10 fevereiro 2011

A História da Itália em três imagens

(recebidinho agora mesmo por e-mail)

Memórias da Praça



Passou mais uma vez pela praça.
Seria naquele dia talvez a quarta ou quinta vez, não o sabia ao certo, mas isso também pouco ou nada importava. O importante era sentir o penetrar do seu corpo por aquele espaço, sentir por momentos a vertigem das aves sobre a sua cabeça quando cruzava o centro do empedrado e com um único relance enchia num voo de olhar todo o vazio ao seu redor, até ao ponto onde as pedras postas no chão mudavam de sentido, subindo na vertical, fazendo paredes delimitadas por aberturas, portas, janelas, varandas. Respiradouros por onde os cheiros dos seus mundos interiores comunicavam com o espaço comum que ele agora atravessava.
Agora a luz da tarde começara já a cair e o sol, a incidir de forma oblíqua, expunha de forma crua como as nossas memórias se guardam no que é belo e eterno. Quase todas as paredes mostravam estragos da invernia. Bocados de tinta danificada expunham vestígios da trama dos tijolos ao mesmo tempo que os verdes de musgo tingiam aqui e ali os recantos mais abrigados das construções. O próprio chão, pesasse embora o sol magnífico de todo aquele dia, cheirava a humidade e, nalguns sitios, como junto às sarjetas, a mofo e a coisas estragadas.
Parou mais uma vez sob aquela janela. Não tinha noção de há quanto tempo tinha sido mas o cheiro dela continuava tão fortemente implantado nas suas narinas como se a tivesse mesmo ali junto a ele.
Perante si correrram rapidamente as cenas que agora o faziam sentir a angústia de não ter com quem repartir a doçura que a sua saliva segregava. As esperas de dias, as mensagens de olhar, o ir e vir, e finalmente o primeiro encontro. Lembrou-se de como tinha sido e a intensa alegria que os dois tinham partilhado. Nem sempre isso acontece nos primeiros encontros mas no seu caso particular...
Naquela ocasião, tinham-se aproximado de imediato mal ela aparecera cá em baixo. Saíra subrepticiamente, à socapa, pois nem é preciso dizer que os quartos de sentinela lhe tinham criado problemas com os seus em casa.
Assim, sem mais demoras e eufóricos, tinham seguido juntos pela rua do centro da praça até ao pequeno jardim que ele conhecia desde a mais tenra idade e que ainda há pouco, quando ele ali estivera, alguém estava a regar. Durante o percurso, desejosos um do outro, tocavam-se, aproximavam as bocas sôfregas e pelo facto de ser então já noite, o calor dos corpos transmitia-lhes a mesma sensação de conforto e envolvimento que ele agora sentia olhando para cima, quente de sol e de memórias, agora elas já todas relva no jardim que servira de cama aos seus desejos....
Um ruido familiar fê-lo voltar-se para trás e de imediato as memórias se volatilizaram. Era a sua amiga, o sua maior amiga. Por um instante engoliu o amargo. Fora por ela que tinha abandonado aquele amor no exacto dia a seguir ao seu primeiro encontro quando ela mudara de cidade. Porque é que trocamos tantas vezes o amor pela amizade? - Interrogava-se agora mudamente, como tantas vezes tinha feito, quando estava zangado com ela, mas acabando por regressar sempre e sempre, como algo predeterminado e a que inexplicavelmente não podia fugir.
Agora já estava próxima e ele ensaiou um esboço de sorriso que ela respondeu com uns traços de rosto franzido e voz de enfado:
- Onde tens andado? Procurei-te por toda a parte! Vá, que temos de ir embora.-
E dizendo isto tirou do bolso e prendeu com firmeza o fecho na trela...

desejo

hoje
fechei os olhos e desejei
desejei-te
desejei-me nos teus braços
no teu corpo
no calor da tua boca

E se uma filha tua quiser ser prostituta?

