20 agosto 2011

O rio

Não é muito fácil querer
ultrapassar o tempo
se o tempo é o que julgamos.
Mas, mesmo assim:
porque o tempo não tem tempo, eu
ainda te beijo junto à foz do rio.
Quando o rio é grande
e tu te perdes
nos seus braços.

Poesia de Paula Raposo

Baralho de cartas com desenhos de sado-masoquismo


19 agosto 2011

Frescura estival


Foto: Shark

Banho-Maria (II)

Se ainda tenho o meu amor
é no eco das palavras
sussurradas,
ampliei-as no meu peito.

Se ainda tenho o meu amor
é no ninho das madrugadas
passadas,
enganei-as no meu leito.

Se ainda tenho o meu amor
é no segredo das carícias
abandonadas
recolho-as quando me deito.

Ao menos, meu amor
esse beijo será eterno;
esse, subi-o ao céu
e não o desço ao inferno.
O resto que se perdeu,
como o calor no Inverno,
era um milagre tão terno
que nos esqueceu.

E foi por isso que chorei
e, mesmo assim, foi muito pouco
talvez o grito fosse demasiado rouco
ou talvez a lágrima sulcada de espanto
tudo se perdeu no pranto,
e eu não te alcancei.

Se ainda tenho o meu amor
é nas ilusões perfeitas,
vendadas,
entrancei-as no meu cabelo.

Se ainda tenho o meu amor
é nas pernas despidas,
enroladas
na doçura aguda, cruel, do teu novelo.

Uma arma em riste exige prevenção.

Em tempo de Verão deve ter-se sempre a arma em condições. Para isso aqui ficam alguns cuidados a ter para que se esteja pronto a disparar.
"O soldado guardar-se há de tomar banho depois de ter comido; não usará de mulher, pelo menos nas primeiras três horas
(...)
As mulheres matriculadas oferecem mais segurança do que aquelas que o não são Pág. 36 e 37)"


Tatiana Delgado fez uma cirurgia plástica para ter os lábios vaginais mais compactos


