30 julho 2017

Anúncio da AUDI na China

«A Leninha...» - bagaço amarelo

A empregada chamava-se Leninha e vinha todas as terças. Lembro-me dela a tirar o pó de todas as coisas lá de casa com um espanador que mais podia ser uma varinha de condão, tal a forma subtil como lhes tocava. Tratava-me na terceira pessoa, apesar de eu não passar de uma criança cujo centro do mundo era um balde cheio de miniaturas de automóveis. Só parava de brincar por alguns momentos para ver os seus truques de magia. Esperava sempre que ela pudesse transformar a redonda jarra de vidro da mesa de jantar numa bola de futebol, o quadro com a face do menino a chorar numa pintura infantil ou simplesmente dar cor às mobílias pintadas de velho pelo tempo. Isso nunca aconteceu.
A Leninha trabalhava em todas as casas do edifício de três andares onde cresci, bem no centro da cidade de Aveiro, cujos moradores trabalhavam todos em qualquer sítio. Alguns eram funcionários públicos, um homem do primeiro andar trabalhava num stand de automóveis em segunda mão e havia uma mulher que lavava cabeças no cabeleiro da Lurdinhas. O meu pai era polícia. Ainda assim, apesar de todos estarem empregados, tratavam a Leninha por empregada quando ela não estava. Se estivesse, tratavam-na simplesmente por Leninha.
Para além dela e da cabelereira, também a costureira da rua era tratada pelo diminutivo. Era a Mizinha, não sei bem porquê. Sei que ficava sempre fascinado com a quantidade de fios de cores diferentes que ela tinha na pequena loja de esquina onde o Sol se recusava a entrar. Para mim, aquele sítio era uma espécie de parque de diversões e cheguei a pensar ser costureiro só para poder ter tantas linhas de cores diferentes. Assim que verbalizei a minha vontade, o meu pai mandou-me calar.
Tens que ter uma profissão de homem! - disse.
De facto existiam as profissões de homem e as profissões de mulher. Nas profissões de homem da minha rua estavam o Carlos, sapateiro; o senhor Cunha, contabilista; e o André, alfaiate. Foi assim que aprendi que todas as mulheres que trabalhavam passavam a ser tratadas pelo diminutivo, enquanto os homens continuavam a ser tratados da mesma forma. Quando as profissões eram parecidas, a do homem tinha que ter mais categoria. “De categoria” era mesmo a forma como se falava dos fatos feitos pelo André, enquanto as blusas feitas pela Mizinha nunca passavam de “jeitosinhas”.
Com o tempo, a adolescência e os primeiros copos entre amigos veio o síndrome das “gajas boas”. Quem não usasse a expressão “gaja boa” pelo menos uma vez por noite era colocado na prateleira dos maricas ou, pior ainda, dos enjeitados para a vida. A “gaja boa” servia para que qualquer rapaz com dois cabelos de barba pudesse encher o peito de ar e pedir uma cerveja com orgulho em si mesmo.
Numa noite de Verão qualquer, o Raúl chamou boa a uma miúda que passou por nós. Todos nos rimos, encorajados pelo silêncio e pelo passo apressado, quase fugitivo, dela. Depois ele aumentou o volume da própria voz e gritou “comia-te toda!”. Ela desapareceu na primeira curva, engolida pela escuridão nocturna e pelos seus pensamentos.
Tudo o que contei até agora é ficção, mas retrata de forma fiel o Portugal em que eu cresci. Um país pobre e envergonhado onde o tempo parecia ter congelado. E se o país, saído de um regime totalitário que tinha como pilar principal a ignorância, se recusava a ver-se ao espelho, também cada um de nós se recusava a fazê-lo. Mais coisa menos coisa, era este o país onde ser homossexual era uma anomalia e as mulheres eram um diminutivo. Talvez por isso, algumas se comportassem como se pudessem fazer magia, fazendo do espanador de pó uma varinha.
Não serve para desculpar ninguém de nada nem isso me interessa, mas a mim serve-me para perceber que as novas gerações são melhores em muitos aspectos. E esperar que assim continue...
AdoroMostrar mais reações


bagaço amarelo
Blog «Não compreendo as mulheres»

Explicação dos pássaros



Ele era inexcedível quando se atracava a mim e subia uma mão por dentro da camisola até fazer saltar um seio do sutiã para os dedos titilarem o mamilo enquanto a outra se metia desvairadamente pelo cós das calças ou da saia na ansiedade de um bando de pássaros migradores a bicarem cada milímetro das zonas húmidas

Foda madrinha


A de ontem à noite achava-se uma fada, mas a pinar não fazia magia alguma. Só por causa das coisas dei-lhe uma fodinha de condão.

