11 dezembro 2013

«Finitude» - João

"Somos confrontados, a espaços, com a finitude. A primeira vez que me recordo de dar conta que era finito, que a minha vida caminhava, inexoravelmente, para um conjunto de tábuas, foi aos oito anos. Não sei porquê. Podia ter sido antes, ou depois. Mas alguma coisa, de que eu não me recordo, criou em mim a percepção de que a vida era finita. De que todos morriam. E eu também. Lembro-me, com razoável nitidez, de estar deitado na cama a olhar para o tecto e a tentar imaginar a inexistência. A tentar imaginar o que seria eu – que me sentia tão vivo – deitado e imóvel, morto, sem pensar, sem olhar, sem sentir, sem respirar, sem estar. A minha mente de oito anos não conseguiu encaixar essa ideia tanto quanto a de trinta e sete recusa. A minha atitude perante a morte é hoje diferente, mas creio que aquilo que se consegue com a idade não é tanto o ser capaz de fazer aquilo que tentei com oito anos e não sentir algum pavor, mas sim desenvolver técnicas de evitar pensar na morte dessa forma, ou pelo menos relativizar a noção de morte.

Não sei, também, se a morte é temida pelo fim ou pelo processo. Estar morto poupa-nos a uma série de incómodos (e ecoa na minha mente, agora mesmo “a um morto nada se recusa, e eu quero por força ir de burro”) e se, na ausência de outros valores, nos dedicarmos a uma vida hedonista, poder-se-á conviver com a morte de forma desassombrada. Estamos cá, tiramos o máximo prazer que podemos das coisas, e depois passamos à inexistência. Mas o processo é lixado. A transição vida/morte não é sempre como um desligar de botão. Quando é uma transição prolongada, o suficiente para se sentir dor ou ter a percepção de que a vida está a momentos de terminar, o pavor instala-se, e é por isso que questiono se o que nos assusta, verdadeiramente, é o fim (estar morto), ou o processo (estar a morrer).

Afastando-nos do hedonismo, temos outras respostas noutras vias espirituais. A minha matriz católica – que mantenho, com dificuldades aqui e ali – alivia-me tanto o fim quanto o processo, no tanto em que o fim não é verdadeiramente o fim, e o processo pode contribuir para um fim melhor. I.e., a morte não é senão a inexistência física, mantendo-se a nossa existência incorpórea num plano não terrestre (o céu, o purgatório, ou o inferno), e o processo, porque o catolicismo associa o sofrimento à purificação, pode acelerar ou garantir o acesso ao céu, evitando o purgatório. Diga-se, ainda, que por via do catolicismo, a existência incorpórea no céu, no purgatório ou no inferno, não são uma decisão divina unilateral, mas sim uma pena auto-imposta quando às nossas almas é dada ver a nossa vida com os olhos do Criador. Outras religiões terão diferentes visões da morte, mas desconheço-as.

Os detractores das religiões dirão, prontamente, que tudo isto é uma forma elegante de resolver a morte. Uma prática de auto-engano. Uma ilusão que permite aos meninos de oito anos – e aos de trinta e sete – pensar na sua finitude sem desesperar. Sinto, para mim, que não o é, embora funcione. A noção de que o divino nos espera e de que a nossa existência se expande muito para lá da existência terrena é, obviamente, confortável. Até certo ponto, pelo menos. Colide, é certo, com o hedonismo que apetece. Mas mesmo isso é discutível. O Deus castigador do antigo testamento, que pertence a um determinado contexto, deu lugar a um Deus de amor inesgotável, que sempre nos recebe quando a Ele nos dirigimos. Mas não pareça este um texto dedicado à religião. A católica ou outra qualquer. Apenas aqui cheguei por causa das cerejas. Das palavras.