Tatiana Delgado se opera los labios vaginales por alrincon_com

18 agosto 2011

Coabitação e um gato

Deitada na cama, Ana terminou o primeiro parágrafo da página 214 do livro que estava a ler e marcou-o com o indicador direito. Conferiu as horas no seu relógio de pulso, vinte e cinco para as dez, e decidiu que eram horas de parar de ler. Tacteou a cama com a mão esquerda à procura do marcador, que estava parcialmente debaixo da sua nádega esquerda, virou-se um pouco para o lado contrário e tirou-o. Abriu e fechou o livro, depois de deixar o marcador entre as páginas onde antes estivera o indicador, e pousou-o na cama, com a intenção de voltar a ler quando se deitasse – estava a gostar. Afagou o gato deitado ao seu lado, que arqueou as costas para melhor sentir a mão da dona, e levantou-se. Olhou para o computador portátil, ligado mas em modo de suspensão, que estava numa mesinha preta ao lado da cama, confirmou as horas no relógio da mesa-de-cabeceira, 21:34 e tornou a olhar para o computador, hesitando entre conferir os e-mails e o facebook ou ir comer imediatamente. Na dúvida, rodou a cabeça e olhou para o gato como se lhe pedisse ajuda para tomar uma decisão. O animal percebendo o olhar da dona, saltou prontamente da cama para o chão e dirigiu-se à porta encostada, transmitindo claramente os seus desejos. Ana sorriu, achava que mais do que desejos o gato transmitia ordens. Olhou para o computador como se se justificasse à máquina, apagou a luz do candeeiro e seguiu o animal. “Tens razão, já são mais do que horas de comermos”, transmitiu-lhe telepaticamente quando abriu a porta do quarto e o deixou passar.
O gato correu para a sala e ela olhou para aí de esguelha, sem ver mais do que a televisão acesa na Fox. “Como é que ele vivia antes de haver tantos canais? De haver séries e filmes a toda a hora?”, pensou Ana referindo-se ao marido, de quem se esqueceu imediatamente quando o gato a ultrapassou vindo da sala mas já sem correr. A mulher achou graça aos passos decididos e à cauda empertigada do animal, como se ele fizesse questão que ela o visse e a obrigasse a segui-lo, e ficou a pensar no descaramento aristocrático do animal e na sua sorte por ter comer já feito e até quem o servisse, ao contrário dela que não fazia ideia do que ia preparar e comer ou pior, deu um risinho que não passou de um suspiro, sem saber sequer se tinha alguma coisa em condições para preparar.
Inventariando mentalmente o conteúdo do seu lado do frigorífico, sem deixar de seguir a cauda do gato, Ana foi apanhada de surpresa quando viu os pés do marido junto ao fogão quando o animal se enroscou neles. Parou na ombreira da porta, puxando instintivamente para trás o pé direito que já estava dentro da cozinha.
– Ah… Estás aí? – soltou Ana sem querer, incomodada pela presença do marido e pela ligeireza interesseira do gato; afinal estivera a ler para lá da hora de jantar para não se cruzarem e tinha vindo naquele momento principalmente por causa do gato.
O marido não lhe respondeu, não a ouviu ou fez que não a ouviu. Ela hesitou, voltou-se para trás mas olhou para o relógio e rodou sobre os calcanhares voltando-se de novo para o interior da cozinha, ainda sem entrar. Suspirou e esboçou um sorriso enfastiado na direcção do marido, que se voltara para ela sem expressão.
Alexandre, o marido, sem largar o cabo da frigideira, onde fritava dois ovos mexidos com um tomate e uma pequena cebola cortados em quartos, um dente de alho esmagado e folhas de orégãos frescos e pimenta preta, que agarrava com a mão esquerda, nem a espátula de madeira com que mexia o cozinhado, alternou, por segundos, o olhar entre os ovos e a mulher que parecia ter de vencer um campo de forças que ele emanava para entrar na mesma divisão da casa.
– Ainda não jantaste? – questionou Ana, sem se mexer nem disfarçar a censura que lhe moldava o tom, servindo-se de uma pergunta de resposta óbvia para esconder o aborrecimento de ver o gato enrolar-se nas pernas dele pedindo-lhe descaradamente mimo e comida, não necessariamente por essa ordem, e o facto de não ter voltado para trás enquanto tinha podido fazê-lo em silêncio.
Ana e Alexandre, casados, sem filhos mas com um gato, um sacaninha que parece ter verdadeiro e consciente prazer em provocá-los sempre que os apanha juntos, vivem num apartamento pequeno, com dois quartos, uma sala, uma cozinha, uma dispensa e uma casa de banho, que agora parece ter encolhido e em que eles parecem esbarrar continuamente um com o outro, apesar de não se quererem ver, como se a casa se voltasse contra eles e os quisesse levar ao confronto e ao fim do último dever conjugal que ainda cumprem: a coabitação.
Alexandre tornou a olhar para a mulher, baixando ostensivamente o olhar para os pés dela que não se moviam. Não conseguiu evitar um sorriso mas, quando se apercebeu que não o conseguiria esconder, virou-se para o fogão, evitando que Ana o visse. Então, apagou o lume, retirou a frigideira para um bico frio, baixou-se para afagar o gato ganhando tempo e perguntou com ar de quem não ouviu bem a pergunta da mulher:
– Se eu já jantei?
O casal olhou-se com ar sério, ela em pé junto à ombreira da porta, ele agachado ainda a fazer festas ao gato. Ana manteve a pergunta deixando descair a cabeça e proferindo um sim sumido. O marido olhava-a calado como se esperasse qualquer coisa. O gato parecia rir-se para ela, ainda que ela estivesse certa e segura que o gato não se ria para si mas de si, o pérfido.
– Sim, ainda não jantaste? – reforçou Ana, comprimindo o silêncio que a enervava.
– Já – mentiu Alexandre, passando uma última vez a mão pela cabeça do gato, antes de se levantar e se virar para o fogão, agarrar a pega da frigideira e completar a mentira em tom neutro: – Estava a fazer estes ovos para ti.
Ana, que recomeçara a andar lentamente, procurando, sem conseguir, desviar os olhos do gato, falhou um passo, o que ele percebeu pelo som dos chinelos no chão da cozinha. Alexandre sorriu e, satisfeito, imaginou-lhe a expressão surpreendida.
– Ainda não jantaste, pois não? – perguntou o homem, prolongando a farsa.
Ela aproximou-se do fogão e ficou ao lado dele, observando os ovos mexidos. Há muito tempo que não estavam tão próximos um do outro. O gato roçou-se na perna direita de Ana e na perna esquerda de Alexandre.
– Tem bom aspecto – reconheceu Ana, a quem a súbita visão da comida cozinhada, pronta a ser servida e a comer agravou a sensação de fome e vazio no estômago.
Entediado, faminto e desesperado, o gato esticou a cauda na horizontal e entrelaçou-se caprichosamente entre as pernas de ambos, levando-os a sorrir um para o outro, agoniando-o de tal maneira que, se pudesse, o gato lhes retraçava as pernas todas até chegar aos ossos e fazer um mar de sangue no chão da cozinha.

