(crica para veres os meses todos)
03 julho 2010
Capacidade de observação é isto
No 13º Encontra-a-Funda, quando visitámos o Museu da Chapelaria em S. João da Madeira, toda a gente viu esta máquina e ouviu atentamente a explicação do nosso guia. Mas a Salomé observou a máquina de um ângulo específico e ofereceu-me a fodografia, que baptizou de...
«Máquina Multifuncional»
Obrigada, Salomé. A ti, ofereço-te esta fodografia da colecção do Museu, em que me limitei a destacar...
O ataque dos conos encavalitados
«Máquina Multifuncional»
Obrigada, Salomé. A ti, ofereço-te esta fodografia da colecção do Museu, em que me limitei a destacar...
O ataque dos conos encavalitados
A prostituta azul (VII)
A dor que não dói na ferida é dor que dói na dor. Quando nem ferida existe é - por vezes - a dor dos que gozam a vida que sentem, porque algo sentem, nem que dor seja. Assim, poderá a dor dar um gozo obsceno, quase violento aos que a sentem, se antes incapazes de algo sentir ou incapazes de outra coisa sentir. Só quem morre não sente; eu vi a dor ressuscitar de prazer quem se julgava condenado a uma morte colada ao nome. O toque cruel, vestido de violência fria, estalava na pele submissa, nua; despertava do sono as gargalhadas de pasmo inundadas, roucas de um desprezo recém-adquirido pelo entorpecimento. Tudo estava duro, nítido; a realidade fervia uma ejaculação precoce que agora poderia escorrer numa doçura de contrastes vivos, tão vivos, apiedados. E ela? Ela bateu-lhe mais, por dó, por pena, por delicadeza, por compaixão; bateu-lhe mais, bateu-lhe até ao princípio. O homem deixou a morte, deixou os papelinhos coloridos de feio e foi-se embora. Ela morreu um pouco que nunca mais reanimou e nunca mais o reanimou.
Três reproduções dos anos 60 de desenhos eróticos
Nem sempre as compras pela internet dão certo. Neste caso, estes três desenhos estavam descritos como originais. Quando os recebi, vi claramente que são reproduções. Não deixam de ser interessantes... e a vendedora aceitou reembolsar-me a diferença para um valor justo.
«Peregrinação» (11 x 40 cm):
«Peregrinação» (11 x 40 cm):
02 julho 2010
Para Ti da Minha Boca
Escrevo-te eu toda, no desejo que me envolve as ancas, como num beijo teu...
A boca é uma atmosfera onde se abre o teu clima.
Toda ela fervilha, redonda, ao cimo, no caroço.
A nua polpa asfixia a garganta.
É o nervo que te entrelaça na minha carne.
Boca viagem, que te absorve, gesticula, acaricia, aspira as tramas do sangue. Respira-te.
Dói. Em volta. No gole. Queima-te as asas na labareda, na potência da minha garra. Pulsante. Inteira.
Na boca, só o teu silêncio se gasta nas tentativas de saber até onde o aonde vai...
A boca é uma atmosfera onde se abre o teu clima.
Toda ela fervilha, redonda, ao cimo, no caroço.
A nua polpa asfixia a garganta.
É o nervo que te entrelaça na minha carne.
Boca viagem, que te absorve, gesticula, acaricia, aspira as tramas do sangue. Respira-te.
Dói. Em volta. No gole. Queima-te as asas na labareda, na potência da minha garra. Pulsante. Inteira.
Na boca, só o teu silêncio se gasta nas tentativas de saber até onde o aonde vai...
[Blog Vermelho Canalha]
Olhos meus
Os meus olhos são os meus olhos.
Os meus olhos são meus.
Os meus olhos, olham-te.
Os meus olhos, vêem-te.
Os meus olhos meus
olham-te e os olhos meus
vêem-te.
E estes meus olhos
que são meus
-sendo também teus-,
olham-te (meus),
vêem-te (meus, ainda)
e são meus de mim
nos olhos teus que perdi,
um dia - distraída.
Poesia de Paula Raposo
Os meus olhos são meus.
Os meus olhos, olham-te.
Os meus olhos, vêem-te.
Os meus olhos meus
olham-te e os olhos meus
vêem-te.
E estes meus olhos
que são meus
-sendo também teus-,
olham-te (meus),
vêem-te (meus, ainda)
e são meus de mim
nos olhos teus que perdi,
um dia - distraída.
