhas.
Há de convir que certas comidas cruas não tem um gosto muito agradável.
29 dezembro 2012
«pensamentos catatónicos (281)» - bagaço amarelo
Ela queria comprar uma carteira e pediu-me para a acompanhar. Suspirei. Se ir às compras já é um seca enorme, ir comprar uma carteira de mulher é o deserto do Saara. Mas fui, apesar do meu descontentamento em que ela fingiu nem reparar.
Namorávamos há um mês, se tanto, e ainda só tínhamos tido uma discussão, por causa duma nódoa de vinho que deixei cair num dos melhores vestidos dela. Naquele dia tivemos a segunda. E a última.
A certa altura ela já tinha umas vinte carteiras espalhadas pelo balcão da loja, para as quais espreitava como um lobo para dentro da toca dum coelho. Abria e fechava os fechos várias vezes, virava algumas do avesso e metia-lhes objectos nos bolsos para ver se cabiam. Em pouco tempo, a loja ficou a parecer o quarto duma criança hiperactiva.
Eu, que tentava desviar o meu olhar daquilo tudo, fui apanhado pela frase: "Ajuda-me aqui a escolher!". Senti-me um peixe fora de água, prestes a ser esmagado pelo olhar impaciente da vendedora. Apontei para uma qualquer, com o objectivo primordial de despachar aquilo tudo, e disse: "Esta!".
- Porquê? - Perguntou ela como se me estivesse a encostar à parede.
- É a mais fixe... - e abanei os ombros.
Deixou aquele monte de cadáveres de carteira em cima do balcão, pegou-me pelo braço e levou-me lá para fora. Caminhámos uns minutos envolvidos por um pesado silêncio até, com um ar greve e sério, me ter dito que queria ter uma conversinha comigo. Entrámos num café onde eu pedi um fino e ela não pediu nada. Aquele sítio era apenas o cenário para me dar um sermão.
Explicou-me tudo o que esperava de mim em todas as situações, como se eu fosse uma máquina programável. Quando pedia ajuda para uma compra, eu tinha que me interessar realmente pela compra; quando alguém lhe passasse à frente na fila do supermercado, eu tinha que a defender; quando me desse a mão na rua, não era para eu a abraçar. Desfiou ali um rol de acontecimentos em que eu já tinha falhado no cumprimento das suas expectativas.
- Não tens nada para dizer? - Perguntou no fim.
- Não.
bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»
28 dezembro 2012
Acta 14: "A assembleia foi suspensa por falta de ar."
Sempre que alguém do contra abria
a boca, a mulher tossia como se estivesse para morrer tuberculosa ou estivesse
a pontos de expelir um ser qualquer que se lhe alojara no sistema respiratório,
e tossia até que a pessoa se calasse ou dissesse algo que lhe agradava.
– A senhora, se não consegue
parar, tem de sair – avisou o administrador do condomínio, em tom pausado e cordato,
depois de mais um ataque de tosse que fora em crescendo até ao silêncio de quem
falava.
– Certas conversas, de
certas pessoas, fazem-me alergia, senhor presidente – respondeu a mulher. – Não
consigo fazer nada – disse, cândida enquanto olhava em volta provocadoramente.
– Peço desculpa.
– Eu sou capaz de
compreendê-la – rematou o presidente – mas temos de fazer um esforço, D.
Alzira. Há pessoas que parece que não sabem viver em sociedade, quanto mais ser
vizinhos num prédio. Temos de ser compreensivos.
– Eu sou, senhor presidente,
eu sou – replicou a D. Alzira, sempre sorridente. – O senhor sabe que não há
ninguém mais compreensiva do que eu.
– Eu sei – concordou o
presidente, piscando-lhe sorrateiramente o olho.
– Mas os meus pulmões é que
não têm a mesma compreensão e paciência do que eu, senhor presidente. Não têm a
mesma resistência da dona…
– Com isso é que já não
posso concordar – interrompeu o presidente, aéreo, lembrando-se do longo e
elaborado fellatio que ela lhe tinha feito na piscina do condomínio, nessa
tarde, enquanto preparavam a reunião. – A senhora tem uns
grandes pulmões, D. Alzira… – O presidente calou-se, ligeiramente corado: a
frase, apesar de verdadeira em mais do que um sentido (dois, pelo menos, eram
evidentes e pareciam querer saltar da blusa da D. Alzira), soara-lhe mal,
demasiado brejeira e dada a más interpretações, o que o seu olhar estarrecido para
o recheio da blusa da mulher ainda piorava. O homem tossiu, olhou
para o tampo da mesa, sem conseguir compreender porque pensara em fellatio e não em
broche, e explicou sem pensar no que estava a dizer: – A senhora tem uns pulmões
com grandes capacidades. Grandes capacidades e evidentes qualidades, D. Alzira.
Consegue até passar longos períodos debaixo de água e…
A mulher começou a tossir
como uma desesperada, mais alto e com mais energia do que alguma vez fizera e com
tanta verosimilhança e convicção que acabou por ficar sem ar.
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