Pepsi Max - «Monster Truck»

Prazer ao ar livre

17 agosto 2011

postalinho de férias...


Sempre que passo por Vila do Bispo, no Algarve, nunca deixo de ir a um restaurantezinho simpático onde se podem comer dos melhores percebes (em inglês, understands, como sabeis) da região.

Imortalizadas no frontespício do edifício as figuras dos petiscos que por lá podemos degustar, é com enlevo que vos assinalo a segunda a contar da esquerda, que simboliza, como é evidente, um valentíssimo percebe, percebem? - Provavelmente apanhado nas Caldas da Rainha...

A posta red bull


Vontade de voar. De subir sem parar até ao ponto do céu onde nem passam os aviões, estratosfera ou ainda mais, sem fôlego perante a imagem azul do nosso espaço comum.
Vontade de me elevar até onde o mundo pare de respirar, mesmo antes do espaço que as estrelas enfeitam de luz. Lá em cima, bem alto, lá em cima onde não existe o som, na fronteira entre o espaço que sonhei um dia conhecer e falhei e um outro espaço no qual concretizei os desejos que me inspiraram os beijos teus.
A realidade tangível na ponta dos meus dedos e as asas dos meus medos que partiram quando o amor se impôs sem apelo nem agravo e com ele esta vontade de voar, de subir sem parar, dentro de ti, até ao ponto do espaço, o ponto no tempo, em que uma estrela explodiu, o teu orgasmo, e o espaço negro e vazio se iluminou em todas as cores que o universo conseguiu inventar.
O brilho nesse olhar que me sorri quando aproximo de ti a mão que passeia nesse rosto que o destino escolheu para me encantar, algures no céu onde dizem morar os divinos artesãos que moldam com as suas mãos as mais perfeitas criaturas, tão belas, tão puras, que só os eleitos conseguem entender únicas e especiais.
Vontade de amar, cada vez mais. De sentir sem parar a emoção. De poder passear a minha mão na aura da terra e depois aterrar para lhe poder tocar a pele, a tua, a pele que sentiu, e nascerem flores como sinais indisfarçáveis de um imenso arrepio.

Cronologia da pele (Pálido corpo)

Sim, estou pálida. Na pele e nos olhos,
a palidez dos envelhecidos nos minutos,
uma década perdida em qualquer hora.
Sim, preciso dos teus braços, agora,
agora, quando nada nos trago de novo
e tudo o que trago está ainda mais vivo.
Digo que estou bem, mas o olhar implora
que o vás recolher do chão lá fora.
Digo que estou bem mas, no rosto, o medo
desvela em palidez o meu segredo:
Abraça-me, a minha pele é prematura,
tudo menos eu findou demasiado cedo,
mas tu abraças-me, dás o flanco à ternura,
abraças-me e a pele é somente madura.

Modo Imperativo


O teu corpo é um parêntesis recto
erecto
que pontuo ao sabor da minha
boca
Brinco com o lume que separo por
vírgulas
e percorro cada esquina sem
reticências ...
É o nosso acordo ortografado
onde as consoantes são
mudas
e as vogais se precipitam
em ditongos de
prazer
Não há lugar para interrogações
apenas preâmbulos e
imperativos