Patife
@FF_Patife no Twitter

29 julho 2017

«Sim, meu Deus, sim!»


YES, GOD, YES from Karen Maine on Vimeo.

«vives entre a alma e o sol» - Susana Duarte

vives entre a alma e o sol,
deitado entre ti e ti,
de ti perdido,
de ti ali,
onde
as nuvens soltas
navegam delírios vestidos
de noite. vives entre a alma e
o que não sei. vives, em mim, noite
tempestuosa de olhos desassossegados.

inertes.

vives entre a alma e os dedos,
florescendo mágoas
e solidões
por entre
medos.
de ti perdido,
imaginas encontros de mãos
e sussurrares de aves finalmente tocadas
pelas primaveras do tempo. vives entre a alma,
e o que não sei. vives nas ondas submarinas do ventre

sôfrego.

vives onde não sabes,
e não vives nada, perdido de ti,
entre ti e as névoas das tuas dúvidas.

vives na sombra
do limbo das folhas,
onde a seiva segrega

o amarelecer dos dias.

Susana Duarte
Blog Terra de Encanto
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«Sois érotique» - Les Charlots

Disco single em vinil de 1972 com uma canção que aborda, de forma humorística, a "moda" do erotismo em França nos anos 60 e, em particular, a canção «je t´aime moi non plus» de Serge Gainsbourg.
Estava a fazer falta na minha colecção... mas já não faz.






A colecção de arte erótica «a funda São» tem:
> 1.900 livros das temáticas do erotismo e da sexualidade, desde o ano de 1664 até aos nossos dias;
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Quem quiser investir neste projecto, pode contactar-me.

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Postalinho das Autárquicas 2017 - 4

"Qualquer dia a Madalena chateia-se! PSD em 2013, PS em 2017... já não há casamentos para a vida."
Tesourinhos das Autárquicas 2017


28 julho 2017

«Petrina sanguilícia» - Jorge de Sena


Petrina, sanguilícia, de soluço
promessa rubra conijato ardente,
tibrada vibra se de tacto ilente
andia andiada estrangulardo cusso.

Que toques de fremores e de artibruço
ou de retorna em gânvias daltimente,
no junto e no despaço do nigrente
encarapelo rebabado esfruso.

Veloz de velocino se esgarando
em trávias roucas de que dançam bolas,
se tudo a fim se cói de contrapara.

No quiaras se de escuro é torvo imando
os de suprácia garinhantes colas,
e molibamba atrímula se esvara.

Jorge de Sena, Visão Perpétua

Postalinho do pastelinho

"São Rosas, olha o belo do croissant!"
Isabel V.


#charmedetrolha - Ruim

A minha colega tem um pacote cheio de biscoitos destes.
"Vou comer-te o "ésse"! - disse eu.
Ela riu-se. Vou sacar.




Ruim
no facebook

27 julho 2017

Ménage à Tetris


Ménage à Tetris from VANDAL.SYDNEY on Vimeo.

Luís Gaspar lê «Bom dia, meu amor» de Joaquim Pessoa

Acordo-me. Acordo-te. Sorrio.
E sobre a tua pele que a minha adora,
navega o meu desejo, esse navio
que sempre parte e nunca vai embora.
E como um animal uivando o cio
de um milénio, de um mês ou uma hora,
não sei se morro ou vivo, ou choro ou rio,
só sei que a eternidade é o agora.
E calam-se as palavras, uma a uma,
feitas de sal, saliva, dor e espuma,
com a exacta dosagem da alegria.
Bom dia, meu amor! O teu sorriso
é tudo o que me falta, o que eu preciso
para acender a luz de cada dia.

(Joaquim Pessoa, in “Os dias não andam satisfeitos”,Edições Esgotadas, Março 2017)

Joaquim Pessoa
Joaquim Maria Pessoa (Barreiro, 22 de fevereiro de 1948), conhecido por Joaquim Pessoa, é um poeta, artista plástico, publicitário e estudioso de arte pré-histórica portuguesa.
Ouçam este texto na voz d'ouro de Luís Gaspar, no Estúdio Raposa