Poesia de Paula Raposo
01 julho 2010
Desencantos
Eu sei porque é que os relógios se zangaram e, como castigo, nos atiraram o tempo que escorre. Porque desenhámos e construímos relógios quadrados e em cantos os relógios não conseguem ver encantos porque os cantos são arestas. Não conseguem ver encantos; não conseguem ver em cantos; cegaram-nos.
A Chamada
A porta da viatura oficial fechou-se com estrondo protegendo o chefe do governo. O motorista passou-lhe o telemóvel avisando:
– O senhor doutor ainda está em linha.
– Arruaceiros, pá! – Queixou-se sua excelência o senhor Primeiro-Ministro para o telemóvel que, agora, já não precisava de mudar periodicamente. “Estou a afeiçoar-me a este” dizia, contemplando enlevado o aparelho. “Já há muito tempo que não tinha um telemóvel durante tanto tempo. É giro, pá. Já me tinha esquecido da prazerosa sensação de pertença e identidade que os nossos telemóveis nos transmitem, como se o aparelho fosse uma extensão do nosso ser, como se, de alguma forma, nos completasse, reflectisse e, por si só, nos ligasse aos outros e ao mundo. E este é a minha cara”, observava satisfeito mirando-se na superfície espelhada do telemóvel. Os assessores olhavam-no e acenavam ovinamente os esmerados couros cabeludos sem perceberem nada do que o homem estava a dizer. – Olha! – exclamou o Primeiro, vendo um ovo esparramar-se contra o vidro da viatura. – Olha para estes gajos, pá! Energúmenos!
– O que é? – perguntou o senhor doutor que se mantivera pacientemente ao telemóvel (que não podemos nomear – o senhor doutor, claro, que a divulgação da marca e modelo do telemóvel de sua excelência não está sujeito a qualquer cominação legal ou de outro género, julga-se).
– Vamos embora! – Ordenou o senhor Primeiro-Ministro ao motorista, que aquele não saberia nomear por ter tantos ao seu serviço. “Ao serviço do meu gabinete”, corrigiria o Primeiro se lesse isto. “Os motoristas estão ao serviço do meu gabinete, senhor narrador. Não esteja a desvirtuar a realidade com o intuito soes de achincalhar e cobrir com um manto negro de ignóbeis falsidades uma das mais sérias e honradas instituições da nossa democracia.” “Que instituição?”, perguntam vocês. “O Gabinete do Primeiro-Ministro”, responderia o nosso Primeiro, repleto daquela certeza que só os predestinados (ou os maluquinhos) têm, ainda que logo se corrigisse e sublinhasse: “Ou melhor, o meu gabinete de Primeiro-Ministro.” – Embora, homem! Vamos embora! – repetiu veemente o Primeiro, alheio às atoardas que o narrador lhe lançara mas não às que se esparramavam contra os vidros da viatura oficial.
– O que foi, Zé? O que foi? – insistia assustado o homem que falava ao telemóvel.
– Estão a atirar ovos ao carro – informou o Primeiro, mantendo exteriormente a compostura enquanto sentia o grande nariz enrubescer, as orelhas tremer, os lábios cerrarem até perderem a cor e os olhos esbugalhados raiarem-se de linhas vermelhas e de um brilho psicótico.
– Ovos?! – disse num gritinho o homem que tentava debalde conversar com o Primeiro.
– E tomates, pá – completou o Primeiro, esboçando a custo um sorriso nervoso. “Tenho de mandar escurecer os vidros do carro”, decidiu ao perceber a dificuldade com que se continha. – Tomates e… e…
– Ovos e tomates?!
– Tomates e outros genitais…
– Vegetais?
– Não, genitais, porra. Genitais, mesmo!... Estão a mandar-me genitais.
– Genitais?! – murmurou perplexo aquele que não podemos nomear. – Mas… Mas fazem os genitais com os dedos? – perguntou o senhor doutor, engasgado, sem conseguir imaginar como é que se efectuava e concretizava o arremesso de órgãos sexuais contra a viatura oficial do chefe do governo.
– Não, pá! – Irritou-se mais o Primeiro, observando com visível repulsa uma impressionantemente naturalística vulva que ia escorrendo lentamente pelo pára-brisas. – Estão a atirar-me coisas de borracha, pá! Pénis com testículos, pénis sem testículos, vaginas, vulvas…
– Qual é a diferença?
– Sei lá qual é a diferença, pá – disparou sua Excelência, furibundo.