Lembras-te deste texto da Miss Joana Well sobre a prostituição?
"(...) De uma forma muito simples, esta é a correlação e a página onde se vão escrever os próximos meses: menos dinheiro nos bolsos diminui o número de clientes, menos dinheiro nos bolsos e há mais mulheres que decidem prostituir-se. (...) E isto não vai acontecer num qualquer mundo à parte, é cada vez mais o habitual a prostituta ser a vizinha do lado, a prima, a irmã, a namorada, a esposa."
Nos comentários gerou-se uma discussão muito interessante:
Laura: "(...) devo confessar-te que embora o facto de alguém poder e querer ter relações com diferentes companheiros sexuais não me choque já fazê-lo por dinheiro entristece-me!
Shark: "(A actividade dela não é redutora. A ideia até é precisamente a oposta...)"
Laura: "É sincero isso que diz?! Acha mesmo que a prostituição como actividade não é redutora?! Pois olhe, eu tenho 3 filhas e se uma delas me viesse um dia dizer «Mãe eu sou (ou quero ser) prostituta» eu não ia dar saltos de alegria nem ia incentivá-la de qualquer forma que fosse! Também não iria nunca virar-lhe as costas! NUNCA! Mas esse seria certamente um dos dias mais tristes de toda a minha vida, senão mesmo o mais triste! E olhe que já vivi alguns que não desejo a ninguém! E você, como reagiria?!
Shark: "Reagiria como me compete: sem julgar seja quem for, depois de me certificar tratar-se de uma opção consciente e não forçada. Há alternativas?"
Laura: "Alternativas a quê? À reacção ou à profissão? Na minha visão do mundo e do amor, filha minha sê-lo-á sempre, onde quer que esteja e o que quer que faça, por muito que isso me possa doer! Amar para mim é aceitar o outro como ele é! Por isso não teria outra alternativa senão a de respeitar a sua escolha! Aí estamos de acordo! Quanto à prostituição como profissão as alternativas existem, assim exista liberdade de escolha!
Concluí pois que é o facto de a considerar redutora enquanto actividade profissional que o leva a discordar (...) Mas o que eu quis dizer é que para mim uma mulher que olha para um homem qualquer (mesmo que até aí desconhecido) e se diz (dizendo-lhe depois) apeteces-me, quero-te e vai com ele para a cama. É uma mulher livre! Já uma mulher que olha para um homem (ou mulher, claro) que nada nela desperta (mesmo que não chegue a sentir repulsa) e se diz lá terá de ser (porque vai dar para a renda ou para aquele saco LV) dizendo-lhe depois, «vamos para a cama, é X e com devaneios Y», não é uma mulher livre! É uma mulher que não escuta o seu corpo, antes o amordaça, o ignora e o reduz a moeda de troca!"
shark: "(...) quando aqui reajo à expressão «redutora» falo no encolhimento das pilas. E por isso comentei em tom jocoso e pensei que alguém perceberia que se subentende que a actividade da Miss é mais «alargadora» nessa perspectiva."
Pois... mas a pergunta mantém-se: E se uma filha tua quiser ser prostituta?

Achados de baú: Nus

Mamã Obama



HenriCartoon

09 fevereiro 2011

Quem murcha são as rosas

Nunca percebi aquela mariquice de dizerem que tou murcho quando (nas raras ocasiões em que) permaneço em repouso. Murcho? Mas que conversa é essa? Sou alguma flor?
A malta não tem cuidado nenhum com a terminologia, isso é que é. E eu, falo que não fala, tenho que me aguentar à bronca com todo o tipo de expressões que me achincalham, não bastando já a superficialidade com que me avaliam pelo tamanho enquanto entram numa de que os homens não se medem aos palmos...
Acho que não há respeito nenhum pelas pilas e isso é revoltante porque dão uma no cravo e outra na ferradura, por um lado os gajos agarrados a nós fartam-se de louvar o "seu" desempenho (que afinal é o nosso, que eles só atrapalham) e olham para nós cheios de vaidade das "suas" proezas e por outro tratam-nos como um pedaço de carne pendurada sem utilidade alguma (o que até pode ser verdade noutros casos, tenho ouvido queixas aqui e além, mas não me diz respeito).

