Não sei quem não disse. Nem sei o que não foi dito.
Empurro-te agora para o fundo de ti. (Empurrei?) É lá, no teu fundo,
que desejo que estejas (estiveste?) no dia em que escreveres o momento
em que estiveste entre as minhas pernas e te puxei para o fundo de mim. (Puxei?)
Não há palavras certas, esquece a escolha de palavras. (Esqueceste?)
Há palavras que gritam sem precisarmos de as gritar. (Gritei)
Há palavras que nos escolhem. (Sim, escolheram) Há palavras... Dorme mais... (Sim?)
Foi assim quando foi.
Não te falei da hora, falei? Perguntaste se podias e eu não respondi, só isso, sem te falar da hora. Sabes, há uma hora a que não se chega, é a hora que nos chega e não pode ser empurrada, chamada; ela é invocada e sente-se quando já é. Agora já sabes qual é essa hora, quando chegou apagámos o candeeiro e a Luz não...
Volto atrás. Não te respondi. Perguntaste se podias e eu não respondi. A hora ainda nada dizia e o meu corpo também não.
Vi-te adormecer. Vi-te descer até aqui; é lá que moro, no fundo que nas pessoas só costuma pertencer ao sono. Chamei-te sem gritar, uma vez só. Abri-te a porta para não te vender uma ilusão.
E o eco que nos ronda, pedintes rendidos;
um filme sem legendas, sem tradutor e as
palavras que fazemos não existir, perdidas, sobrevoam a cena. O beijo quando não o antecipas é o beijo que faz descer mais. Só no fundo de ti está quem és; deixa que me toque o lobo que no fundo, no fundo, és. Tomo o lobo por amante, deito-te a mão ao ventre pela garganta; tiro-te a roupa que as coisas humanas já se perderam de ti, vejo-te o pêlo. Agora podes; agora, quando entras, chegas. Entras e eu não fugi daqui, não fugi de mim; entras e tudo te consente. Agarro-te as garras, cravo-te os joelhos e a tua sombra dissolve-se na minha... Até agora.
09 setembro 2010
Mulher deitada
08 setembro 2010
it takes three to tango
Sempre gostei de te ver dançar. A sensualidade dos teus movimentos tem um efeito sufocante na minha respiração. Mas eu gosto que me sufoques, como só tu sabes.
Apetece-me tirar-te a camisa, rasgá-la com as minhas próprias mãos e permitir que a dança continue. Tu e ela.
E eu, observadora atenta dos teus passos, qual predador que se aproxima cautelosamente da sua presa (na verdade, das duas presas) deixo que o calor percorra a minha alma.
Hoje sou eu quem vai dominar. Sou eu quem vai conduzir o tango dos três corpos que se querem e se desejam; que vibram, que trocam prazer sem fim.
O tango que também é das almas. Almas que buscam o acontecer da sua fantasia. A três.
Quem diria que os nossos caminhos se cruzariam desta forma tão prazeirosa? Que ambos (os três) nos iríamos embrulhar em suor ilustrado com pedidos de quem não se satisfaz facilmente? De quem quer mais?
Sempre gostei de te ver dançar. Tu e ela. A dançar em mim.
texto de Joana Sousa, para ler com música e fotografia em Olhar a Palavra
Apetece-me tirar-te a camisa, rasgá-la com as minhas próprias mãos e permitir que a dança continue. Tu e ela.
E eu, observadora atenta dos teus passos, qual predador que se aproxima cautelosamente da sua presa (na verdade, das duas presas) deixo que o calor percorra a minha alma.
Hoje sou eu quem vai dominar. Sou eu quem vai conduzir o tango dos três corpos que se querem e se desejam; que vibram, que trocam prazer sem fim.
O tango que também é das almas. Almas que buscam o acontecer da sua fantasia. A três.
Quem diria que os nossos caminhos se cruzariam desta forma tão prazeirosa? Que ambos (os três) nos iríamos embrulhar em suor ilustrado com pedidos de quem não se satisfaz facilmente? De quem quer mais?
