28 novembro 2022

Luís Gaspar lê «Morna», poema de Daniel Filipe


É já saudade a vela, além.
Serena, a música esvoaça
na tarde calma, plúmbea, baça,
onde a tristeza se contém.

os pares deslizam embrulhados
de sonhos em dobras inefáveis.

(Ó deuses lúbricos, ousáveis
erguer, então, na tarde morta
a eterna ronda de pecados
que ia bater de porta em porta.)

E ao ritmo túmido do canto
na solidão rubra da messe,
deixo correr o sal e o pranto
– subtil e magoado encanto
que o rosto núbil me envelhece.

Daniel Filipe
Poeta e jornalista cabo-verdiano, Daniel Damásio Ascensão Filipe nasceu em 1925, na Ilha da Boavista, em Cabo Verde e morreu em 1964, em Lisboa. Na poesia destacou-se pela combatividade revolucionária, aliada a uma fina sensibilidade lírica que o levou à prisão e tortura no regime salazarista.

Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

Sem comentários:

Enviar um comentário

Uma por dia tira a azia