Eu sei que pareço uma pila refilona, sempre a protestar e assim. Mas ponham-se no meu lugar e digam lá se não tenho razão...

Reconhecer a Felicidade

Encontrando a minha felicidade na tua, não me apodero do teu Ser, antes ofereço-me à edificação do teu bem estar, ao complemento de ti e ao alcance da tua plenitude.
E se ser feliz poderia ser sonhar e realizar, explodir esse sentimento é despertar no outro toda a grandeza latente, por surgir e exultar nesse espaço as nossas emoções.
Isso é felicidade, isso é Amor, isso é perdermo-nos no outro e encontrarmo-nos em nós.
Um coração engrandecido e nobre não reconhece a felicidade através de si próprio, apenas porque falta-lhe a felicidade de todos os corações que o rodeiam. E assim, será alguém suficientemente feliz e capaz do reconhecimento dessa emoção?

Inspirar (viver) para expirar (escrever) e assim respiro (existo e sou)

Não acredito que a escrita nos queira dedicados por inteiro, depois nada tínhamos para escrever. Acredito, sim, que aos momentos a que nos chama, nos leva inteiros, pelos braços e pernas, pelo ar ou pelo chão; deixa-nos viver para nos cobrar a vida por letras; quer-nos dedicados à vida para ter o que nos cobrar. É como inspirar (viver) para expirar (escrever) e assim respiro (existo e sou). Falo pouco de mim, costumo perguntar-me mais, porque sei pouco de quem sou, de mim só sei como estou, às vezes nem bem sei onde, é um qualquer caminho que sobe, não sei a altura, não sei quanto falta, posso estar em qualquer medida de espaço e tempo. Sei que gostava que as palavras dessem a volta ao Mundo, uma espécie de abraço, mas não sei quantas linhas ainda terei que escrever para somar esses quilómetros todos, sei que as estou a escrever e que as estou a viver e que as que vivo me serão cobradas no papel, um amante exigente que todos os dias me entrega a outros braços para aprender novos beijos que lhe possa dar.

Afinal havia outro...



Webcedário no Facebook

08 fevereiro 2011

ConVite EscanCaradaMente Aberto a Todos!



Ler nas linhas, comboio nas mãos

Não está aqui. Ausente. A cabeça num ombro, o cheiro que há-de saber, o braço pelas costas; quando está no lugar certo é assim que se sente o braço e o corpo, como se estivesse arrumado na gaveta dele. Deve estar feliz e não está aqui. Logo volta, pode ser que conte tudo, pode ser que conte nada e ainda assim em incontáveis pontuações.
Não está aqui. Mas onde está? Talvez em segredo numa mão da história de dedos incertos por escrever, linhas nas palmas, dias na pele. Talvez não saiba onde está mas há-de saber, promete, há-de saber. Eu que nem sei de mim, prometo aqui voltar; sem precisar de descobrir, respiro e não me descubro respirar, é aqui que sei sempre onde estou.
Onde estás? O joelho perdido, o pulso abandonado gagueja e pode ser que até aprenda a cantar, ou não; tudo menos a mudez da indecisão, o comboio passa e até se podia saltar, cada pé fora do chão e pode ser assim, pode ser que seja mesmo assim, sem saber bem como é, mas há-de saber, diz que há-de saber.
Não está aqui. Ausente. Foi procurar um bocadinho de si um bocadinho.

Nada

Num momento falas-me
de amor,
noutro ignoras-me:
o amor não é ser ausente,
é manter o presente
como se não fugisse;
como se as palavras
pudessem continuar
a ser as de amor.

Mais de resto, ainda
existe - só - nada:
nada não é amor.

Poesia de Paula Raposo