Sempre gostei de te ver dançar. Tu e ela. A dançar em mim.
texto de Joana Sousa, para ler com música e fotografia em Olhar a Palavra
Irene
Irene,
excomungada pelo vento,
ele ouve o teu lamento:
que triste que é!
Irene,
que sempre se anuncia,
é mulher vazia
mas ainda tem fé.
Irene,
aberta na palma da mão,
ela cai no chão
mas cai sempre de pé...
Irene,
a devorada pelo Mundo,
procura no seu fundo
o melhor que ele come;
Irene,
um desejo tão profundo
que devora tudo,
que te devora a fome.
Irene...
excomungada pelo vento,
ele ouve o teu lamento:
que triste que é!
Irene,
que sempre se anuncia,
é mulher vazia
mas ainda tem fé.
Irene,
aberta na palma da mão,
ela cai no chão
mas cai sempre de pé...
Irene,
a devorada pelo Mundo,
procura no seu fundo
o melhor que ele come;
Irene,
um desejo tão profundo
que devora tudo,
que te devora a fome.
Irene...
Vergonha (muito) pornográfica
São Rosas: "Como já comentei no Livrodascaras, é um dois em um: a cena do apedrejamento remete também para a morte por lapidação nos países muçulmanos. Pornografia pura."
Fin: "Se a São me permite eu recordo que a lapidação, hoje associada a alguns, note-se alguns, países muçulmanos, está na Bíblia. «Quem nunca pecou atire a primeira pedra». É certo que embora esteja no caldo onde nasceu o cristianismo é uma prática há muito abandonada. Já a queima de senhoras perturbadas, ou meramente diferentes, acusadas de bruxaria, acabou mais recentemente."
São Rosas: "Tens toda a razão. A pornografia anda por aí..."
07 setembro 2010
Putas para todos os gostos
(Uma primeira abordagem, ainda sem carácter definitivo).
“putas de borda de estrada”: mulheres que, obviamente por falta de recursos para exercerem a sua actividade em condições de maior conforto, resolveram fazê-lo na borda de uma estrada (mais ou menos como os vendedores clandestinos de farturas, com a diferença de não terem roulottes e o produto vendido ser o sexo).
“grandes putas”: mulheres que fazem da “mamada” uma obra de arte, adoram que lhes fodam a boca bem fodida, vêm-se como rainhas, e entretêm-se a fazer com que os homens se venham até às orelhas para lhes beberem o leitinho. (De onde se explica que muitas mulheres gostem de ser elogiadas em tais termos, por vezes na forma abreviada de “puta”, durante e após o acto sexual).
“putas amadoras”: mulheres que se dedicavam temporariamente à prostituição, no geral em associação a instituições de carácter religioso, como método de preparação para o casamento (um costume, ao que parece, vulgar entre os romanos).
“más putas”: mulheres que não entendem nada de sexo.
“putas profissionais”: mulheres que não vendem sexo a retalho, mas que o vendem ou trocam por benefícios de carácter permanente.
“putas de luxo”: mulheres que adoram o luxo e o conforto e que possuem dotes físicos e intelectuais suficientes para fazer ascender a troca dos seus favores sexuais a elevadas somas de dinheiro ou outros benefícios por elas escolhidos. Ao contrário das “putas de borda de estrada” reservam para si também o direito à escolha do “comprador” (ou seja, fodem com quem lhes apetece e ainda são pagas por isso).
“meretrizes”: mulheres de extraordinários talentos, sexuais e outros, escolhidas muitas vezes para esposas pelos homens mais poderosos de um reino ou império, naqueles tempos em que se fazia gala de enfiar de vez na cama “a mais puta de todas as putas”. Um costume, como se sabe, hoje em desuso (ninguém imaginaria um rei, primeiro ministro, ou presidente da república casado com uma “meretriz”), mas vulgar no império romano, onde aliás, dificilmente uma mulher adquiriria um estatuto social elevado sem que fosse uma “grande puta”.