O que me levou a escrever foi a finitude que nos espreita e às vezes se mostra. Os nossos corações sempre se assustam quando a finitude espreita os nossos. Este ano já me assustei. Já me assustei comigo, já me assustei com a família, já me assustei com o coração. As nossas vidas não são as de borboletas. São vidas longas o suficiente para muitos chegarem ao ponto de já nem querer saber, e esperar a morte com muita paz senão até com desejo. Mas às vezes os sobressaltos acontecem muito, muito antes de tempo. Quando o tempo ainda não é o da pacificação, não é o do desejo da ausência que inibe o desconforto. Às vezes os sobressaltos acontecem numa altura em que tudo quanto queremos é mimo. Muito mimo. Alturas em que os corpos se querem próximos, não para o galope, mas para as carícias que fluem pela ponta dos dedos, suavemente, sobre a pele."

João
Geografia das Curvas

Mestre Shark - Faço Domicílios

O 69 é um número muito sobrevalorizado. A malta acha piada ao conceito em teoria mas depois queixa-se imenso de falta de coordenação e assim.

«conversa 2033» - bagaço amarelo

Ela - Ando a tirar um curso de pintura.
Eu - Fixe. Vou precisar de ti, então.
Ela - Porquê?
Eu - Porque as paredes da minha casa estão um nojo e vou ter que as pintar, coisa em que não tenho grande experiência.
Ela - Sabe-me sempre bem conversar contigo de vez em quando.
Eu - Porquê?
Ela - Porque me apercebo sempre do motivo pelo qual as coisas nunca resultaram entre nós.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Postalinho de Halong Bay, no Vietnam

"Quando os chineses invadiram Halong, o povo pediu protecção ao Grande Dragão. Então, ele vomitou e criou mais de 3000 ilhotas que os protegeram como uma barreira. São assim as lendas...
No caso desta ilhota, não sei o que isto me faz lembrar mas tu, Sãozinha, deves saber!
Beijos do
Alfredo"

10 dezembro 2013

Pro Infirmis «Because who is perfect?» (porque quem é perfeito?)

"Manequins com deficiências provocarão olhares espantados dos transeuntes numa rua de Zurique. Entre os manequins perfeitos, haverá figuras com escoliose ou doença dos ossos frágeis a modelar as últimas modas. Um vai ter membros encurtados, outra uma coluna deformada...
A campanha foi concebida para o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência pela Pro Infirmis, uma organização para pessoas com deficiência. Intitulada «Porque quem é perfeito? Aproxime-se», que se destina a provocar a reflexão sobre a aceitação das pessoas com deficiência. O Diretor Alain Gsponer capturou a campanha como um curta-metragem."
É uma causa pela qual vale a pena lutar.

«This Misterie of Fucking» : Manual do Sexo de 1680


"Parei na livraria Martin's, o meu livreiro, onde vi um livro Francês, e pensei comprá-lo  à minha mulher para que o pudesse traduzir, chamado «Lesccolle des filles». Ao folheá-lo, foi o livro mais picante, mais lascivo  que vi...Tive vergonha de o ler"
- The diary of Samuel Pepys, Monday, January 1, 1668    

O livro é uma surpreendente e moderna exploração da sexualidade, escrito na forma de diálogo entre uma adolescente  e a sua mais experiente prima. Originalmente escrito em Francês, traduzido e publicado em Inglês em 1680 como The School Of Venus.

«redescobre-me» - Susana Duarte




redescobre-me os braços, estendidos sobre a noite, e derrama sobre mim a infinitude do teu abraço

Susana Duarte
Blog Terra de Encanto

Acessórios de peças de teatro da Tuna Meliches nos Encontra-a-Funda (encontros do blog «a funda São»)

A Tuna Meliches é, desde sempre, o grupo sargento (não há oficial) do blog «a funda São».
E, ao longo de 10 anos e 19 encontros (Encontra-a-Funda) já por diversas vezes apresentaram as suas músicas e diversas peças de teatro.
Alguns desses acessórios fazem parte da colecção.


Acessório usado pelo "fodaz Ribeiro, preto na cara, enorme no mangalho" na peça de teatro da Tuna Meliches baseada no poema «Ribeirada» de Bocage e apresentada no 5º Encontra-a-Funda (encontro do blog «a funda São») no Porto - 23 a 25-06-2006.
Trabalho da Celeste Rafael.



