Dedicado a Hunter S. Thompson, pai do jornalismo gonzo.
Quando, na passada noite de
eleições para o parlamento europeu, Paulo Portas se preparava para subir ao
palanque, soubemos que uma avalanche de bosta se segurava por um pintelho à
escarpada ravina que conduz decência abaixo. Depois, o dilúvio castanho,
irrevogável. Tudo nele era um monumento à verdade, e tão verdadeiras,
autênticas as suas palavras como o são o branco dos seus dentes, o seu
bronzeado e o seu cabelo.
O momento fazia-se atroz,
historicamente relevante, mas outro incidente dramático clamava pela minha
atenção. Atrás de cada assento na plateia, postara-se um anão trajado de
templário, com a missão de urdir os braços e cabeças dos militantes na altura
certa do aplauso, ou aceno concordante. Como rebuçadinho, recebiam uma ocasional
punheta, ou amasso de clíto, trabalhados por mãozitas marotas braguilhas
adentro, ou debaixo de austeras saias. Os notáveis, e alguns jornalistas da
TVI, abafavam grunhidos, como leões-marinhos em jejum. Acabava Nuno Melo de
bolsar um Black Label, quando decidi
fugir daquele festival de sodomia moral colectiva.
Que se passará no Hotel Altis?
Que incríveis, luxuriantes e exóticas delícias se esconderão no famoso elevador
socialista? Um táxi, dez minutos de xenofobia primária e um ananás depois,
chegava a esse digno albergue. Para minha surpresa, não havia ninguém; uma
esquálida cabra vadia mastigava a sua solidão num descampado próximo. Indaguei
pela trupe socialista junto de uma mercenária do amor, que ali desperdiçava os
seus propósitos comerciais. Nada. Fumámos um charro, ouvimos os grilos fazerem
cri-cri, olhámos as estrelas no firmamento. Chupou-me o caralho e - efeitos do
THC - pensei na bela causa fracturante da cabeça de lista do Bloco de Esquerda,
naquela altura, certamente, carpindo mágoas com um vibrador multicultural. Um
desperdício, uma pena. Asseava-me com um toalhete, quando passou diante de mim
a correr Ana Gomes, ou Marinho Pinto disfarçado de gaja, nunca saberei ao
certo...
A sede do Partido Comunista era
perto e uma súbita esperança de bifanas com minis arrastou-me até à Soeiro
Pereira Gomes; esse edifício de mármores glasnósticos e escadarias lisnávicas. Encontrei
pura alegria funcionária entre as hostes proletárias, que saltavam ordeiramente
na vertical, de tal sorte que os seus movimentos desenhavam um vector que se
lhes houvesse metido no cu; tudo ao som de uma histérica melodia, tocada em
flauta de merda. O camarada-mor já havia discursado e os ânimos eram
naturalmente pândegos; não obstante, nada de refrescos. Esgueirei-me por uma
porta lateral, esperançoso de conseguir um Singapore
Sling algures, mas acabei por me achar no meio do Bacanal do Comité Central
- sempre com um olho posto na propaganda esta gente... rima e tudo. Uma Festa do Avante, mas de nudistas hirsutíssimos,
com barbas nas mais estranhas partes do corpo. Pela primeira vez, vi uma Cona
Guevara, aparição que, estou certo, me acompanhará no que resta da minha miserável
existência. O ritual punho erguido promovia o fist-fucking indiscriminado, remetendo instantaneamente o
observador à inclinação comunista para permanecer de pé em cerimónias oficiais.
Por outro lado, tinham razões para festejar, deixá-los meter malho em foice
alheia!
Saí à rua, não sem roubar o Singapore Sling de Odete Santos, à custa
de um combate com volumes do Das Kapital
e um leve traumatismo craniano. Em poucas palavras, foi assim a noite de eleições:
uma intolerável exibição de decadência e depravação no coração democrático da
República Portuguesa.