“quastuosa”: equivalente a “puta de borda de estrada” no período do império romano, com a diferença de a actividade não ser geralmente exercida na borda de uma estrada.
“prostitutas”: mulheres que vendem sexo por troca de dinheiro.
“pornai”: “prostitutas” escravas da grécia antiga. Mulheres que tinham um proxeneta que, literalmente, as possuía e as usava como pura mercadoria. Como é natural, eram as mais abundantes numa sociedade que se estima com 85% de escravos, 10% de cidadãos e 5% de metecos (neste aspecto, aparentada com a nossa).
“putas independentes”: semelhantes a “trabalhadores independentes" de serviços sexuais da grécia antiga, em particular no que respeita ao pagamento de impostos. A categoria incluía uma grande parte de metecos, e a função podia ser desempenhada tanto por homens como por mulheres.
“hetairas”: na grécia antiga, uma das poucas categorias de mulheres com autonomia de gestão da sua propriedade e as únicas com direito a participação na esfera intelectual masculina. Supostamente cultas, bonitas, ricas e inteligentes. Qualquer coisa entre “putas de luxo” e “grandes putas”. O nome de algumas delas chegou até nós por serem referidas em textos de grandes dramaturgos e filósofos.
“bacantes”: mulheres que, na grécia antiga, se enrolavam volta e meia em grandes bacanais por honra a uma divindade.
“cortesãs”: mulheres responsáveis pela satisfação sexual de homens abastados e de estatuto social elevado numa época em que apenas era socialmente consentido o casamento com “más putas”.
“virgens”: semelhantes a “más putas” com a diferença de ainda haver esperança de que se venham (a transformar em “grandes putas”), a menos que, entretanto, engravidem de uma pomba.
“putas de borda de estrada”: mulheres que, obviamente por falta de recursos para exercerem a sua actividade em condições de maior conforto, resolveram fazê-lo na borda de uma estrada (mais ou menos como os vendedores clandestinos de farturas, com a diferença de não terem roulottes e o produto vendido ser o sexo).
“grandes putas”: mulheres que fazem da “mamada” uma obra de arte, adoram que lhes fodam a boca bem fodida, vêm-se como rainhas, e entretêm-se a fazer com que os homens se venham até às orelhas para lhes beberem o leitinho. (De onde se explica que muitas mulheres gostem de ser elogiadas em tais termos, por vezes na forma abreviada de “puta”, durante e após o acto sexual).
“putas amadoras”: mulheres que se dedicavam temporariamente à prostituição, no geral em associação a instituições de carácter religioso, como método de preparação para o casamento (um costume, ao que parece, vulgar entre os romanos).
“más putas”: mulheres que não entendem nada de sexo.
“putas profissionais”: mulheres que não vendem sexo a retalho, mas que o vendem ou trocam por benefícios de carácter permanente.
“putas de luxo”: mulheres que adoram o luxo e o conforto e que possuem dotes físicos e intelectuais suficientes para fazer ascender a troca dos seus favores sexuais a elevadas somas de dinheiro ou outros benefícios por elas escolhidos. Ao contrário das “putas de borda de estrada” reservam para si também o direito à escolha do “comprador” (ou seja, fodem com quem lhes apetece e ainda são pagas por isso).
“meretrizes”: mulheres de extraordinários talentos, sexuais e outros, escolhidas muitas vezes para esposas pelos homens mais poderosos de um reino ou império, naqueles tempos em que se fazia gala de enfiar de vez na cama “a mais puta de todas as putas”. Um costume, como se sabe, hoje em desuso (ninguém imaginaria um rei, primeiro ministro, ou presidente da república casado com uma “meretriz”), mas vulgar no império romano, onde aliás, dificilmente uma mulher adquiriria um estatuto social elevado sem que fosse uma “grande puta”.
“quastuosa”: equivalente a “puta de borda de estrada” no período do império romano, com a diferença de a actividade não ser geralmente exercida na borda de uma estrada.
“prostitutas”: mulheres que vendem sexo por troca de dinheiro.