Traje usado pelo "de Vénus o filho, o deus Priapo" na mesma peça de teatro.
Trabalho da Lurdes e do Antonino Silva.


Acessório da vulva das cabrinhas que os pastores... apascentavam no presépio, na peça de teatro «Auto na tal» da Tuna Meliches apresentada no 6º Encontra-a-Funda (encontro do blog «a funda São») em Setúbal - 18 a 19-11-2006.
Trabalho da TriMargarida.


Roupa e acessórios do Gil Vicentezão, narrador da edição especial da peça de teatro «Auto das Danações» de Jorge Castro.
Em 2006, num passeio de barco no Sado por ocasião do 6º Encontra-a-Funda (encontro do blog «a funda São»), o coleccionador sugeriu ao Jorge Castro (OrCa) que escrevesse uma peça de teatro, à moda de Gil Vicente mas com personagens dos tempos modernos. Passados menos de 3 meses, o OrCa tinha pronto o «Auto das Danações - versalhada em um acto, que o tempo não está para desperdícios que não atem nem desatem», que foi levado à cena pela Tuna Meliches, em Caria, na Quinta do Panasco, no 7º Encontra-a-Funda - 23 e 24-06-2007.
Trabalho de Celeste Rafael e Paulo Moura.

09 dezembro 2013

Aprendam a dançar Doundounba


Naked African Dance 2: Nude Doundounba! (All Levels) from Naked Yoga School on Vimeo.

«respostas a perguntas inexistentes (259)» - bagaço amarelo

Depois do meu divórcio e antes do meu novo casamento, marquei diversos encontros com mulheres um pouco por todo o país. Alguns correram melhor, outros pior. Algumas dessas mulheres ficaram minhas amigas, outras nem por isso. Lembro-me com frequência de alguns desses encontros, doutros nem por isso.
Alguns amigos meus, com base num pensamento a que arrisco chamar mais conservador, criticaram-me ou avisaram-me, sempre com as melhores das intenções, que não é através de encontros com desconhecidas que se deve conhecer uma mulher. Ainda hoje discordo, até porque se se conhece uma mulher, é porque até então ela era desconhecida, seja numa saída à noite, numa inscrição num workshop de dança ou outra coisa qualquer. Eu queria conhecer pessoas. A internet é apenas um (mais um) meio para o fazer.
Apesar da minha actual relação ter sido uma das maiores coincidências da minha vida, creio que mesmo a maior, acabou por ser essa a via para a relação mais longa que já tive com uma mulher depois de me ter divorciado. Por isso, e independentemente da coisa continuar a resultar por muito mais tempo ou não, não me arrependo.
Hoje, daquilo que mais me lembro dos meus encontros, é sobre como nos apresentamos ao outro e o que realmente somos. Nunca corresponde, ou quase nunca. Talvez por isso os ingleses lhes chamem blind date (encontro às cegas). Muitas vezes fui ter com mulheres que nunca tinha visto, nem sequer em fotografia, mas das quais fazia uma ideia. Aliás, fazemos sempre uma ideia sobre como são os outros, seja alguém com quem conversamos na net, seja um locutor de rádio ou outra coisa qualquer.
Entre esta distância que separa a forma como nos vemos e aquilo que realmente somos, existe também a variável do que somos e do que queríamos ser, variável essa que pode ser muito cruel. Acho que foi por isso mesmo que na primeira vez que vi a Anabela ela estava a chorar. É assim que me lembro dela hoje, sete anos depois. A chorar.
Saí de Aveiro num fim de tarde em direcção a Coimbra para tomar um café com ela. Nunca a tinha visto, mas a descrição dela, feita por ela mesma, revelava uma mulher morena de um metro e sessenta e cinco, magra, lábios grossos, tímida e que se escondia frequentemente nos seus longos cabelos negros.
A primeira conclusão a que cheguei é que é que se atrasava bastante, porque apesar de termos combinado às oito da noite num café central, às nove ainda não tinha vislumbrado ninguém que se assemelhasse a tal apresentação. Foi nesse momento que uma "outra" mulher, loira, de cabelo curto e certamente com mais de cem quilos, se sentou na minha mesa a chorar. Estava ao meu lado, em segredo, desde o princípio, a ganhar coragem para se revelar.
Pediu-me mil desculpas por me ter feito andar tanto em busca do inexistente. A sua descrição baseara-se na minha assumida admiração pela Mayra Andrade.