– E mamas? – perguntou o outro num tom alegre e entusiasmado, sem saber porquê.
– Mamas?! Mamas, Armando?! – [nota: o nome foi aleatoriamente escolhido da lista oficial do registo civil de nomes masculinos e não corresponde a qualquer pessoa em concreto.] – Tu estás doido, pá! Estão a atirar ovos e genitais ao primeiro-ministro do teu país e tu estás preocupado é se me atiram mamas, pá?! Mamas, Armando?! Tu estás doido?! Porque é que raio haviam de me atirar mamas, pá?! Mamas?! Vai-te lixar, pá! Vai-te mas é lixar! Mamas é para meninos!
– Ó Zé…
– Nem Zé nem meio Zé! Bardamerda, pá! Vais mas é encher o bandulho de robalos – [nota: podia ser outro peixe] –, de preferência vestidinho com o equipamento do Esmoriz! – [nota: podia ser outra agremiação desportiva.] – Vai-te lixar… Agora mamas… Eu sou o Primeiro-Ministro, pá, estou habituado à contestação, aos apupos, às vaias da populaça. Às manobras espúrias e às campanhas negras. Aos palavrões, aos dedos em riste e, agora, aos genitais, pá! Os genitais valem o que valem, pá! E a maior parte deles não valem nada, pá. Nada! Mas isto ao menos é contestação à séria. Pénis e vaginas! Agora mamas, pá, mamas é para meninos! Um primeiro-ministro que faz, que decide, que dá o passo em frente, tem de ser vaiado à grande, à séria, à homem!... E mais, pá, e mais: quem leva com vegetais são os falhados! Agora com genitais…
– Ah! Bem… – interrompeu Armando, azedo, ainda com uma espinha de robalo cravada na garganta e com o equipamento do Esmoriz a apertar-lhe nos sovacos [nota: o nome, o peixe e a agremiação podiam ser outros]. – Isso é verdade, Zé. Isso é verdade! Isso é de um grande estadista. Genitais não é para todos… Agora tens é um problema…
– O ácido com muita estriquinina?
– Não – respondeu Armando, com cultura musical para perceber a graçola mas sem vontade de rir. – Se a moda pega nunca mais podes ir às Caldas…
– Então?
– É que lá são de loiça – e desligou.
– O senhor doutor ainda está em linha.
– Arruaceiros, pá! – Queixou-se sua excelência o senhor Primeiro-Ministro para o telemóvel que, agora, já não precisava de mudar periodicamente. “Estou a afeiçoar-me a este” dizia, contemplando enlevado o aparelho. “Já há muito tempo que não tinha um telemóvel durante tanto tempo. É giro, pá. Já me tinha esquecido da prazerosa sensação de pertença e identidade que os nossos telemóveis nos transmitem, como se o aparelho fosse uma extensão do nosso ser, como se, de alguma forma, nos completasse, reflectisse e, por si só, nos ligasse aos outros e ao mundo. E este é a minha cara”, observava satisfeito mirando-se na superfície espelhada do telemóvel. Os assessores olhavam-no e acenavam ovinamente os esmerados couros cabeludos sem perceberem nada do que o homem estava a dizer. – Olha! – exclamou o Primeiro, vendo um ovo esparramar-se contra o vidro da viatura. – Olha para estes gajos, pá! Energúmenos!
– O que é? – perguntou o senhor doutor que se mantivera pacientemente ao telemóvel (que não podemos nomear – o senhor doutor, claro, que a divulgação da marca e modelo do telemóvel de sua excelência não está sujeito a qualquer cominação legal ou de outro género, julga-se).
– Vamos embora! – Ordenou o senhor Primeiro-Ministro ao motorista, que aquele não saberia nomear por ter tantos ao seu serviço. “Ao serviço do meu gabinete”, corrigiria o Primeiro se lesse isto. “Os motoristas estão ao serviço do meu gabinete, senhor narrador. Não esteja a desvirtuar a realidade com o intuito soes de achincalhar e cobrir com um manto negro de ignóbeis falsidades uma das mais sérias e honradas instituições da nossa democracia.” “Que instituição?”, perguntam vocês. “O Gabinete do Primeiro-Ministro”, responderia o nosso Primeiro, repleto daquela certeza que só os predestinados (ou os maluquinhos) têm, ainda que logo se corrigisse e sublinhasse: “Ou melhor, o meu gabinete de Primeiro-Ministro.” – Embora, homem! Vamos embora! – repetiu veemente o Primeiro, alheio às atoardas que o narrador lhe lançara mas não às que se esparramavam contra os vidros da viatura oficial.