“pornai”: “prostitutas” escravas da grécia antiga. Mulheres que tinham um proxeneta que, literalmente, as possuía e as usava como pura mercadoria. Como é natural, eram as mais abundantes numa sociedade que se estima com 85% de escravos, 10% de cidadãos e 5% de metecos (neste aspecto, aparentada com a nossa).
“putas independentes”: semelhantes a “trabalhadores independentes" de serviços sexuais da grécia antiga, em particular no que respeita ao pagamento de impostos. A categoria incluía uma grande parte de metecos, e a função podia ser desempenhada tanto por homens como por mulheres.
“hetairas”: na grécia antiga, uma das poucas categorias de mulheres com autonomia de gestão da sua propriedade e as únicas com direito a participação na esfera intelectual masculina. Supostamente cultas, bonitas, ricas e inteligentes. Qualquer coisa entre “putas de luxo” e “grandes putas”. O nome de algumas delas chegou até nós por serem referidas em textos de grandes dramaturgos e filósofos.
“bacantes”: mulheres que, na grécia antiga, se enrolavam volta e meia em grandes bacanais por honra a uma divindade.
“cortesãs”: mulheres responsáveis pela satisfação sexual de homens abastados e de estatuto social elevado numa época em que apenas era socialmente consentido o casamento com “más putas”.
“virgens”: semelhantes a “más putas” com a diferença de ainda haver esperança de que se venham (a transformar em “grandes putas”), a menos que, entretanto, engravidem de uma pomba.
[blog Libélula Purpurina]
Perdidamente
Por que raio
me apaixonei, perdidamente,
por ti?
Pergunto-me todos os dias.
A poesia teve um papel
preponderante (teve?)
e as tuas palavras
quiseram dizer
o não dito - ainda -;
a noite caíu sobre a baía
e de ti restou o mais belo
poema de amor.
Poesia de Paula Raposo
me apaixonei, perdidamente,
por ti?
Pergunto-me todos os dias.
A poesia teve um papel
preponderante (teve?)
e as tuas palavras
quiseram dizer
o não dito - ainda -;
a noite caíu sobre a baía
e de ti restou o mais belo
poema de amor.
Poesia de Paula Raposo
06 setembro 2010
O não-poema ao Mestre do verbo inexistir
O que é logo depois foi. Passa, o que é passa. Passar.
O tempo leva. Tudo. Foi. Mas o tempo não leva nada. Nada.
O nada. O que não é nem foi, um nunca, não pode levar.
Entendeste o que é; entende agora o que não é. Roubada
ao existir serei para sempre. Inexistir é assim, o nada por marcar
em folhas de dias que passam; não sou imaginada, nem perdida,
sequer fui encontrada. Não sou. O tempo não me poderá terminar;
o tempo leva ideias, pessoas, amantes; ele leva-nos a vida
mas não leva ninguém ou a morte. É assim que me deverás chamar:
ninguém, a imperturbável pelos dias. Inexistir é assim, ser roubada
de páginas que terminam e avançam; não posso nunca não mais estar
porque nunca estive, estou em lado nenhum. Nunca iniciada,
nunca concluída. Nem ser. Inexistir é assim, podes-me em ti matar?
O tempo leva. Tudo. Foi. Mas o tempo não leva nada. Nada.
O nada. O que não é nem foi, um nunca, não pode levar.
Entendeste o que é; entende agora o que não é. Roubada
ao existir serei para sempre. Inexistir é assim, o nada por marcar
em folhas de dias que passam; não sou imaginada, nem perdida,
sequer fui encontrada. Não sou. O tempo não me poderá terminar;
o tempo leva ideias, pessoas, amantes; ele leva-nos a vida
mas não leva ninguém ou a morte. É assim que me deverás chamar:
ninguém, a imperturbável pelos dias. Inexistir é assim, ser roubada
de páginas que terminam e avançam; não posso nunca não mais estar
porque nunca estive, estou em lado nenhum. Nunca iniciada,
nunca concluída. Nem ser. Inexistir é assim, podes-me em ti matar?
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