- E o que é que bebes? - Perguntei como que querendo fugir àquela pequena explosão do meu dia.
- Não estás zangado?
- Estou zangado com o mundo. Contigo, obviamente que não.
- Tu também não és bem o que eu estava à espera... - concluiu.

Eu não era o que a Anabela estava à espera. A Anabela não era o que eu estava à espera. Depois mandámos vir vinho, bebida que nos acompanhou numa conversa até às três da manhã, já no seu pequeno apartamento. Dentro daquilo que não éramos, ficámos amigos até hoje. Estava aqui a pensar na quantidade de vezes que dei de caras com mulheres que correspondiam fisicamente ao que diziam, mas com quem não fui capaz de dividir um copo desse néctar da amizade que é o tinto maduro.


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Luís Gaspar lê «Cinco horas» de Mário de Sá-Carneiro

Minha mesa no Café,
Quero-lhe tanto… A garrida
Toda de pedra brunida 

Que linda e que fresca é!

Um sifão verde no meio 

E, ao seu lado, a fosforeira
Diante ao meu copo cheio
Duma bebida ligeira.

(Eu bani sempre os licores
Que acho pouco ornamentais: 

Os xaropes têm cores
Mais vivas e mais brutais).

Sobre ela posso escrever 

Os meus versos prateados, 

Com estranheza dos criados
Que me olham sem perceber.

Sobre ela descanso os braços 

Numa atitude alheada,
Buscando pelo ar os traços 

Da minha vida passada.

Ou acendendo cigarros,
— Pois há um ano que fumo
-
Imaginário presumo
Os meus enredos bizarros.

(E se acaso em minha frente
Uma linda mulher brilha,
O fumo da cigarrilha
Vai beijá-la, claramente…).

Um novo freguês que entra
E novo actor no tablado, 

Que o meu olhar fatigado
Nele outro enredo concentra.

E o carmim daquela boca
Que ao fundo descubro, triste,
Na minha ideia persiste 

E nunca mais se desloca.

Cinge tais futilidades

A minha recordação,
E destes vislumbres são

As minhas maiores saudades…

(Que história d’Oiro tão bela

Na minha vida abortou:

Eu fui herói de novela
Que autor nenhum empregou…).

Nos Cafés espero a vida
Que nunca vem ter comigo:
— Não me faz nenhum castigo,
Que o tempo passa em corrida.

Passar tempo é o meu fito, 

Ideal que só me resta: 

Pra mim não há melhor festa, 

Nem mais nada acho bonito.

— Cafés da minha preguiça,
Sois hoje — que galardão!
— 
Todo o meu campo de acção
E toda a minha cobiça.

Mário de Sá-Carneiro
(Lisboa, 19 de Maio de 1890 — Paris, 26 de Abril de 1916) foi um poeta, contista e ficcionista português, um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração d’Orpheu.

Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa

Chupetinha


Foto de José Manchado

Via Danish Principle

08 dezembro 2013

«Charizard» - curta-metragem Porta-Curtas

Drama
Prémio Porta Curtas
Director: Leonardo Mouramateus
Elenco: Daniel Pizamiglio, Geane Albuquerque, Luiz Otávio Queiroz, Marcel Cozzolino
Duração: 15 min
Ano: 2012
Brasil
Sinopse: A semana em que Virna resolveu se separar do namorado para ficar comigo, foi a mesma semana em que me ofereceram um emprego temporário de caseiro. Um ensaio sobre o corpo e a juventude ao som pulsante de música electrónica.