– O que foi, Zé? O que foi? – insistia assustado o homem que falava ao telemóvel.
– Estão a atirar ovos ao carro – informou o Primeiro, mantendo exteriormente a compostura enquanto sentia o grande nariz enrubescer, as orelhas tremer, os lábios cerrarem até perderem a cor e os olhos esbugalhados raiarem-se de linhas vermelhas e de um brilho psicótico.
– Ovos?! – disse num gritinho o homem que tentava debalde conversar com o Primeiro.
– E tomates, pá – completou o Primeiro, esboçando a custo um sorriso nervoso. “Tenho de mandar escurecer os vidros do carro”, decidiu ao perceber a dificuldade com que se continha. – Tomates e… e…
– Ovos e tomates?!
– Tomates e outros genitais…
– Vegetais?
– Não, genitais, porra. Genitais, mesmo!... Estão a mandar-me genitais.
– Genitais?! – murmurou perplexo aquele que não podemos nomear. – Mas… Mas fazem os genitais com os dedos? – perguntou o senhor doutor, engasgado, sem conseguir imaginar como é que se efectuava e concretizava o arremesso de órgãos sexuais contra a viatura oficial do chefe do governo.
– Não, pá! – Irritou-se mais o Primeiro, observando com visível repulsa uma impressionantemente naturalística vulva que ia escorrendo lentamente pelo pára-brisas. – Estão a atirar-me coisas de borracha, pá! Pénis com testículos, pénis sem testículos, vaginas, vulvas…
– Qual é a diferença?
– Sei lá qual é a diferença, pá – disparou sua Excelência, furibundo.
– E mamas? – perguntou o outro num tom alegre e entusiasmado, sem saber porquê.
– Mamas?! Mamas, Armando?! – [nota: o nome foi aleatoriamente escolhido da lista oficial do registo civil de nomes masculinos e não corresponde a qualquer pessoa em concreto.] – Tu estás doido, pá! Estão a atirar ovos e genitais ao primeiro-ministro do teu país e tu estás preocupado é se me atiram mamas, pá?! Mamas, Armando?! Tu estás doido?! Porque é que raio haviam de me atirar mamas, pá?! Mamas?! Vai-te lixar, pá! Vai-te mas é lixar! Mamas é para meninos!
– Ó Zé…
– Nem Zé nem meio Zé! Bardamerda, pá! Vais mas é encher o bandulho de robalos – [nota: podia ser outro peixe] –, de preferência vestidinho com o equipamento do Esmoriz! – [nota: podia ser outra agremiação desportiva.] – Vai-te lixar… Agora mamas… Eu sou o Primeiro-Ministro, pá, estou habituado à contestação, aos apupos, às vaias da populaça. Às manobras espúrias e às campanhas negras. Aos palavrões, aos dedos em riste e, agora, aos genitais, pá! Os genitais valem o que valem, pá! E a maior parte deles não valem nada, pá. Nada! Mas isto ao menos é contestação à séria. Pénis e vaginas! Agora mamas, pá, mamas é para meninos! Um primeiro-ministro que faz, que decide, que dá o passo em frente, tem de ser vaiado à grande, à séria, à homem!... E mais, pá, e mais: quem leva com vegetais são os falhados! Agora com genitais…
– Ah! Bem… – interrompeu Armando, azedo, ainda com uma espinha de robalo cravada na garganta e com o equipamento do Esmoriz a apertar-lhe nos sovacos [nota: o nome, o peixe e a agremiação podiam ser outros]. – Isso é verdade, Zé. Isso é verdade! Isso é de um grande estadista. Genitais não é para todos… Agora tens é um problema…
– O ácido com muita estriquinina?
– Não – respondeu Armando, com cultura musical para perceber a graçola mas sem vontade de rir. – Se a moda pega nunca mais podes ir às Caldas…
– Então?
– É que lá são de loiça – e desligou.
Cheguei a casa...
... e tinha uma encomenda que veio pelo correio. Era da nossa Vânia Beliz. Lá dentro, dois copos em barro que ela comprou, especialmente para a minha colecção, no Festival Erótico Medieval, dois pratinhos ingleses... e uma mensagem... mas essa é só para mim.
Vânia, obrigada!
Ainda há quem se admire que eu seja lésbica...
Vânia, obrigada!
Ainda há quem se admire que eu seja lésbica...
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